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19/05/2007 - 09:24

A evolução da insulina e a revolução no tratamento do diabetes

Dos extratos pancreáticos à insulina inalável.

Até 1921, o diagnóstico de diabetes insulino dependente equivalia a um atestado de óbito, após penosos dias de perda de peso, desidratação e coma. Não havia como manter a vida, uma vez que o pâncreas interrompia a produção de insulina. Mesmo com a privação do alimento até o jejum, mesmo com longas internações, mesmo com toda a medicina alternativa, nada continha a elevação da glicose no sangue, que causava diurese maciça, desidratação, caquexia e coma. Faltava a insulina que transporta a glicose para dentro das células e armazena nutrientes. Faltava o maior hormônio anabólico, que garante as reservas de glicose e energia que possibilitam a vida.

A descoberta da insulina foi um dos mais importantes avanços da medicina de todos os tempos e foi alcançado em 1921, na Universidade de Toronto, pelo cirurgião Frederick Banting e pelo estudante de medicina Charles Best, feito que rendeu a ambos o Prêmio Nobel de Fisiologia daquele ano. Eles conseguiram isolar o hormônio através de extratos de pâncreas de cães e o testaram inicialmente nesses animais. Em 12 de janeiro de 1922, a insulina foi aplicada pela primeira vez em um paciente chamado Leonardo Thompson. Na ocasião, o garoto tinha 14 anos e pesava 30 kg. O efeito do remédio foi tão maravilhoso neste paciente que os pesquisadores acreditaram que tinham chegado à cura da doença.

Insulinas bovina e suína - A insulina produzida pelos pesquisadores em Toronto era cheia de impurezas e, inicialmente, causava abscessos nos locais de aplicação. Desde então, a pesquisa por insulinas mais puras e semelhantes à humana evoluiu muito, iniciando-se com a utilização das insulinas bovina e suína, que resolveu o problema da demanda pelo hormônio. Mas essas insulinas ainda tinham muitos contaminantes, causavam alergia, variavam de potência de lote para lote em até 25%, induziam os pacientes a produzirem anticorpos contra elas, gerando resistência progressiva e aumentando as suas necessidades diárias do hormônio.

Na década de 60, esses inconvenientes foram parcialmente sanados através de tecnologia apropriada que passou a produzir insulinas mais puras, diminuindo os efeitos colaterais, principalmente as alergias, a resistência ao hormônio e as lesões de pele nos locais de aplicação. Em 1973, foi introduzida no mercado a insulina suína “monocomponente”, fabricada por meio de uma técnica denominada cromatografia e destituída de contaminantes.

Insulina humana - As insulinas suína e bovina foram as únicas armas terapêuticas até o surgimento da tecnologia do DNA recombinante, que em 1978, introduziu o gen da insulina no genoma de uma bactéria e conseguiu fazer com que ela produzisse insulina idêntica à humana. Neste momento, surgiu a possibilidade de utilizar insulina humana no tratamento dos pacientes diabéticos. Essa insulina apresentava muitas vantagens em relação às insulinas bovina e suína, como a menor indução de produção de anticorpos antiinsulina, uma vez que era idêntica à humana e o corpo humano não reagia contra ela, como fazia com as insulinas derivadas de animais.

A primeira pessoa a fazer uso da insulina humana biossintética foi um paciente de 18 anos que estava com seu diabetes bastante descompensado, apesar de sua dose de insulina ter sido aumentada de 50 para mais de 110 unidades ao dia. Ele tinha desenvolvido resistência à insulina, com anticorpos antiinsulina em níveis muito altos. Dois dias após o início do uso de insulina humana, suas necessidades de insulina diárias caíram para 65 unidades ao dia.

Produzindo insulinas de longa ação - A insulina como foi inicialmente isolada e utilizada tinha curto período de ação e era necessário reaplicá-la a cada três ou quatro horas, o que motivou pesquisas para modificar o perfil de ação do hormônio. Em 1936, foi produzida a primeira insulina de ação prolongada. Em 1940, surge a mais famosa delas, a insulina NPH, com um perfil de ação que poderia ser utilizada duas vezes ao dia e associada à insulina de ação rápida para garantir os picos de glicose das refeições. Essa insulina ainda é utilizada até hoje. Apesar de ter ação prolongada, a insulina NPH tem um perfil que difere da secreção basal de insulina em pessoas normais, pois tem picos de ação que levam a riscos de hipoglicemias entre as refeições, as temíveis queda de glicose, tão arriscadas para os diabéticos.

Análogos de ação ultra rápida - Recentemente, mais um salto na qualidade do tratamento do diabético foi obtido através de uma mudança na estrutura química da insulina. Esta alteração permitiu a descoberta de dois tipos de insulina, que atualmente são a base do tratamento desses pacientes. Entre 1996 e 1999, foram lançados os dois análogos de ação ultra rápida: a insulina lispro (Humalog) e a insulina aspart (NovoRapid). E a partir de 2001, as insulinas de ação prolongada sem pico de ação, que conseguem simular de maneira muito próxima a secreção basal de insulina humana e, que, na maioria dos pacientes, pode ser aplicada apenas uma vez ao dia. No Brasil, existem dois análogos de ação prolongada, a insulina glargina (Lantus) e a insulina detemir (Levemir).

Através da utilização desses dois análogos, conseguimos um perfil de insulina muito próximo do normal, além de maior flexibilidade e praticidade no tratamento do paciente com diabetes, que se via na obrigação de um esquema de refeições muito rígido, uma vez que tendo tomado sua insulina pela manhã teria que almoçar por volta do meio dia, correndo o risco de queda da glicemia pelo pico de ação dessas insulinas nesse período. Com o esquema atual, chamado basal-bolus, os pacientes utilizam-se de uma ou duas doses diárias do análogo de ação prolongada, o que lhes garante a glicemia de jejum e os períodos entre as refeições, mais três doses de análogo de ação ultrarrápida, o que lhes garante as glicemias pós prandiais, aquelas que são influenciadas pelas refeições. Com esse esquema terapêutico, as glicemias são facilmente normalizadas e os horários das refeições muito mais flexibilizados. Mas a dura sina das cinco a seis picadas de insulina diárias continua, fora as picadas necessárias para checar as glicemias que esse esquema exige, pois quanto mais próximo da glicemia normal, maior o risco de hipoglicemia desses pacientes.

Bombas de infusão - Nos anos 80, surgiram as bombas de infusão contínua de insulina, que evoluíram muito em tamanho e comodidade com a utilização dos análogos de ação ultrarrápida administrados de maneira contínua através de finíssimo catéter introduzido no subcutâneo, podendo o volume de infusão ser ajustado de acordo com as necessidades de cada momento do dia. Antes das refeições, doses adicionais de insulina são programadas e infundidas de acordo com a quantidade de carboidrato ingerida, a glicemia e a atividade física do paciente. As bombas são dispositivos que, embora onerosos para a maioria dos pacientes, proporcionam um controle glicêmico muito bom, sem as múltiplas picadas de insulina diária e, ainda, permitem uma vida com maior flexibilidade alimentar.

Insulina humana inalável - Desde a descoberta da insulina na década de 20, várias tentativas de desenvolvimento de alternativas às aplicações subcutâneas de insulina foram tentadas. Foram testadas as vias oral, retal, ocular, vaginal, transdérmica, sublingual, nasal e pulmonar. Desde 1925, pesquisadores tentaram desenvolver um sistema de administração intrapulmonar de insulina, devido à grande área de superfície de membranas altamente permeáveis do epitélio pulmonar e extensa capacidade de distribuição sistêmica de medicamentos. Progressos definitivos ocorreram a partir de 1990, quando dominamos a técnica do aerossol e dos fatores capazes de interferir na absorção das partículas inaladas.

Dentro dessa perspectiva, acaba de ser aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária, (Anvisa), a insulina humana inalável (Exubera), que se constitui de blisters, contendo insulina humana em pó, que pode ser administrada através de um inalador próprio. O inalador dispersa a insulina em uma câmara, formando uma nuvem de aerossol, que é administrada aos pacientes através de inalação profunda. O perfil de ação da insulina inalável encontra-se entre a insulina regular e os análogos de ação ultra rápida, com início de ação em torno de 30 minutos, efeito máximo por volta de 140 minutos e duração de ação por volta de seis a sete horas. Logo, poderá substituir as aplicações dos análogos de insulina antes das refeições, reduzindo em muito o incômodo das múltiplas picadas diárias para se obter um bom controle glicêmico.

É importante notar que nos pacientes fumantes a absorção da insulina inalável é muito maior do que em não fumantes, sendo portanto contraindicada em pacientes diabéticos fumantes ou que fumaram seis meses antes do início do tratamento. Recomenda-se ainda que os pacientes realizem testes de função pulmonar, antes de iniciar o tratamento com insulina inalável e que os repita em intervalos periódicos durante o tratamento.

A insulina inalável pode ser administrada isoladamente ou em esquemas associados às insulinas de ação prolongada nos diabéticos tipo I ou insulino dependentes. Pode ainda compor esquemas terapêuticos, juntamente com as drogas orais ou insulina basal prolongada em pacientes com diabetes tipo II ou não insulino dependente. A insulina inalável foi associada à melhora na satisfação e na qualidade de vida dos pacientes em relação aos esquemas que utilizam a administração de insulina subcutânea antes das refeições.

A Federação Internacional de Diabetes estimou um avanço da incidência do diabetes de 194 milhões em 2003 para 333 milhões em 2025. A doença avança em proporções alarmantes e necessita de formas mais práticas e eficientes de tratamento, que possam garantir qualidade de vida para esses pacientes, enquanto eles esperam pela cura.

.Por: Dra. Ellen Simone Paiva – Endocrinologista , Nutróloga e Diretora do Centro Integrado de Terapia Nutricional (CITEN). Rua Vergueiro, 2564, conjuntos 63 e 64 |Vila Mariana, São Paulo-SP CEP: 04102-000 Telefone (11) 5579-1561 [www.citen.com.br].

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