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18/08/2010 - 14:09

Uma engenharia nada rotineira para o nosso TAV


Nos últimos dias, o nosso Trem de Alta Velocidade tem estado nas rodas de discussões. O edital de licitação saiu e a corrida para participar da grande obra começou. Por ser o primeiro no Brasil, e estarmos em um momento político tão sensível, o tema polariza as discussões. O assunto – originalmente técnico e econômico – entrou na agenda política e muitos passaram a defender posições. Realmente, é essencial discutir amplamente em sociedade.

Acontece que toda esta discussão acaba por tirar o foco original desta importante obra, que é o crescimento econômico por meio da integração das duas maiores regiões metropolitanas do País. Esta é muito mais do que uma simples ligação – é o maior desafio tecnológico de nossa engenharia nos próximos anos!

O primeiro trecho irá ligar o Rio de Janeiro a São Paulo e a Campinas, mas, ao que tudo indica, será apenas o início de uma rede que se estenderá para muito além, dando novas alternativas a empresas e consumidores de várias regiões econômicas. A obra é grande e complexa, e contém desafios para as mais diversas áreas da engenharia, gestão de projetos, TI e da gestão operacional.

O primeiro desafio é o próprio traçado, que inclui a Serra das Araras. Imagine que precisará ser construída uma infraestrutura com uma complexidade similar à rodovia dos Imigrantes, respeitando o meio ambiente... Passará pela Baixada Fluminense, Vale do Paraíba e pelo eixo SP-Campinas, regiões densamente povoadas. Nestes trechos, o desafio é não dividir as cidades em duas metades incomunicáveis, e integrar toda a economia da região. Serão necessárias muitas obras de arte (viadutos, pontes, mergulhões) para harmonizar esta estrutura à geografia local, e será essencial também otimizar a utilização dos recursos naturais. Um verdadeiro quebra-cabeça, que demandará talentos brasileiros.

Outro grande desafio é a construção de veículos adequados. Vencer os principais 400 km, incluindo a serra e os tempo de paradas, levando confortavelmente 500 passageiros em menos de 2h, vai exigir trens com potências da ordem de 8 MW. A passagem por túneis e viadutos com fortes ventos, a variação brusca de altitude e as drásticas diferenças climáticas exigirão materiais especiais e uma manutenção exemplar.

Todo o sistema precisará ser provido de energia limpa, constante e confiável. Será trazida de longe, convertida nas subestações ao longo da linha e colocada à disposição na rede aérea que alimenta os trens, que estarão circulando a mais de 300 km/h. Estas estruturas serão fruto de uma engenharia nada rotineira.

Há também os sistemas de comando e controle. A alta velocidade “estado da arte” no mundo não se fia mais exclusivamente na capacidade cognitiva de um maquinista. É um conjunto de sistemas integrados, gerenciando aceleração, frenagem, suavidade de marcha, gestão da energia, segurança nas estações - simultaneamente. Também aqui precisaremos de conceitos e soluções inovadoras, pois estão em pauta a segurança dos passageiros e a credibilidade do sistema.

Será uma obra que, concluída, terá levado a engenharia brasileira a um novo patamar. Os desafios somente poderão ser vencidos com conhecimento verdadeiro, adequado às condições brasileiras. Conhecimento este que já existe em diversas áreas e está bastante avançado em muitas outras. Porém, se juntássemos empresas puramente nacionais, o sistema não estaria em condições de funcionar plenamente até 2016. Ainda faltam algumas peças deste grande quebra-cabeça, que precisarão ser buscadas em outros lugares.

Uma possível fonte é P&D de empresas especializadas, em parceria com o meio acadêmico, apoiada por bancos de desenvolvimento ou investidores privados. Muitos sistemas conseguirão utilizar este modelo. Em outros casos, porém, a velocidade demandada do projeto precisará ser muito maior. Não poderemos esperar 20 ou 30 anos para ter uma tecnologia nacional, totalmente original. Nestes casos, a melhor saída será a transferência de tecnologia externa. De todas as formas, a concretização da obra culminará com o total conhecimento do sistema por brasileiros, aptos a tomar seu destino nas próprias mãos.

A largada dessa corrida foi dada e as regras estão claras. Os interessados já estão se aliando, calculando, negociando e buscando o equilíbrio para o empreendimento. Agora nos resta acompanhar e torcer para que, pelo menos, um destes grupos aceite correr os enormes riscos associados e encontre a melhor fórmula para que o Brasil consiga dar mais este importante passo em direção ao futuro que desejamos.

. Por: Peter Andreas Gölitz , diretor do Comitê Ferroviário do Congresso SAE BRASIL 2010

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