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19/06/2007 - 10:28

O lado obscuro de uma proposta

O título desse artigo talvez consiga expressar a melhor forma de traduzir a nova tentativa do governo Serra de buscar o aumento da arrecadação, através de uma bem arquitetada – e maquiavélica – proposta de reembolso de 30% do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) recolhido no estado de São Paulo. O projeto de lei, divulgado recentemente, visa à geração de um benefício financeiro ao cidadão consumidor que, no ato da compra de qualquer mercadoria ou serviço que gere o tributo em questão, solicite a nota fiscal.

Para ter direito ao “prêmio”, o cidadão ou a empresa interessada devem se cadastrar no site da Receita Federal e escolher a opção desejada para receber de volta parte desse tributo. A devolução pode ser aplicada no pagamento do IPVA (Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores), creditada em contas correntes bancárias ou mesmo usada em cartões de crédito. É uma oferta tentadora, um benefício de pai para filho que o estado gentilmente fará aos seus bem-comportados cidadãos. Os mais desatentos certamente concordarão.

Ao analisar, porém, as entrelinhas contidas na proposta, nota-se que, pelas regras de tal reembolso, corre-se o risco de “rasgar” a Constituição Federal, invalidando suas cláusulas pétreas, como a que está no Artigo 5° e que trata dos direitos individuais e privacidade do cidadão.

Ao usar o projeto como isca, e com um discurso estapafúrdio de melhorar a situação de arrecadação de impostos e “premiar” o cidadão exemplar com 30% dos créditos obtidos pelo ICMS, o Estado promove a quebra do sigilo fiscal e bancário de todos que optarem por essa modalidade. E, pior, com o “consentimento” do próprio lesado, o contribuinte. Isso porque, para a emissão da nota fiscal eletrônica, o consumidor necessita informar seu CPF (se for pessoa física) ou CNPJ (se for pessoa jurídica). Com tal informação nas mãos, as Receitas Estadual e Federal poderão rastrear o poder de compra de cada um e compará-lo à sua Declaração Anual, com uma quebra de sigilo automática.

O que se contesta nessa medida não é o combate à sonegação fiscal, mas a forma sub-reptícia encontrada pelo governo para ampliar a fiscalização. E agindo de maneira desleal, mostrando-se parceiro do povo para ludibriá-lo e manipulá-lo.

O caminho deveria ser inverso. Se fosse real vontade do estado - ou mesmo de quem atualmente o representa - melhorar a arrecadação com base em tal projeto de lei, fica claro que existe uma “gordura” de 30% no volume do ICMS arrecadado e que poderia muito bem ser diminuída da massacrante carga tributária das empresas.

Menos oneradas, as empresas poderiam baixar seus preços e o cidadão, consumir mais. Com maior circulação no comércio e em outros setores, maior também seria a arrecadação do governo, que ganharia sem que para isso tivesse que usar verdadeiras “armadilhas fiscais”.

O contribuinte precisa ficar atento. Ele não deve deixar de cumprir suas responsabilidades para com o estado, mas precisa também abrir os olhos para não correr riscos de ser apunhalado surpreendentemente. O cidadão, afinal, deve garantir o respeito ao direito à privacidade e integridade, vertentes que a política não só do estado, mas também do país, parece querer desmontar.

Esse é o lado obscuro da proposta. Quem quiser, pode acreditar em mais uma lorota marota do governo. Mais sincero e funcional seria diminuir a carga tributária. Essa sim seria uma medida de apoio ao contribuinte e à movimentação do mercado. Mas é estranho e injusto usar o cidadão como “fiscal do estado” e de forma reembolsada ao abrir mão de um direito constitucional.

. Por: Daniel Augusto Maddalena é consultor especialista em cooperativismo e empreendedorismo.

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