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07/05/2011 - 07:43

Bodas de Coral de uma trama que parou o Brasil


Você observa um amigo com trabalho até a cabeça, sendo azucrinado pelo chefe, recebendo ainda mais tarefas e, sem sentir, canta “lerê, lerê, lerê, lerê, lerê, lerê...” Mas de onde vem a memória desse trecho, o hábito do brasileiro repeti-lo sempre que vê alguém sendo explorado? A letra de “Vida de Negro” é de Dorival Caymmi e fazia parte da trilha sonora da novela “Escrava Isaura”, de Gilberto Braga, adaptada do romance abolicionista de Bernardo Guimarães. Se o livro dele já causa grandes emoções, imagina a história com imagens coloridas... O folhetim, que teve cem capítulos, estreou na TV Globo há 35 anos, provocou rios de lágrimas e transformou uma morena, ligeiramente estrábica, em heroína nacional. Lucélia Santos e Edwin Luisi eram os protagonistas. Apesar de inúmeras barbaridades praticadas pelo vilão Leôncio Almeida (o inesquecível Rubens de Falco), a escrava e o jovem rico conseguiram se casar. Será que depois de todo esse tempo, ainda estão juntos?

Embora fosse exibida no horário das seis da tarde, tratava-se de uma novela bem ao estilo dramalhão. Ela se passava em 1865, época terrível da escravidão no Brasil. Para ser o mais fiel possível ao século XIX, a maioria das cenas do folhetim foi gravada nas cidades de Conservatória e Vassouras, no Estado do Rio de Janeiro. Na trama, a escrava branca, Isaura, era filha de uma mucama mulata, que morreu no parto. Abominada pelo seu senhor (comendador Almeida – Gilberto Martinho), era protegida por sua senhora e madrinha (Ester – Beatriz Lyra). Com ela, Isaura aprendeu a ler, escrever, tocar piano e comportar-se como uma singela dama. Ficava linda e delicada nos vestidos que ganhava da madrinha e usava sempre parte dos cabelos presos. Tudo ia bem até a morte de Ester e a chegada do filho dela, Leôncio. Um crápula nojento! Pois não foi que o temido escravocrata cismou com Isaura, passando a assediá-la? Ao ver que não conseguiria chegar às vias de fato com a meiga heroína, Leôncio atormentou e humilhou a escrava todos os dias. Quando descobriu que ela estava namorando Tobias (Roberto Pirillo), dono da fazenda vizinha, aí pirou de vez. Ele incendiou a cabana onde Tobias aguardava por Isaura. Como desgraça pouca é bobagem, Tobias estava acompanhado da esposa de Leôncio (Malvina – Norma Blum), que tentava ajudar o casal. Os dois morreram em uma cena antológica da teledramaturgia. Que ódio do Leôncio! Depois de um longo luto, quando também vestimos preto como ela, Isaura fugiu para outra cidade. Lá, conheceu Álvaro, um abolicionista e, após um tempinho, os dois se apaixonaram. Só que Leôncio, aquele sacripanta, não dava trégua e recapturou a pobrezinha da Isaura – que foi levada novamente para a fazenda. E pronto... voltou a sofrer todas as maldades do maluco, chegando a ser mandada para o tronco. Enquanto queríamos entrar na televisão para salvar Isaura, Álvaro descobriu que Leôncio estava totalmente falido, procurou os credores e comprou todos os seus bens, inclusive Isaura. Ao saber que ficou na miséria e sem a mulher que desejava, o louco fez um favor aos milhares de telespectadores: se matou com um tiro. Finalmente, Isaura e Álvaro puderam viver em paz.

A novela foi um fenômeno de audiência no Brasil e vendida, pela TV Globo, para quase cem países. Decididamente, “Escrava Isaura” é um marco na história da teledramaturgia brasileira. Dirigida por Herval Rossano, ela contou com uma participação especial de Henriette Maurineau, correu o risco de colocar um rosto desconhecido no papel da protagonista, obrigou Rubens de Falco a andar com seguranças para não ser espancado nas ruas, mostrou na telinha a maior vergonha da nossa História e despertou a ira dos censores da ditadura que, em determinada fase da trama, proibiram Gilberto Braga de usar a palavra escravo – o autor passou a usar “peça”.

Bodas de Coral de um novelão. Isaura e Álvaro, da adaptação de Gilberto Braga, ainda estarão juntos? Com certeza... Derramamos muitas lágrimas e torcemos por eles. Têm quatro filhos, três netos, moram em uma rua tranquila no Jardim Botânico, zona sul do Rio de Janeiro, e passam férias em Conservatória e Vassouras. E quem quiser que conte outra.

.Por: Vera Lucas é jornalista e escritora-Vera Lucas ([email protected]) é jornalista graduada pela UFRJ em 1981 e pós-graduada em Docência Superior (Universidade Estácio de Sá/2.000). É autora dos livros “Introdução ao Jornalismo”, “O texto para a Mídia Eletrônica” e “Comunicação Comunitária”, publicados pela Faculdade CCAA Editora. Já trabalhou em diversas redações de revistas, jornais e TVs nas funções de repórter, redatora, editora de texto e roteirista. Foi chefe da Assessoria de Comunicação (ASCOM) da Secretaria de Estado de Educação. Também atuou como professora universitária de Comunicação Social para graduação e pós-graduação. Blog é http://veralucas.wordpress.com.

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