Página Inicial
PORTAL MÍDIA KIT BOLETIM TV FATOR BRASIL PageRank
Busca: OK
CANAIS

29/01/2011 - 08:25

Um bom começo

O filósofo e educador norte-americano John Dewey dizia que o governo da maioria era apenas um “rascunho” do que a sociedade democrática poderia ser – uma comunidade em que todos os cidadãos desenvolvessem a capacidade de pensar, participar e avaliar. Para tanto, é necessário colocar a educação a serviço do aperfeiçoamento da democracia. O educador Anísio Teixeira, discípulo de Dewey, acreditava que a escola tinha como missão preparar o cidadão para o exercício da soberania popular.

No Brasil, chegamos a dar passos nessa direção, mas esse processo foi bruscamente interrompido pela ditadura militar, que mercantilizou e elitizou o ensino justamente num momento em que o país crescia, se urbanizava e se tornava mais complexo. A sociedade brasileira pagou um preço altíssimo pela opção perversa desse modelo excludente. Apenas nos últimos anos é que o Governo Federal vem mudando essa triste realidade, ampliando, sem precedentes, as oportunidades no ensino técnico e superior e apoiando fortemente os estados e municípios.

Isto se deu, entre outras medidas, por meio da criação do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação) da valorização dos profissionais da educação (piso salarial), da implantação de mecanismos de avaliação do desempenho escolar e investimentos como a construção de escolas de educação infantil em tempo integral Brasil afora.

Mas ainda serão necessários muito esforço e muitos investimentos para recuperar o tempo perdido e, em especial, melhorar a qualidade da educação básica, hoje, sem dúvida, nosso maior desafio. E os governadores e prefeitos também tem obrigação constitucional e política de agirem nesse sentido, até para que as Vinte metas do Plano Nacional de Educação, enviado pelo executivo e em discussão no Congresso, se transformem em realidade no próximo decênio.

Por aqui, na unidade mais rica e populosa da Federação, a qualidade da educação pública se degrada dia a dia. Apesar de ter um orçamento da ordem de R$ 20 bilhões em 2011, o estado ostenta índices medíocres de desempenho. Segundo dados do Pisa (indicador internacional de educação) divulgados em dezembro, São Paulo ocupa apenas a 7ª posição no ranking nacional. Já pela última avaliação do Enem, as escolas paulistas ficaram em 6º lugar. E em termos de salários iniciais de professores, em 2010, a rede estadual de ensino paulista caiu quatro posições, ficando na 14ª colocação entre 27 Estados.

Um dos aspectos mais dramáticos da situação educacional do estado é revelado pela aplicação distorcida da “progressão continuada” pelo governo paulista. Esse conceito foi concebido pelo mestre Paulo Freire , que acreditava que o aluno não deveria ser punido por erros da escola. Ao invés disso, ele propunha dar ao aluno melhores condições de aprendizagem. A progressão continuada exige a participação dos professores no projeto pedagógico, a conformação das turmas – os chamados ciclos – de acordo com o grau de desenvolvimento e a efetiva aprendizagem dos alunos. Mas o que os governos tucanos implantaram, sem nenhum debate, foi a “aprovação automática”, algo que ocorre independente de os alunos terem aprendido ou não. Os professores não podem avaliar os alunos e, ao final de cada ciclo, são obrigados a empurrá-los às séries seguintes, deixando que muitos cheguem ao final do Ensino Fundamental como analfabetos funcionais. Em vez de inclusão, esses alunos ficam excluídos de qualquer possibilidade de sucesso futuro.

Como se não bastasse, os professores da rede paulista de ensino estão completamente desprestigiados. Além de ganharem pouco (média de R$ 1.515,00), o que os obriga a cumprir várias jornadas, quase metade dos professores de São Paulo são contratados em caráter precário, sem direito aos benefícios da carreira, sujeitos a constantes mudanças de escolas. Eles também não têm autonomia, já que as avaliações dos alunos são feitas por meio de provas unificadas, com base no conteúdo de uma cartilha da Secretaria da Educação. O governo padroniza não apenas o conteúdo do que é ensinado em sala de aula como também o discurso dos docentes.

Felizmente, o novo secretário da Educação do Estado, Herman Voorwald, ex-reitor da Unesp, reconhece que existe um enorme grau de desmotivação do corpo docente da rede de ensino estadual e que é necessário não apenas resgatar a dignidade dos professores, com salários e carreiras decentes, como também restabelecer o diálogo – brutalmente rompido na administração anterior – entre o governo e professores. Voorwald também admite corrigir as falhas do sistema de mérito implantado pela equipe do ex-governador José Serra, propõe reduzir o número de professores temporários de 30 mil para 10 mil até 2013, além de propor ênfase no fortalecimento do Ensino Médio, sem o qual não há Ensino Superior de qualidade. É um bom começo, portanto, no sentido de reparar as enormes distorções do passado. Esperamos que não pare por aí.

. Por: Newton Lima, Doutor em engenharia pela USP é Deputado Federal eleito (PT-SP). Foi reitor da UFSCar (92/96) e prefeito de São Carlos ( 2001 a 2008).

Enviar Imprimir


© Copyright 2006 - 2024 Fator Brasil. Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Tribeira