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Do Rio para Moscou, anotações de um viajante


Voltei recentemente de Moscou. Estivera lá pela ultima vez dois anos atrás. A cidade que já era linda mudou ainda mais. Novas e largas avenidas, modernos prédios, obras e mais obras. É uma metrópole cheia de luz, alegria e vida, imenso número de carros luxuosos de dia e à noite nas ruas, bares e restaurantes lotados, gente bonita e muito bem vestida, limpeza inacreditável. Quem não sabe da crise econômica de 1998, dificilmente acreditaria que aquele ano existiu na história desse país.

A Rússia de hoje registra um crescimento econômico anual em torno de 7%. Um motorista que trabalhou comigo dois anos atrás e ganhava U$ 400,00 hoje recebe U$ 800,00 e disse que não está muito satisfeito. Salários e aposentadorias crescem 15% ao ano. O povo, com todo direito, acha que é pouco e quer mais. O Governo promete aumento salarial maior no próximo ano.

O PIB que já foi maior e caiu nos anos 90, está crescendo e já está próximo ao brasileiro, mas estamos falando de um país que durante o século passado sobreviveu a seis guerras, das quais duas mundiais, e a três mudanças drásticas de regime, saindo do feudalismo para o capitalismo da pior espécie, em seguida para socialismo e mais tarde voltando para o capitalismo - apesar de não apreciarem muito esse nome. A Indústria cresce em ritmo acelerado - a alimentícia, por exemplo, 8% ao ano. Cerca de 70% das empresas locais tiveram lucro no ano passado. O nível de investimentos estrangeiros continua aumentando.

Por dever de ofício fui visitar duas feiras que ocorreram em Moscou nessa época. A primeira, de turismo, em um novíssimo, enorme e magnífico centro de exposições. Todos os grandes líderes mundiais desse mercado estavam lá. Não é para menos. O mundo inteiro corre atrás de milhões de russos que todo ano viajam para o exterior. Embratur e várias empresas nacionais, chefiadas por ela, estavam presentes, fazendo seu trabalho de atrair maior movimento turístico russo para nosso país. A tarefa, em virtude dos últimos acontecimentos no Rio e outras cidades, não é muito fácil. A imprensa russa também não perdoa. Tudo o que de ruim acontece aqui está lá nas paginas dos principais jornais.

Uma semana mais tarde começou o "World Food 2006" - famosa feira da indústria alimentícia, que tem a participação de centenas de empresas russas e estrangeiras, realizada num outro centro de exposições, tão confortável como o anterior. Foi um evento algumas vezes maior do que os das nossas Abras ou Apas. Durante quatro dias, visitei todos os pavilhões e estandes, ainda tendo em mente como era a indústria alimentícia russa - paralisada - 12 ou 14 anos atrás.

Hoje, o quadro é completamente diferente. Impressionam os produtos de boa qualidade, com ótimo acabamento, muito bem apresentados, os gerentes e diretores comerciais, em sua maioria jovens, falando fluentemente inglês, e o visível interesse de todos em exportar. Na contramão, a marcante presença de empresas estrangeiras, querendo colocar seus produtos nesse novo e inesgotável mercado. O Brasil também estava lá, muito bem representado, mas somente na parte de carnes e frango. O restante da nossa indústria alimentícia, inclusive a de sucos e frutas, ainda não descobriu essa "nova América", que só de sucos consome a mesma quantidade per capita que os principais centros tradicionais da Europa.

Nos outros dias da viagem fui a vários supermercados. Talvez seja mais correto dizer hipermercados, que cresceram tão rápidamente como os cogumelos depois da boa chuva russa. Constatei que hoje, diferentemente de dois anos atrás, podemos entrar num curso de aprendizagem com os russos sobre a forma de apresentação dos produtos nas prateleiras para o consumidor, sem falar na enorme quantidade de produtos de cada grupo, expostos para venda.

Dois itens chamaram a minha atenção: a qualidade de carnes de porco e frango nas prateleiras. Jurei que eram produtos brasileiros. Para minha surpresa, eram produtos russos. Se comparar este fato com a diminuição das importações desses produtos do Brasil em 2005, precisaremos de imediato começar a olhar com mais atenção para o futuro da nossa menina de olhos - a carne bovina, que proporcionou U$1,68 bilhão para o Brasil em vendas para a Rússia. Comentei isso com alguns representantes de empresas brasileiras presentes e percebi que o plano russo de investimentos billionários no setor agrícola do pais ainda não foi objeto de estudo e análise em nosso país. Seria bom começarmos a pensar nisso para não perder o último bom lugar no trem chamado Rússia.

Várias vezes durante estes dias em Moscou o assunto do comércio entre Brasil e Rússia foi o principal tema de discussão em reuniões de trabalho e outras ocasiões menos formais. Ninguém que gosta e conhece os dois paises consegue entender e aceitar o nível limitado das relações comerciais atuais, os equívocos nas negociações, pouco produtivas e, principalmente, a inexplicável passividade dos empresários brasileiros e a ineficiência das Câmaras de Comércio do Rio e São Paulo (será que precisamos das duas para tudo isso?). Falta criatividade e estímulos concretos.

Enquanto o Brasil está perdendo tempo e espaço, os últimos lugares no trem da parceria com a Rússia estão sendo tomados por outros países. A primeira notícia que vi na imprensa brasileira quando cheguei foi referente ao recuo de investimentos estrangeiros em 2005, enquanto outros paises do BRIC (além do Brasil, Rússia, Índia e China) acusam crescimento. Talvez nosso parceiro estratégico poderia preencher este vazio, mas os olhos daqui não estão voltados a Moscou.

Em 1790, o escritor russo Aleksander Radichev escreveu seu famoso livro "Uma viagem de Petersburgo a Moscou", onde mostrou o atraso, a decadência, o provincianismo, a burocracia e a pobreza do pais. Para gerações de russos, este livro serviu de fiel retrato da Rússia naquela época. Os tempos mudaram. Quem sabe, de repente, em 2007, alguém escreve outro livro destacando a nova Rússia, dinâmica, rica, comercialmente agressiva, pragmática e que uma vez para sempre atrai o interesse dos brasileiros por este fabuloso mercado. Será que para isso Paulo Coelho optou viajar pela Transiberiana?

. Aleksander Medvedovsky é diretor geral da Ostalco do Brasil.

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