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18/03/2010 - 10:54

Origem e Evolução Humana

O Homem ainda está em processo evolutivo?

A afirmação “o homem descende dos macacos”, feita por Charles Darwin ao lançar sua teoria evolucionista em 1859, foi tão forte e marcante que até hoje ainda há pessoas que acreditam ser ela verdadeira. E você, o que acha? O homem é uma evolução do macaco? Como e quando surgiu o homem? Quais foram as pressões seletivas que induziram mudanças físicas no homem? Por que passamos a andar em pé? O que nos levou ao descomunal aumento do cérebro? E ainda, o homem continua em processo evolutivo ou atingiu seu limite?

São perguntas instigantes sobre um tema que sempre desperta grande curiosidade. E o objetivo desse artigo é responder a todas elas e a muitas outras. Mas vamos começar entendendo um pouco o progresso da opinião sobre origem e evolução.

As idéias de Darwin sobre adaptação, sobrevivência dos mais aptos e evolução progressiva não são originais. Elas já haviam sido levantadas por outros pesquisadores e naturalistas que o antecederam, incluindo o grande filósofo grego Aristóteles, que, em 300 A.C., foi o primeiro a delinear os princípios de adaptação e seleção natural, sem, porém, compreendê-los. Goethe, em 1794, destacava que a futura indagação dos naturalistas seria a de como foi que os bovinos teriam adqüirido seus chifres e não o porquê de sua utilização. Saint-Hilaire, em 1795, suspeitava que as espécies seriam variações em torno de um mesmo tipo original e que as mesmas formas não se teriam perpetuado desde a origem de todas as coisas. Seu próprio avô, Dr. Erasmus Darwin, também defendia algumas dessas idéias em 1795.

No entanto, a maioria desses antecessores apenas levantavam dúvidas e conceitos sobre os fatos que observavam na natureza, sem conseguir explicar o porquê deles existirem. Somente dois naturalistas conseguiram formular teorias para tentar explicá-los amarrando os diversos conceitos isolados já levantados em sua épocas: Lamarck e Darwin. Ainda assim, todos devem ser admirados pela coragem de expressar opiniões totalmente novas e contrárias aos conceitos reinantes e muito enraizados da Criação Divina (criacionismo) __ tudo e todos os seres foram criados por Deus exatamente como são vistos hoje.

Para se ter uma idéia de como o criacionismo graçava unânime, Georges Cuvier, naturalista francês que deu início à paleontologia moderna ao identificar espécies de dinossauros fósseis, em 1817, atribuiu sua extinção ao fato deles não terem conseguido embarcar na Arca de Noé. Dizer naquela época (e ainda hoje para alguns) que os seres vivos existentes eram descendentes de outros que sofreram modificações e que o homem descendia do macaco não podia ser considerado outra coisa se não blasfêmia, heresia.

O naturalista francês Lamarck, em 1801, defendia a tese de que todas as espécies descendiam de outras e foi o primeiro naturalista cujas conclusões provocaram grande atenção nos meios científicos. Deve-se a ele, o grande serviço de haver despertado a atenção de todos para a possibilidade de que as modificações (evolução) seriam o resultado de leis, e não de intervenções divinas. Entretanto, Lamarck trilhou um caminho errado ao defender a lei do desenvolvimento progressivo, onde as modificações adqüiridas pelo fator uso-e-desuso seriam passadas para as gerações seguintes. Para ele, o hábito de um determinado procedimento físico ou influência da natureza fazia com que o orgão ou membro envolvido fosse aos poucos, de geração em geração, adaptando-se e melhorando seu desempenho. O pescoço comprido da girafa, por exemplo, seria devido à necessidade de alcançar as folhas altas das árvores, ou seja, de tanto esticar o pescoço a girafa teria aumentando seu tamanho (veja exemplo teórico mais à frente). Em contrapartida, se um membro não fosse usado ele acabaria, também aos poucos, regredindo até desaparecer. A influência de suas idéias foi tão forte, que até hoje ainda existem pessoas que acreditam nessas teorias ultrapassadas.

Charles Darwin foi o primeiro naturalista, em 1859, a apresentar os fatos evolutivos dos seres vivos como devidos a um equilíbrio de forças em conflito. No entanto, devemos admitir que ao tratar da seleção natural como principal causa da origem, multiplicação e evolução das espécies, Darwin não tinha total compreensão de como se dava o processo evolutivo e não contava com os conhecimentos que hoje temos para saber como homens e macacos descenderam de ancestrais comuns que se ramificaram em linhagens diferentes. É importante dizer que sua teoria só foi integralmente aceita pela ciência depois da descoberta da estrutura em dupla-hélice do DNA, em 1953. Na introdução de seu livro A Origem das Espécies, Darwin dá um exemplo de humildade: "Ninguém deve se surpreender com o fato de permanecerem obscuros tantos pontos relacionados com a origem das espécies, desde que se dê o devido desconto a nossa profunda ignorância quanto às inter-relações existentes entre todos os seres vivos que nos circundam".

Pois bem, ainda que os criacionistas não acreditem, o homem, como todos os seres vivos, é um produto da evolução. No entanto, surge daí uma importante questão: as forças que possibilitaram essa evolução continuam atuando? Antes e para responder, vale rever alguns conceitos básicos sobre a nova teoria da evolução e os fatores seletivos que canalizaram a evolução humana.

Para quem tem interesse em voltar ao passado, ao final desse artigo há um texto que descreve, de forma breve e cronológica, como ocorreu essa evolução, quando e onde a linhagem hominídia (homem) se separou da linhagem antropóide (gorilas e chimpanzés) e quais foram os estágios pelos quais a linhagem hominídia passou até atingir o nível humano atual.

A Moderna Teoria da Evolução- Apesar da teoria evolutiva moderna ter sido pautada em torno de uma nova combinação dos conceitos originais de Darwin, ela é essencialmente uma teoria de dois fatores básicos: a diversidade e a adaptação são encaradas como resultados da produção contínua de variação genética e dos efeitos seletivos do ambiente. Explico melhor.

Toda variação genética (mudança de uma característica estrutural) em uma espécie advém das mutações que ocorrem ao acaso e com intervalos de tempo indefinidos nos indivíduos que a compõe. A mutação __ alteração na constituição genética em um dos dois gametas que formarão um novo embrião __ irá gerar uma variação estrutural que poderá ser vantajosa, nociva ou sem importância para a adaptação do indivíduo ao seu ambiente.

A seleção natural, que fixa padrões severos e constitui uma peneira pela qual só passa uma minoria, irá atuar no sentido de "por a prova" tal variação estrutural. Sendo vantajosa para o indivíduo, terá enormes chances de ser preservada e passada para as gerações futuras. Caso seja nociva, fará com que o indivíduo tenha poucas chances de sobreviver ou não permitirá que sobreviva e se reproduza. As variações sem importância não são afetadas pela seleção natural e passam para as gerações seguintes de forma oscilante.

Sendo sempre muito oportunista e selecionando qualquer tipo de mecanismo que ajude a preservar a variabilidade genética, a seleção natural está pronta a cada geração para tomar uma direção nova e é um dos fatores mais importantes que induzem mudanças evolutivas. Mas não é o único. Entre os outros fatores está o acaso, muitas vezes responsável pelo desvio na direção da evolução.

Para entender como isso ocorre, voltemos ao tema da mudança evolutiva ser um processo de dois fatores básicos. O primeiro é a produção de variação genética que ocorre na reprodução sexual dos seres vivos, onde o acaso é o regente supremo. Um macho produz bilhões de gametas durante a vida e a fêmea centenas. Apesar disso, um casal só pode produzir, no máximo, dependendo da espécie, uma centena de filhotes. Aí entra o acaso, responsável pela escolha dos gametas que formarão os embriões que terão sucesso. Podemos dizer então que a mutação é governada pelo acaso antes de ser testada pela seleção natural, o segundo fator, que então escolherá os genótipos (constituição genética da prole) que produzirão a geração seguinte.

A seguir, são apresentados dois exemplos que ajudarão você a entender como o acaso e a seleção natural coexistem e atuam nas novas variações e adaptações dos seres vivos, direcionando sua evolução.

Exemplo Teórico: como surgiu o pescoço comprido dos antílopes e girafas? Imaginemos, hipoteticamente, que a há milhões de anos na África, em uma população herbívora ruminante qualquer com comprimento de pescoço mediano, nascem, ao acaso, dois indivíduos com variação: um com pescoço menor do que a média e outro com o pescoço maior do que a média. Como os indivíduos dessa espécie competem entre si e com outras espécies herbívoras pela vegetação disponível na copa das árvores, teremos duas situações. O indivíduo com pescoço menor terá poucas chances de sobreviver, já que não poderá alcançar as folhas que a maioria alcança. Já o indivíduo com pescoço maior, passará a ter um nicho diferente dos demais para se alimentar, já que conseguirá alcançar folhas que a maioria não consegue. Terá assim maiores chances de sobreviver e passar a nova característica para sua prole, que, melhor adaptada, tenderá a se tornar maioria na população nas gerações futuras. Até que ocorram novas variações nesse sentido, direcionando a evolução para um aumento gradativo do pescoço nesse ambiente.

Exemplo Real: as asas da mosca são importantes para a sua sobrevivência? Em quase todo o planeta, as moscas, assim como a maioria dos insetos, têm nas asas um eficiente meio de sobrevivência. Com elas, podem procurar alimento e fugir dos predadores. Visto desta forma, a asa é extremamente importante, e, sem ela, o indivíduo teria poucas chances de competir e sobreviver na maioria dos ambientes naturais. Entretanto, nas praias de uma ilha do Pacífico, onde sopra um vento forte e constante, vive, protegida do vento entre pedras empilhadas, uma espécie de mosca sem asas. Ocasionalmente, ocorre uma mutação que gera o aparecimento de asas rudimentares. Basta, então, que essas asas, agora ou nas gerações futuras, sejam suficientes para um "vôo experimental" e o indivíduo é imediatamente levado para o mar pelo vento. Esse é um exemplo marcante e real de como a seleção natural atua. As asas, que são vantajosas em quase todo o planeta, passam a ser nocivas nesse ambiente. O que normalmente seria um direcionamento evolutivo natural, será sempre deletado pela seleção natural nesse ambiente em especial.

Quais foram os fatores seletivos mais importantes que canalizaram a evolução humana? Como e por que o homem adqüiriu suas características únicas, tão distintas dos outros animais, pode ser respondido através de dois tipos básicos de fatores seletivos: as mudanças no meio ambiente e as modificações no comportamento.

As principais mudanças no ambiente foram provocadas pela criação das cadeias de montanhas no Rift Valley. Essa barreira natural passou a reter os ventos e nuvens e modificaram o clima no leste da África há 8 milhões de anos. Enquanto o lado oeste não sofreu grandes mudanças climáticas e suas florestas tropicais permaneceram abrigando os ancestrais dos gorilas e chimpanzés, o lado leste caracterizou-se por um aumento gradativo de aridez nas áreas habitadas pelos hominídios (ancestrais do homem), causando a criação de um novo habitat que variava desde as savanas florestadas até as áreas muito áridas, quase desérticas. A ocupação e sobrevivência nesse novo habitat forçou as mudanças no comportamento. E diversos fatores intimamente correlacionados, descritos a seguir, favoreceram e explicam essas modificações no comportamento.

A Locomoção Bípede - Freqüentemente diz-se que os nossos ancestrais adotaram posição ereta e locomoção bípede quando passaram da vida arbórea para a vida no chão. Contudo, esta correlação não é necessária. Nenhum dos outros grandes primatas terrestres adotou o bipedalismo. Gorilas e chimpanzés andam no chão com as articulações dos dedos e os babuínos são estritamente quadrúpedes. Como não sabemos exatamente como isso ocorreu, podemos apenas sugerir que alguma pecurialidade dos ancestrais arborícolas dos hominídios primitivos, como braços mais curtos, assim como alguma pré-adaptação anatômica, tenha favorecido o bipedalismo.

A locomoção bipedal, em especial nos seus estágios primordiais, deve ter sido uma forma muito ineficiente de locomoção para um mamífero de quatro membros. Porém, só evoluiu nessa direção porque fornecia vantagens. E, presumivelmente, suas maiores vantagens seletivas foram permitir uma melhor visão das redondezas (prevenção de predadores e visualização de alimento), liberar os membros anteriores para problemas novos de comportamento (possibilitou um melhor aproveitamento e utilização das mãos na manipulação de ferramentas e no transporte de alimento) e diminuir a área do corpo que sofria a incidência da radiação solar em campo aberto (possibilitou a procura de alimento nos horários mais quentes, quando os outros animais, especialmente os predadores, estavam inativos).

O início do bipedalismo se encontra nos primórdios da linhagem hominídia, mas seu aperfeiçoamento deve ter ocupado a maior parte do tempo subseqüente. As diferenças de pélvis e extremidades posteriores entre os gêneros Australopithecus e Homo mostram que foram necessários cerca de 2 milhões de anos para aperfeiçoar o bipedalismo.

A Utilização de Ferramentas- Acreditava-se antigamente que o uso e a fabricação de ferramentas fosse o fator fundamental para o aumento dramático no tamanho do cérebro no estágio Homo erectus. No entanto, sabe-se hoje que o uso e a confecção de ferramentas é muito comum no reino animal __ os chimpanzés são exímios no uso de ferramentas e capacitados a adaptar implementos naturais aos seus propósitos.

A confecção de ferramentas simples no estágio Australopithecus e Homo habilis aparentemente não provocou uma pressão seletiva forte para o aumento no tamanho do cérebro e não exigiu uma reconstrução mais profunda das extremidades anteriores. As ferramentas só se tornaram cruciais para a evolução humana, com maior significado seletivo, somente na passagem do estágio Homo erectus para Homo sapiens, quando a sobrevivência passou a depender do aumento na capacidade de criar e usar novas e melhores ferramentas de trabalho e de luta.

O Aumento no Tamanho do Cérebro - O caráter diferencial mais importante entre o homem e os antropóides (gorilas e chimpanzés) é certamente o descomunal aumento do cérebro, acompanhado pelas faculdades permitidas por essa nova massa encefálica. O aumento dramático de tamanho do cérebro humano no espaço de tempo compreendido entre 1,3 e 0,3 milhão de anos atrás, ou seja, 1 milhão de anos, é a modificação evolutiva mais rápida que se tem conhecimento __ dos primeiros macacos hominóides aos primeiros hominídios, cerca de 12 milhões de anos se passaram sem grandes aumentos na capacidade endocraniana média.

Qualquer tentativa de descobrir o que teria sido responsável por este acontecimento evolutivo dramático é sempre hipotética. Certamente, o responsável foi uma combinação de pressões seletivas sobre a mudança do homem para uma zona adaptativa inteiramente nova. Entre os fatores causais, três parecem ter sido particularmente importantes. Antes de descrevê-los, cabe um esclarecimento quanto à suposição de que a introdução de uma dieta mais rica em carne (proteína) foi uma das principais causas do rápido crescimento do cérebro.

Sabemos hoje que uma dieta rica em proteína animal é muito importante para o desenvolvimento da criança. No entanto, não se pode atribuir a esse fato tamanha distinção, haja vista que nenhum dos grandes mamíferos carnívoros evoluiu para um considerável aumento do cérebro simplesmente porque comia carne. Como será visto adiante, o mais importante foi a mudança na dieta e não a dieta em si. Em outras palavras, a busca de soluções mais eficientes para a obtenção da carne (captura da presa) foi mais importante do que comê-la simplesmente. A dieta mais rica em proteínas pode, isto sim, ser considerada como um fator adicional concomitante que forneceu as condições nutritivas favoráveis ao crescimento do cérebro.

1º Fator - A caça de animais grandes: o que distinguia a caça do homem primitivo da caça inconstante de seus parentes __ chimpanzés, gorilas e babuínos capturam ocasionalmente pequenas presas __ é que para o homem a caça passou a ser uma das principais fontes de alimento (proteínas da carne) e que seu método de caça era muito diferente daqueles empreendidos pelos outros animais.

Para obter um grau crescente de sucesso na caça aos grandes animais, especialmente quando esses passaram a ser os ariscos ungulados (gnus, antílopes e gazelas) das planícies africanas, foi necessário o desenvolvimento de uma série de novos comportamentos: (a) para caçar e retalhar suas presas, permitindo a distribuição e transporte, houve um grande aumento na necessidade de inventar e manufaturar novas armas e ferramentas; (b) para um maior sucesso na caçada passou a haver a necessidade de cooperação entre vários machos, inclusive com a divisão de trabalho e responsabilidades, e o desenvolvimento de técnicas mais refinadas de comunicação; (c) as freqüentes expedições prolongadas de caça, com a conseqüente ausência dos homens, passou a obrigar o estabelecimento de campos-base onde as mulheres e crianças podiam ser deixadas sob os cuidados de guardas; (d) o sucesso na caça exigia planejamento, conhecimento dos movimentos das manadas, acúmulo de informações (memória) para localização de fontes de água, para acontecimentos estacionais e para os hábitos das várias espécies de presas, e um cuidadoso controle dos competidores. Com tudo isso, não há dúvidas de que os prêmios de caças bem sucedidas provocaram uma pressão seletiva forte para um cérebro melhorado.

2º Fator - A articulação da palavra: planejamento, cooperação e divisão de trabalho não teriam tido muita utilidade sem um sistema eficiente de comunicação. A capacidade de falar é a característica humana mais típica, sendo provável que tenha sido a invenção-chave que provocou o passo do hominídio para o homem.

A fala permitiu a estrutura comunitária e transformou o homem em um organismo social. Como tal, havia a necessidade de mecanismos de promoção de direitos comunais, mitos e crenças. Todos esses mecanismos exerceram uma intensa pressão para a melhoria da fala, aumento do vocabulário e aumento da capacidade de acúmulo de memória. Essa cadeia de desenvolvimento inclui os mecanismos de feedback positivo, ou seja, cada progresso exercia uma pressão seletiva em favor de um desenvolvimento ainda maior do cérebro.

3º Fator - A estrutura do grupo reprodutor: existem evidências que comprovam que a evolução dos hominídios primitivos direcionada para uma estrutura mais complexa de família favoreceu a rápida evolução no tamanho do cérebro. Ao explicar esse terceiro fator, entenderemos também por que esse aumento foi tão rápido e por que parou?

É interessante saber que, basicamente, todo ser vivo existe e sobrevive para perpetuar sua espécie, passando seus genes para as gerações seguintes. Nesse aspecto, todas as evoluções adaptativas tendem para uma melhoria da eficiência dos equipamentos naturais que favorecerão a sobrevivência do indivíduo (comer e não ser comido) e sua primazia dentre seus pares para que ele tenha como prêmio o sucesso reprodutivo.

O sistema de reprodução original do homem provavelmente era a poligamia, onde a monogamia seria uma condição derivada. Explica-se: a poligamia estaria reservada ao indivíduo que, por apresentar as qualidades de líder, teria maiores possibilidades de ter mais de uma mulher __ evidências sugerem que poderia inclusive haver maior fertilidade __ e passar seus genes à próxima geração. Aos outros machos do grupo, não conseguindo usurpar o lugar do chefe, caberia no máximo, quando muito, uma mulher.

Na estrutura de população social dos hominídios primitivos, a posição de chefe do grupo, clã ou tribo não seria herdada, mas adqüirida por uma combinação de atributos, como liderança, oratória, iniciativa, coragem na caça e na guerra com outros grupos e força e habilidade na luta. A seleção natural, dentro desses grupos, passou então a favorecer o indivíduo com maior poder inventivo, previsão, liderança e, em muitos casos, cooperação, e não somente a força bruta e o egoísmo.

Aqueles que davam uma maior contribuição para a harmonia e o bem-estar do grupo poderiam, em conseqüência, tornar-se ancestrais de um maior número de descendentes viventes. No grupo social, as qualidades éticas passaram a ser importantes componentes de adaptabilidade. Desta forma, mais importante do que ser o mais forte era associar esta força à inteligência. Daí se tem uma grande pressão seletiva para melhorar rápida e continuamente o cérebro.

No entanto, todos esses fatores que favoreceram o rápido aumento do tamanho do cérebro subitamente perderam seu poder ao atingir o nível de Homo sapiens, e o tamanho do cérebro estabilizou-se. Aparentemente, houve um estágio na evolução humana em que os grupos melhor sucedidos cresceram tanto que a vantagem de fertilidade dos líderes se tornou mínima. Quanto maior fosse um grupo populacional, tanto menor seria a contribuição relativa dos genes de seu líder para o patrimônio gênico da geração seguinte e tanto mais protegido (biologicamente) do processo seletivo estaria o indivíduo médio ou abaixo da média. Assim, nos grandes grupos, o sucesso reprodutivo não estaria mais correlacionado com a superioridade genética adaptativa. Com o tempo, houve uma redução ainda maior do prêmio seletivo para as características que previamente haviam sido favorecidas durante a evolução humana.

Fica assim evidente o porquê de a tendência que criou o homem não ter continuado em direção ao super-homem. A estrutura social contemporânea passou a não dar mais prêmios de sucesso reprodutivo aos mais fortes, mais inteligentes ou mais bem adaptados. Todos os membros da sociedade passaram a se beneficiar igualmente com as descobertas médicas e tecnológicas dos indivíduos mais bem preparados. Assim, o indivíduo abaixo da média, desde que não estivesse muito abaixo, passou a viver e se reproduzir com tanto sucesso quanto o indivíduo acima da média. Não é por outra razão que, diferente dos primórdios onde havia grande semelhança física entre homens e entre mulheres, hoje temos uma incrível diversidade global de tamanhos e formatos físicos.

A Reconstrução do Crânio- O aumento do tamanho do cérebro foi o mais importante fator responsável pela reconstrução completa do crânio. Duas pressões seletivas adicionais também favoreceram esta reconstrução. Uma foi o deslocamento do suporte do crânio para frente, resultante da posição ereta. A outra foi a diminuição da pressão seletiva favorável a mandíbulas fortes e dentes grandes, desnecessários para alimentos mais macios (mudança na dieta), pré-cortados (ferramentas) ou preparados (fogo). Tudo isso possibilitou a redução das mandíbulas, dentes e a parte facial do crânio __ provocada pela redução dos músculos faciais e de todas as cristas e elevações ósseas às quais se prendiam esses músculos __ e a simultânea ampliação da parte cerebral.

O Papel do Comportamento - O comportamento (e suas mudanças) é uma das mais fortes pressões seletivas no reino animal. A evolução dos hominídios para o homem foi extremamente rica em transformações: arborícola para terrestre, dieta vegetariana para aumento da dieta de carne, uso de ferramentas para confecção de ferramentas, e outras mais. Cada uma destas modificações iniciou novas pressões seletivas, facilitando e acelerando o processo de “hominização” ou, mais posteriormente, invertendo ou interrompendo as tendências anteriores. E um dos aspectos mais significativos do comportamento hominídio foi o aumento gradual do tempo dispendido para os cuidados com a prole.

Cuidado com a prole: a instituição dos cuidados com a prole, marcante em todos os mamíferos, permitiu um decréscimo da mortalidade ao acaso (acidental). A sobrevivência da prole passou a depender cada vez mais da qualidade do cuidado dado pelos pais. O aumento do tamanho do cérebro induzido pela prática de cuidado com a prole requereu um aumento do período de desenvolvimento do filhote e, conseqüentemente, um aumento do período durante o qual é necessário o cuidado materno. Esse desenvolvimento reforça o valor seletivo do cuidado com a prole e provoca pressão seletiva mais intensa em favor de um aumento do cérebro dos pais.

A maioria dos animais inferiores nasce com uma resposta pronta para a quase todas as situações que o ambiente lhes apresenta. Reagem instintivamente e têm pouca capacidade para aprender e acumular informações novas e úteis. Este sistema herdado de respostas prontas é chamado de “programa fechado”. Já os organismos superiores, como os mamíferos, têm um “programa aberto”. Significa ter uma capacidade muito maior de aprender e acumular informações novas que lhes permitam reagir adequadamente às situações ambientais. O gradiente de tamanho dessa “abertura” irá determinar o quão vulnerável será o filhote ao nascer __ quanto menos respostas instintivas mais vulnerável e mais dependente de cuidados.

Nos mamíferos, esse gradiente começa pelos herbívoros, cujos filhotes são capazes de correr junto à manada e escapar de predadores horas após nascer, e dependem dos cuidados maternos somente até 6 meses a 1 ano de idade (até o desmame), passa pelos carnívoros, que necessitam aprender as estratégias de sobrevivência e de caça, e para isso dependem dos pais por cerca de 1 a 2 anos, continua pelos primatas, que precisam aprender a utilizar suas ferramentas e a conviver em uma estrutura social hierárquica mais complexa, e para isso costumam permanecer sob a guarda dos pais por cerca de 1 a 3 anos, e termina no homem, cujos filhotes dependem dos pais por pelo menos 10 anos (atualmente essa dependência pode ir até os 25 anos ou mais).

O cuidado com a prole protege o jovem enquanto ele adqüire as informações que necessitará para enfrentar as leis da seleção natural. O programa aberto permite uma resposta muito mais refinada a estímulos externos, melhorando, conseqüentemente, as possibilidades de sobrevivência do indivíduo. E o aumento da abertura desse programa passou a requerer um sistema nervoso central muito maior e, assim, exerceu uma pressão seletiva adicional em favor do aumento do tamanho do cérebro.

Outra característica do cuidado com a prole é que ela é uma manifestação típica de seleção de grupo __ a espécie é considerada como um agregado de populações em competição, cada qual com uma mistura distinta de tendências. Populações com combinações boas de genes prosperarão, enquanto aquelas com combinações “perdedoras” serão eliminadas. Assim, os hominídios primitivos não enfrentavam seu ambiente adverso somente como indivíduos, mas, principalmente, como grupos de famílias ou pequenos bandos disputando os recursos com outros bandos semelhantes. Mais uma vez, a sobrevivência do grupo dependia essencialmente da sobrevivência da prole que, por sua vez, dependia da qualidade e da intensidade de cuidados e de informações fornecidas pelos pais e pelo grupo como um todo.

O Futuro do Homem- Para saber qual será o futuro da espécie humana, devemos agora responder se as forças que possibilitaram nossa evolução continuam atuando e se o homem, como é atualmente, seria o ponto final de um desenvolvimento evolutivo. Por mais longa que tenha sido a linha de desenvolvimento que culminou na criação do homem (veja o texto Uma Volta ao Passado, abaixo), seu curso evolucionista chegou praticamente ao fim, ou pelo menos a uma restrição, e não é provável que a linhagem humana produza jamais outra coisa a não ser o homem.

Já tendo alcançado praticamente o limite do desenvolvimento orgânico, o homem se encontra no fim de sua evolução física, no que diz respeito aos seus aspectos mais importantes. Poderá ainda perder algum cabelo, seus dentes poderão degenerar um pouco mais e as unhas dos pés poderão desaparecer, mas não ocorrerão grandes transformações, pois há tempos temos nos poupado das forças da natureza que moldaram nossa evolução.

Graças à superioridade de intelecto, o homem continuará como homem pelo resto de sua existência. E essa existência não poderá ser abreviada por qualquer grupo de animais conhecidos, mas somente por ele mesmo. Ainda assim, enquanto não houver uma sintonia global sobre a urgente necessidade do desenvolvimento sustentável, com preservação, decência e dignidade para todos os seres que habitam este Planeta, o homem, um triunfo biológico da natureza, não poderá considerar-se vitorioso do ponto de vista social e ecológico.

. Por: Marcelo Szpilman, Biólogo Marinho formado pela UFRJ, com Pós-Graduação Executiva em Meio Ambiente (MBE) pela COPPE/UFRJ, é autor do livro GUIA AQUALUNG DE PEIXES, editado em 1991, de sua versão ampliada em inglês AQUALUNG GUIDE TO FISHES, editado em 1992, do livro SERES MARINHOS PERIGOSOS, editado em 1998/99, do livro PEIXES MARINHOS DO BRASIL, editado em 2000/01, do livro TUBARÕES NO BRASIL, editado em 2004, e de várias matérias e artigos sobre a natureza, ecologia, evolução e fauna marinha publicados nos últimos anos em diversas revistas e jornais e no Informativo do Instituto. Atualmente, Marcelo Szpilman é diretor do Instituto Ecológico Aqualung, Editor e Redator do Informativo do citado Instituto, diretor do Projeto Tubarões no Brasil (PROTUBA) e membro da Comissão Científica Nacional (COCIEN) da Confederação Brasileira de Pesca e Desportos Subaquáticos (CBPDS). [Site: http://www.institutoaqualung.com.br b| E-mail: [email protected] ]

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