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28/08/2010 - 10:23

Preservação de óvulos, eis a questão

Nos últimos trinta anos as técnicas de reprodução assistida tiveram um avanço extraordinário. O nascimento de Louise Brown foi o marco que revolucionou os tratamentos de infertilidade conjugal no mundo. A fertilização in vitro, inicialmente usada na resolução de lesões na trompa do falópio, passou a ser indicada nos casos de alterações severas do sêmen, endometriose moderada a grave, distúrbios ovulatórios, adversidade imunológica etc.

As taxas de gravidez aumentaram com a evolução dos tratamentos com êxito de até 50% em mulheres com menos de 30 anos de idade. O mundo contemporâneo competitivo motivou a mudança do comportamento feminino que passou a priorizar a carreira profissional, postergando a gravidez para depois dos 35 anos. Mesmo com tantas formas de manter a beleza por mais tempo, o envelhecimento do aparelho reprodutivo não acompanhou a jovialidade da aparência externa. O que poucas sabem é que acima dessa faixa etária os óvulos, quase sempre, apresentam alterações cromossômicas influenciadas pela idade e pelo impacto ambiental.

Os contratempos fizeram a Medicina Reprodutiva encontrar soluções para que essa nova mulher realizasse o sonho de ser mãe, mesmo em condições adversas. Os avanços tecnológicos de laboratório procuraram mimetizar as condições do útero materno desenvolvendo tecnologias para o cultivo de gametas e embriões. A dificuldade para fertilizar o óvulo foi solucionada com o uso da injeção intracitoplasmática de espermatozoides (ICSI); as anomalias genéticas puderam ser avaliadas através do diagnóstico genético pré implantacional (PGD) etc.

Hoje, a técnica de crio preservação de gametas e embriões é a última palavra no tratamento da infertilidade. Milhares de casais podem se beneficiar de um banco de óvulos durante o tratamento, principalmente os portadores de câncer em idade fértil.

Dados epidemiológicos demonstram a necessidade da preservação da fertilidade em mulheres acometidas de câncer antes de serem submetidas a quimioterapia ou a radioterapia. Cerca de 8% das neoplasias malignas ocorrem antes dos 40 anos de idade. No Brasil, segundo o Instituto Nacional do Câncer (INCA), foram identificados 460 mil novos casos em 2009. A detecção precoce associada a tratamentos cirúrgicos, quimioterápico e radioterápico, cada vez mais eficazes, possibilita remissão significativa da doença ainda na idade reprodutiva. O tratamento da leucemia, por exemplo, que proporcionava sobrevida de 33% em cinco anos, entre 1971-1976, mostrou taxa de 80% no período de 1986-1990. Esses dados por si só justificam os grandes esforços científicos visando a preservação da fertilidade em mulheres com câncer.

O congelamento de espermatozoides é conhecido há mais de duzentos anos, sendo largamente utilizado nas últimas cinco décadas. O congelamento de embriões teve início em 1984, sendo hoje muito utilizado em função dos resultados satisfatórios. No entanto, o congelamento de óvulos sempre representou um desafio em decorrência das dificuldades relacionadas a recuperação do gameta após o descongelamento.

Atualmente a sobrevivência das mulheres após o tratamento de câncer está aumentando significativamente sendo natural o desejo de constituir uma família. Aquelas que tiveram a oportunidade de crio preservar os óvulos poderão realizar esse desejo tão importante para o ser humano.

Cientistas de vários países - Itália, Canadá e Japão - fizeram grandes investimentos a partir de 2001 para alcançar um desempenho adequado no congelamento dos óvulos. A formação de cristais de gelo no citoplasma e lesões na membrana pelúcida, foram entraves que dificultavam resultados ideais. Atualmente existem duas técnicas de congelamento de óvulos: congelamento lento e vitrificação.

O congelamento lento de óvulos usa um equipamento automático que, em uma hora, congela o óvulo a uma temperatura de 196°C negativos. Os resultados foram promissores após a constatação de algumas gestações, porém insatisfatórios em relação ao congelamento dos embriões.

Já o congelamento ultra rápido, também chamado vitrificação em virtude de o meio congelado permanecer transparente e similar ao vidro, é feito em alguns segundos. A técnica denominada Cryoloop propiciou índice de sobrevivência de 80 a 90%, fecundação em 65% e taxa de gravidez por transferência de 50%. Um trabalho que começou no Japão com um grupo liderado por M. Kuwayama e aprovado por outros especialistas como Al-Hasani (Alemanha), Cobo (Espanha), Antinori (Itália) e Nagy (EUA).

Outra indicação é a crio preservação de óvulos para doação a mulheres com menopausa precoce, falhas de implantação, abortos de repetição ou malformações genéticas. As que optarem em postergar a maternidade também se beneficiam com a técnica.

A sociedade contemporânea exige da mulher uma formação profissional que lhe permita competir com o intuito de ser bem sucedida socioeconomicamente. Assim, é muito frequente o exercício de dupla ou tripla jornada de trabalho, imputando-lhe um índice de estresse muito elevado. Esse sacrifício, associado aos malefícios da deterioração ambiental, provoca danos irreparáveis na constituição cromossômica dos seus óvulos. Atualmente pode-se congelar óvulos em idade fértil (menos de 35 anos) e preservá-los para posterior fecundação sem que o impacto da idade exerça influência negativa.

A síndrome de hiperestimulação ovariana é uma situação clínica dramática em decorrência da produção excessiva de óvulos, causando morbidade quando o quadro é severo. O congelamento dos óvulos permitiria evitar a transferência de embriões imediata postergando a fecundação e transferência em ciclos sucessivos evitando complicações indesejáveis.

Do ponto de vista jurídico o congelamento de óvulos é vantajoso em relação aos embriões, pois evitaria conflitos envolvendo o casal que solicite separação matrimonial. A aceitabilidade das várias correntes religiosas é menos restrita, permitindo a realização do sonho de constituir uma família.

. Por: Professor Dr. Dirceu Henrique Mendes Pereira – CRM (13834) – Professor-Doutor em Ginecologia e Obstetrícia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), Diretor Científico da Sociedade Brasileira de Reprodução Humana e Diretor-Médico da Clínica PROFERT de São Paulo.

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