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27/11/2010 - 09:44

Violência urbana: a ordem da desordem


Esta semana testemunhamos uma verdadeira política de endurecimento ao crime organizado no estado do Rio de Janeiro. Vale lembrar que na década de 1980 os Estados Unidos ficaram marcados pelo “endurecimento” do sistema de justiça criminal em relação ao crime. Desde então, a população prisional norte americana vem aumentando regularmente, na ordem aproximada de 500 mil para dois milhões de indivíduos em vinte anos (1980-2000).

Esta política governamental promoveu uma explosão na construção de unidades prisionais, levando as legislaturas estaduais americanas a grandes crises orçamentárias e a repensar suas onerosas abordagens sobre o crime. A partir de então, mudou-se consideravelmente a frente de combate a esse problema social, restabelecendo a possibilidade de livramento condicional e tratamento em lugar de encarceramento para alguns sentenciados por delitos relacionados com drogas. Em lugar de ser “duro com o crime” passou-se a ser mais efetivo e “inteligente com o crime”.

No Brasil e em qualquer lugar do mundo, as consequências da criminalidade podem ser extremamente graves: seqüestros relâmpagos, roubos, lesões, traumas, mortes etc. Consequentemente, a maioria das pessoas imagina o pior, o que pode gerar angústia, stress e medo. A materialização dessa situação trouxe para o cotidiano brasileiro os vigilantes de domicílios, cães de guarda, grades, alarmes, circuitos fechados de televisão e outros. Toda essa parafernália caracteriza uma espécie de "medievalização" da arquitetura das grandes cidades do país.

Outros fenômenos sociais, como a prostituição infantil e o crime de forma generalizada, passaram a ser mais visíveis devido à urbanização e o desenvolvimento de grandes cidades. As metrópoles geraram um meio social realmente novo, mas, sobretudo concentraram fenômenos e permitiram ver o que antes permanecia oculto. Além disso, é claro que o anonimato das ruas permitiu que mais indivíduos se lançassem a atividades consideradas ilícitas com menos controle do que teriam em vilarejos onde a vida de cada um é controlada sistematicamente pela coletividade. (Miskolci, 2005)

Um dos efeitos da proliferação e da repetição dos atos de incivilidades urbana é a instauração de um sentimento de abandono do espaço público e de impunidade. Ao mesmo tempo, as vítimas sentem-se desprotegidas, estimulando a falta de confiança nas instituições e a ausência do sentimento de cidadania, o que pode levá-las a deserdar de espaços coletivos (como a escola). A proliferação de incivilidades também pode ser a porta de entrada para violências mais duras (Abramoway).

Vivemos em um ambiente social de total desconfiança, insegurança e medo, sendo percebido como potencialmente perigoso. Como relata Kowarick (2005) “isso tem levado a novas formas de segregação social que primariamente tem como objetivo a autoproteção dentro de locais fechados: eles são enclaves organizados e fortificados [...] em total segurança […] supridos por novos conceitos de habitação […] a relação estabelecida com o resto da cidade e sua vida pública é de distanciamento [...]”. A solidariedade entre vizinhos, que costumava ser forte no passado, passou a ser menos comum e perceptível no presente.

Naturalmente o “medo urbano” traz a tendência de afastar as pessoas do convívio social e, sem a interação dos membros da comunidade, os mecanismos de controle social passam a estar mitigados ou mesmo ausentes. O sentimento crescente de distanciamento interpessoal provocado pelo medo enfraqueceria os controles sociais, o que, juntamente com a falta de efetividade do sistema de segurança pública e a presença de “agentes motivados” para a delinqüência, estabeleceria um clima propício para a proliferação da desordem e do crime.

Nota-se o grande empenho e esforço da Secretaria de Segurança Pública do Rio de Janeiro, para restabelecer a ordem social através das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), tentando traduzir na prática a filosofia da polícia comunitária, criando novas expectativas em relação ao papel dos policiais como agentes mobilizadores de comunidades, seja como mediadores entre as demandas apresentadas e outras agências governamentais, instituições publicas e privadas para solução de problemas comuns. Sabe-se que, mesmo quando a polícia realiza uma repressão qualificada e profissional em prol do controle da criminalidade, tal estratégia, por si só, será incapaz de lograr diminuir a sensação do medo decorrente da insegurança. A explicação segundo estudiosos, repousaria no fato de que o medo do crime estaria muito mais relacionado com a dinâmica do fenômeno da desordem e a falta de instrumentos de autodeterminação das comunidades. Isso aconteceria principalmente em zonas de exclusão social, regiões urbanas dilapidadas e/ou de processo súbito e desordenado de ocupação. A desordem urbana passaria a estar associada à questão da criminalidade enquanto sua manifestação preliminar.

Na opinião de Tereza Caldeira (1996), a criminalidade violenta distribui-se iniquamente: os moradores dos bairros mais pobres são sabidamente as maiores vítimas da violência das grandes cidades brasileiras, enquanto os mais ricos são os que vivem nos locais mais seguros. A difusão da segurança privada tende a ser mais um sistema perverso de aprofundamento dessa desigualdade.

Autores como Rodrigues Guerreiro e João Yunes, entendem que a violência é uma questão mundial e a consideram um problema de utilidade pública e usar simplesmente a repressão não funcionam. O germe da violência se propaga em proporções semelhantes às doenças infecciosas, com o grande diferencial de que esta problemática não pode ser combatida apenas com vacinas. Percebe-se que políticas públicas paliativas não surtem efeitos eficazes contra a criminalidade, necessitando de medidas mais consistentes, que atuem de forma continua e com o envolvimento e participação dos vários segmentos sociais, inclusive da comunidade local onde está sendo implantada.

. Por: Eduardo Veronese da Silva, Licenciatura em Educação Física – UFES, Bacharel em Direito – Fabavi/ES | Especialista em Direito Militar – UCB/RJ | Subtenente da PMES | Email. [email protected]

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