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05/04/2011 - 09:11

A Lei da Ficha Limpa e a Decisão do Supremo Tribunal Federal

Em 24 de março de 2011, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) – por maioria de votos – decidiu que a Lei Complementar nº 135/2010 não deve ser aplicada às eleições de 2010, por desrespeito ao artigo 16 da Constituição Federal/88, que trata da anterioridade da lei eleitoral.

Mas do que se trata essa questão intrincada? A Lei Complementar nº 135, de 04.06.2010, chamada de “Lei do Futuro” pelo Ministro Luiz Fux, teve por objeto alterar a Lei Complementar nº 64/90, que estabeleceu, de acordo com o § 9º do artigo 14 da Constituição Federal/88, casos de inelegibilidade, prazos de cessação e determinou outras providências, para incluir hipóteses de inelegibilidade que visam a proteger a probidade administrativa e a moralidade no exercício do mandato.

Dentre esses casos, têm-se os daqueles que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, desde a condenação até o transcurso do prazo de 8 anos após o cumprimento da pena, por crimes contra a economia popular, a fé pública, a administração e o patrimônio público, contra o patrimônio privado, o sistema financeiro, o mercado de capitais e os previstos na lei que regula a falência, contra o meio ambiente e a saúde pública, crimes eleitorais, de abuso de autoridade, de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores, formação de quadrilha, dentre tantos outros abomináveis.

No entanto, na Sessão Plenária de 24.03.2011, foi retomado o julgamento do Recurso Extraordinário nº 633.703/MG (recurso de Leonídio Correa Bouças, candidato a deputado estadual em Minas Gerais que teve seu registro negado com base nessa LC nº 135/2010), os ministros decidiram, pelo placar mais apertado possível, pela não aplicação da norma nas eleições gerais de 2010.

O Ministro Gilmar Mendes, relator do RE, votou pela não aplicação da lei às eleições gerais do ano passado, por entender que o artigo 16 da CF/88, que estabelece a anterioridade de um ano para lei que altere o processo eleitoral, é uma cláusula pétrea eleitoral que não pode ser mudada, nem mesmo por lei complementar ou emenda constitucional.

Outro voto pelo provimento do recurso foi o do Ministro Marco Aurélio, para quem o STF não tem culpa de o Congresso Nacional só ter editado a lei no ano das eleições, “olvidando” o disposto no artigo 16 da Constituição Federal/88.

E o que diz o propalado artigo 16 da Carta Constitucional? A redação literal desse dispositivo é: “A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência”.

O Ministro Celso de Mello, decano da Corte, expressou o seu entendimento no sentido de que qualquer lei que introduza inovações na área eleitoral, como fez a LC nº 135/2010, interfere de modo direto no processo eleitoral, na medida em que viabiliza a inclusão ou exclusão de candidatos na disputa de mandatos eletivos, fazendo incidir sobre a norma o disposto no transcrito artigo 16 da Constituição.

Dentre os votos que negaram provimento ao RE, tem-se que o Ministro Ricardo Lewandowski, que também exerce o cargo de presidente do TSE, considerou que a LC nº 135/2010 tem o objetivo de proteger a probidade administrativa e visa a legitimidade das eleições, tendo criado novas causas de inelegibilidade mediante critérios objetivos.

Por sua vez, os Ministros Joaquim Barbosa e Ayres Britto invocaram outro dispositivo constitucional nos seus votos, o § 9º do artigo 14 da CF/88. Este último ponderou que faz parte dos direitos e garantias individuais do cidadão ter representantes limpos. “Quem não tiver vida pregressa limpa, não pode ter a ousadia de pedir registro de sua candidatura”, afirmou.

Diante dessas manifestações de voto de alguns dos Ministros da Suprema Corte, verifica-se que o mote girou em torno de dois dispositivos constitucionais: qual deles deveria prevalecer neste caso? Essa é uma das questões mais intrincadas no Direito Constitucional. No confronto entre duas regras constitucionais, qual deve imperar?

No caso em comento, o STF decidiu por prevalecer o transcrito artigo 16 da CF/88, que trata do Princípio da Anterioridade da Lei Eleitoral.

E aqui há que se enfatizar outro argumento utilizado pelo Ministro Luiz Fux, para quem a anterior decisão do Tribunal Superior Eleitoral-TSE (manteve o indeferimento do registro da candidatura de Leonídio Correa Bouças a deputado estadual em Minas Gerais), não apenas contrariou o artigo 16 da CF/88, mas “feriu também de morte a garantia da segurança jurídica, inerente à necessária estabilidade do regime democrático, e que se vê surpreendida – esta é a palavra – com a criação, no meio do jogo democrático, de novas inelegibilidades que, para, além de desigualar os concorrentes, surpreende a todos”.

Seja como for, a única unanimidade conseguida neste caso emblemático foi no sentido de que o STF reconheceu a repercussão geral da questão, autorizando que os Ministros apliquem monocraticamente o entendimento adotado aos demais casos semelhantes, com base no artigo 543 do Código de Processo Civil.

No entanto, um assunto ainda está pendente. É que o STF, fiel ao Princípio da Inércia (o Poder Judiciário não pode se manifestar sobre algo que não lhe foi pedido) não decidiu se a Lei Complementar nº 135/2010 pode bloquear candidaturas de políticos condenados antes da sua promulgação, ocorrida em 04.06.2010.

Essa questão fatalmente será aventada, se não no pleito municipal de 2012 – o primeiro sob a égide da Lei da Ficha Limpa –, com certeza nas eleições nacionais de 2014. O Supremo Tribunal Federal será novamente chamado a se pronunciar.

. Por: Renato Confolonieri, advogado do escritório Fernando Quércia Advogados Associados,

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