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15/04/2011 - 10:06

Bullying: uma reeducação para a paz

O assunto bullying está sendo discutido há muito tempo. Após a tragédia na Escola Municipal Tasso da Silveira, em Realengo, no Rio de Janeiro, o tema está suscitando novos debates. De que forma os pais podem identificar se seus filhos são vítimas desse fenômeno e qual a melhor medida para conscientizá-los dos males que esse tipo de violência causa ao ser humano?

Inserido nessa problemática e apto a oferecer respostas a muitos questionamentos, Bullying e suas implicações no ambiente escolar, escrito por Sônia Maria de Souza Pereira e publicado pela Paulus, dispõe sobre as ações maléficas do bullying e sua complexidade, as aplicações e consequências para os agressores e vítimas e os danos causados para a escola e a família.

“A intenção foi trazer um suporte teórico para contribuir no entendimento do bullying como um problema gravíssimo que acontece no âmbito escolar, visto que as agressões do bullying não devem ser confundidas com outras corriqueiras, casuais, pois aquelas se caracterizam pela intenção de magoar, causar danos, e pela repetição contra um mesmo alvo, causando-lhe sérios transtornos físicos, cognitivos e psicológicos — sendo este último o mais grave”, afirma a autora.

No livro, a autora propõe modelos de prevenção e intervenção que visam à redução da violência, assinalando também as condições em que o fenômeno se desenvolve, suas manifestações, efeitos, personagens e situações características.

Entrevista realizada com a autora.: .Como o bullying se manifesta? . Em primeiro lugar precisamos entender o que pode ser caracterizado como bullying. Trata-se de agressões sem motivação evidente perpetradas repetidamente contra uma mesma vítima que, por algum motivo, não consegue se defender sozinha. Segundo as pesquisas, existem três formas de manifestação do bullying: a forma direta, a indireta e a psicológica. As agressões diretas incluem o tomar pertences, bater, chutar, empurrar, ferir com objetos, rasgar materiais escolares e uniformes ou mesmo tomar o dinheiro do lanche. Na forma indireta, podemos incluir as agressões verbais: apelidos pejorativos, fazer gozações, acusações injustas, espalhar boatos maldosos, entre outras. Também podemos acrescentar a essa categoria a forma de exclusão social na qual a criança fica fora do grupo, não podendo participar ou brincar com seus integrantes.

Como agressões psicológicas, menciono o próprio resultado das constantes agressões citadas acima e, ainda, o constrangimento para a vítima, a intimidação, a ridicularização sofrida, o próprio medo. O bullying caracteriza-se justamente pelo fato de essas agressões serem constantes, em alguns casos, diárias. Esse motivo é que o torna tão nefasto.

.Como a escola pode identificar a ocorrência de bullying? .É muito difícil identificar o bullying, justamente por ser um fato que ocorre longe do olhar do adulto ou do profissional escolar. Quando um professor ou outro adulto presencia um episódio de agressão, na maioria das vezes o evento é interpretado como violência banal ou corriqueira. Em alguns casos a família é chamada juntamente com a criança, e esta pede desculpas à vítima. Mas não é bem por aí. É preciso ter em mente que conhecer as características do bullying é muito importante na identificação do problema, para que não se confundam os eventos. Esse papel a mídia já vem fazendo há muito tempo, trazendo uma série de informações acerca do assunto. O bullying tem suas próprias características, não podendo ser confundido com agressões casuais ou mesmo brincadeiras de mau gosto. Enquanto estas não causam sequelas mais graves, aquelas provocam inúmeros danos ao psiquismo das vítimas.

Para que a escola identifique a presença do bullying, é necessário uma observação constante. Se uma criança está retraída, amedrontada, fica fora do grupo, deixa de brincar no recreio, fica sempre por perto de um adulto em vez de estar com outras crianças, já é indício de que alguma coisa está errada. A criança vítima geralmente tem medo de ir à escola. Às vezes seu rendimento escolar cai, não participa da aula por medo das gozações, e demais aspectos observáveis por um olhar mais atento.

Existem várias maneiras de identificar a presença do bullying na escola. Além da observação sistemática, podemos também aplicar questionários anônimos aos alunos, com perguntas diretas sobre agressões sofridas e/ou presenciadas. Essa é a maneira mais adequada de identificação, pois as agressões acontecem na presença de outros alunos, que não denunciam por medo de serem as próximas vítimas.

.Como as instituições de ensino podem contribuir para a formação de uma cultura de não violência na sociedade? .O primeiro passo é trazer a sociedade para dentro da escola por meio da família dos alunos, pois há muito tempo ela deixou de ser uma instituição na qual o estudante recebia a complementação da sua educação. Por uma série de motivos, a família deixou ao encargo da escola o papel da educação das crianças.

As escolas devem, também, estar abertas à comunidade na qual estão inseridas. Promover eventos esportivos, cursos, palestras e debates sobre violência e formas de evitá-la ou mesmo minimizá-la também contribui. Cursos de capacitação aos jovens para inseri-los no mercado de trabalho são de fundamental importância, porque é muito mais fácil fazer uma intervenção primária, ou seja, impedir que crianças e jovens se envolvam com a criminalidade, do que retirá-los do crime. Ocupar o tempo deles com esportes, cursos, reforço escolar já colabora para a redução do envolvimento com a violência. Essas ações já são um bom começo para ajudar na formação de uma cultura de não violência. Convidar a família a participar ajuda a ampliar os laços com a escola.

.Quais medidas devem ser tomadas para evitar a manifestação do bullying? .A verdade é que não existem soluções definitivas, nem mesmo “receita de bolo” que possa evitar as manifestações do bullying. Ele é um problema social, no qual a família, a escola, a mídia, todos devem se responsabilizar e promover uma educação para a paz. Conhecer as características do fenômeno, suas formas de manifestação, os locais preferidos pelos agressores, assumir que o problema existe em todas as escolas do mundo, mesmo em maior ou menor escala, e principalmente promover uma observação mais atenta, já contribui para a redução das agressões. Levar ao conhecimento dos próprios alunos as consequências do envolvimento com as práticas de bullying e promover a participação de todos eles na fiscalização ajuda a reduzir esses episódios. Deixar um espaço para denúncias anônimas pode auxiliar, principalmente aqueles que têm medo de ser as próximas vítimas. Mas é preciso ter o cuidado de verificar a veracidade dos fatos para não cometer injustiças. No caso de se comprovar a presença de agressões, chamar os envolvidos, procurar saber o que está realmente acontecendo e trabalhar com eles. Para a vítima, trabalhar a assertividade; para o agressor, uma boa proposta seria buscar a solução nele próprio, ou seja, deixá-lo apontar sugestões sobre o que fazer e evitar que a vítima continue sendo alvo de suas investidas.

.A origem do bullying está ligada ao ambiente escolar ou familiar? .A ambos, pois muitas vezes sua presença nas escolas se deve à fiscalização ineficiente, ao descrédito nas reclamações das vítimas ou testemunhas, pois muitos acham os casos pontuais e sem importância, além do fato de que na maioria das vezes não se trabalha a alteridade entre os alunos. Com relação à família, além de achar determinados eventos coisas de criança, ela não leva a sério as reclamações dos filhos, pois crê que tais fatos são inofensivos, normais na relação entre crianças e/ou adolescentes. Tanto a escola quanto a família desconhecem as terríveis consequências do bullying no psiquismo dos envolvidos e os transtornos cognitivos causados.

Muitas vezes o agressor está apenas reproduzindo a violência sofrida no seu seio familiar ou grupo de amigos. Também pais muito protetores, permissivos, violentos ou omissos podem contribuir para seus filhos se envolverem, sendo possíveis vítimas ou agressores em eventos relacionados ao bullying.

Escolas que não levam a sério as denúncias de agressão ou as implicações entre alunos, ou mesmo que deixam as crianças muito à vontade no recreio, sem fiscalização adequada, estão ajudando e muito para a expansão dos casos de bullying.

.Especialistas apontam que os praticantes de bullying possuem grande potencial em se tornar adultos com práticas antissociais e violentas. Como os pais podem identificar esse tipo de comportamento nos filhos e trabalhar para evitar tais condutas? .Para alguns pais é difícil identificar esse tipo de comportamento em seus filhos, pois, às vezes, eles próprios agem com violência. Ou muitas vezes os agressores, próximos aos pais ou aos outros adultos, agem naturalmente, sem indícios de violência, ou mentem, dizendo não serem verídicas as acusações de agressão que lhes são imputadas. Mas é possível, sim, identificar alguns traços comportamentais em crianças e jovens que praticam bullying. Como existem várias formas de agressão, há algumas mais fáceis de reconhecer. Por exemplo, crianças que chegam da escola com pertences, dinheiro, vestuário que não são seus são pistas de que estão praticando atos ilícitos, e neste caso cabe aos pais apurarem o fato. Outra evidência são as constantes reclamações e queixas feitas por parte da escola sobre o comportamento da criança dentro da unidade escolar ou em seu entorno. Se os pais recebem constantemente queixas sobre seu filho, com certeza já é sinal de que algo não vai bem. É papel deles tentar tirar o véu sobre os olhos e enxergar (ou mesmo procurar investigar) o comportamento do filho, buscando ajuda com especialistas (psicopedagogos, psicólogos, pediatras ou mesmo o próprio professor e outros profissionais da escola) para solucionar o problema o mais cedo possível, a fim de evitar maiores danos.

.Com relação à criança que sofre as agressões, como a escola pode identificá-la e evitar o problema, já que, normalmente, ela se sente insegura e não consegue solicitar ajuda? . Existem algumas formas para a verificação de tais fatos. Por exemplo: um excelente aluno, extrovertido, alegre, que de repente muda de atitude, torna-se arredio, o rendimento escolar decresce, fica triste e não participa da aula, às vezes deixando até de frequentá-la por medo de sofrer novas agressões, é indício de que algo está acontecendo, como no dito popular “onde há fumaça há fogo”. Portanto, alguma coisa precisa ser feita.

Como a criança sozinha jamais irá buscar ajuda (ou quando busca muitas vezes não encontra), cabe ao professor ou aos demais profissionais da escola serem bons observadores e tentarem reconhecer as causas da mudança de comportamento, além de levarem mais a sério as queixas de seus alunos. Uma maneira saudável é dialogar com esse aluno, questionar algum coleguinha mais próximo sobre o que está acontecendo e buscar, com a direção, identificar o agressor, para só então trabalhá-lo com a vítima e até promover um evento com a participação de todos os alunos no combate à violência. Vale, inclusive, aproveitar a oportunidade para levar ao conhecimento de todos as consequências do bullying. Isso permitirá que os próprios alunos encontrem soluções pacificadoras de combate às agressões, principalmente do bullying.

.E como os pais destas crianças vítimas de bullying podem identificar o problema em casa? .Como podem ajudá-las? .Para os pais, as observações não se distinguem muito das que devem ser feitas pela escola. O maior diferencial é o fato de eles conhecerem melhor seus filhos e poderem detectar mais facilmente os problemas. No caso da queda do rendimento escolar, o fato de se recusar a ir à escola, o medo, a insegurança, os materiais rasgados e/ou quebrados, não querer lanchar durante o recreio, entre outras observações, são indícios de violência sofrida. Para evitar tais ocorrências, os pais devem dialogar sempre com os filhos, perguntar como foi o dia na escola, o que aconteceu, se lancharam. E caso encontrem alguma coisa anormal (uniforme, mochila, livros ou cadernos rasgados), procurar saber como aconteceu.

Sempre é válido lembrar: deve haver confiança entre pais e filhos para o diálogo acontecer. Caso haja alguma evidência de agressão, procurar a escola para que tome as devidas providências, sem expor a criança como “delatora”. Isso evita danos piores. O importante é que os pais não achem que a violência faz parte do desenvolvimento infantil. Isso não é verdade. A cultura da não violência deve começar em casa, e os pais têm um importante papel nessa tarefa.

.Na sua opinião, quais são os fatores determinantes da violência? .Há algumas décadas eu diria que era o fator socioeconômico, mas hoje está comprovado: ele não é mais determinante para ela, visto que está disseminada por todo o tecido social. Hoje eu diria que os fatores predominantes, mas não únicos, são: a crescente mudança na estrutura familiar, o consumo de drogas lícitas e ilícitas (ou mesmo o tráfico destas), a crescente inversão de valores, a própria influência da mídia e do consumismo, esta horrenda má distribuição de renda na qual dois mundos, incluídos e excluídos, vivem paralelamente no mesmo ambiente, entre muitos outros. A lista é extensa! Podemos afirmar que a própria globalização contribuiu para a inserção de novas perspectivas de vida e consumo, muito aquém do perfil econômico da sociedade brasileira.

Sônia Maria de Souza Pereira nasceu em 1973, em Floraí/PR. Em 2007, formou-se em Pedagogia pela Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia. No decorrer do curso, tomou conhecimento sobre a temática do bullying, passando a observar sistematicamente sua presença nas escolas e o desconhecimento do assunto por grande parte dos profissionais da educação. De seu trabalho monográfico resultou este livro, visando despertar os educadores para a compreensão do fenômeno.

.[Bullying e suas implicações no ambiente escolar | Autora: Sônia Maria de Souza Pereira |Coleção: Pedagogia e Educação Acabamento: Costurado | Formato: Costurado | 96 Páginas |Preço: R$ 12,50 | Área de interesse: Educação].

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