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14/10/2010 - 09:52

Um direito à liberdade e à vida

Os primeiros registros de hemodiálise no mundo surgiram em meados dos anos 1960 e, logo depois, a terapia chegou ao Brasil. Na época, o tratamento resumia-se a conectar o paciente a uma máquina para que o sangue fosse filtrado externamente, já que, em decorrência da doença, os rins perdem gradativamente a função. Os pacientes não tinham outra alternativa a não ser submeter-se a este tratamento, que era o único capaz de lhes garantir a sobrevivência.

A chegada de outra modalidade de terapia renal ao Brasil em 1980, a Diálise Peritoneal, revolucionou o tratamento da doença: permitia que ele fosse feito em casa, favorecendo crianças, idosos e aqueles que residiam longe de um centro de hemodiálise. A liberdade proporcionada pelo método mudou a forma de tratar a doença e os ganhos em termos de qualidade de vida foram notáveis.

Em vez de se deslocar três vezes por semana até uma clínica ou hospital, essas pessoas tiveram como opção procurar uma clínica para receber treinamento e fazer o procedimento em casa. Ainda que pouco conhecida, a diálise peritoneal, foi introduzida há 30 anos no país e é disponibilizada pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O procedimento é tão eficaz quanto a hemodiálise e tem, a longo prazo, os mesmos resultados em sobrevida. Entretanto, cabe ao médico juntamente com o paciente e a família verificar qual método é mais indicado para cada caso.

A diálise peritoneal foi concebida nos Estados Unidos em 1977, sendo a primeira forma de terapia domiciliar no mundo. No início, o procedimento era totalmente manual, com a inserção no abdômen, duas a três vezes por semana, de um soro especial que filtrava o sangue por meio da membrana do abdômen. O paciente era perfurado toda vez que o procedimento era realizado. O progresso veio, numa primeira etapa, por meio da implantação de um cateter permanente de silicone. O passo seguinte foi a concepção da DPAC- diálise peritoneal ambulatorial contínua, uma modalidade que permitia que o soro especial fosse infundido e drenado do abdômen a cada seis horas. Só então foi criada uma máquina que permitia as trocas de soro durante a noite, chamada de diálise peritoneal automatizada.

Com a qualidade de vida resgatada, os pacientes ficavam livres para estudar, trabalhar, manter uma vida social ativa, enfim, realizar suas atividades diárias normalmente.

Resta a pergunta: se as duas terapias são igualmente boas, por que apenas 10% dos pacientes em diálise no Brasil fazem a modalidade peritoneal? Os fatores são múltiplos: o encaminhamento tardio dos pacientes faz com que a diálise de urgência seja a hemodiálise, devido à facilidade de se instalar um cateter na veia, em vez de um implante no abdômen; falta de estrutura nas clínicas para treinamento dos pacientes; falta de capacitação dos jovens nefrologistas nesta modalidade de diálise; diferenças de reembolso do procedimento favorecendo a hemodiálise. O Ministério da Saúde anunciou recentemente um reajuste de 7,5% para o tratamento apenas da hemodiálise, excluindo a terapia domiciliar. Além do reajuste proposto não solucionar a questão da falta de vagas para atendimento ao doente renal crônico, a verba desfavorece o reembolso dos honorários médicos para a diálise peritoneal, dificultando o acesso de novos pacientes com insuficiência renal crônica.

O baixo índice de adesão ao tratamento domiciliar demonstra que a diálise peritoneal é subutilizada no país. Uma prova disso é o fato de que a terapia não recebe reajuste do governo há mais de sete anos, apesar de ser um tratamento seguro, eficaz e que beneficia diretamente o paciente.

Pelo menos 30% a 40% da população em diálise poderia se beneficiar desta modalidade de tratamento. Para isso, é preciso que os programas de residência em nefrologia tenham um Serviço de Diálise Peritoneal bem estruturado e que possa treinar os jovens médicos; que se diagnostiquem precocemente os pacientes com doença renal crônica e as opções de diálise sejam apresentadas a eles; as discrepâncias de reembolso do procedimento devem desaparecer, ou seja, o pagamento não deve influenciar a escolha do procedimento pelo médico ou clinica. Estas medidas permitiriam estender o benefício desta moderna terapia a milhares de pacientes no Brasil. É inaceitável que as pessoas ainda morram por falta de tratamento após 30 anos da disponibilidade dessa terapia no Brasil. Mais do que liberdade, está é uma questão direito à vida.

.Por: Dr. Miguel C Riella, presidente da Fundação Pró-Renal Brasil, professor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná e pioneiro na introdução da diálise peritoneal no Brasil.

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