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07/06/2011 - 11:56

Restrição à aquisição de imóvel rural por estrangeiro. Só não entendi o porque

Deste de 1971 existe uma lei que restringe a aquisição de imóvel rural por estrangeiro. O estrangeiro, pessoa física, com visto de turista, ainda que tenha inscrição no CPF, para comprar um imóvel rural no Brasil está sujeito às restrições relacionadas (a) ao tamanho da propriedade, que não poderá exceder a 50 módulos rurais; (b) se for em loteamento rural, ao percentual de lotes de propriedade de estrangeiros não poderá exceder a 30%; (c) à aprovação da entidade federal com autoridade sobre a segurança nacional, se o imóvel estiver em área de segurança nacional; (d) à extensão do total de terras pertencentes à estrangeiros limitada a ¼ da superfície do município; e (e) à vedação de doação de terras da União ou dos Estados[1].

As restrições não se aplicam somente ao estrangeiro pessoa física, mas também ao estrangeiro pessoa jurídica (empresa criada e existente de acordo com leis de outros países), e a empresa brasileira criada e existente de acordo com as leis brasileiras, porém controladas por estrangeiros. A polêmica está justamente nesta última categoria. A Constituição Federal, em vigor desde 1988, dizia em seu artigo 171 que havia as empresas brasileiras e as empresas brasileiras de capital nacional. As empresas brasileiras eram aquelas que tinham sede e administração no Brasil, porém poderiam ter participação de estrangeiros em seu capital, e as empresas brasileiras de capital nacional eram aquelas cujo controle efetivo e permanente fosse de pessoas físicas domiciliadas e residentes no Brasil ou empresas controladas pelo governo.

Em 1995 foi aprovada a Emenda Constitucional no. 6, , que acabou com a distinção entre empresa brasileira e empresa brasileira de capital nacional mediante a revogação do artigo 171. A partir de então, todas as empresas com sede e administração no Brasil passavam ser empresas brasileiras, independentemente de quem participasse do seu capital social.

Então passou a valer o entendimento de que as restrições que existiam desde 1971 para a aquisição de imóvel rural por pessoa jurídica controlada por estrangeiro não eram mais aplicáveis, porque a Constituição Federal, conforme alterada pela Emenda Constitucional no. 6, não mais distinguia a empresa com sede e administração no Brasil sujeita ao controle de brasileiros e a empresa com sede e administração no Brasil sujeita ao controle de estrangeiros.

As restrições para aquisição de imóvel rural por empresa com sede e administração no Brasil, sujeita ao controle de estrangeiros, deixaram de prevalecer entre 1998 e agosto de 2010, quanto foi aprovado pelo Presidente da República e publicado no Diário Oficial da União o Parecer da Controladora Geral da União, vinculada à Advocacia Geral da União no. 01/2008-RVJ ("Parecer AGU/2008"). De acordo com o Parecer AGU/2008 independentemente do artigo 171 da Constituição Federal, conforme revogado pela Emenda Constitucional no. 6, não mais distinguir as empresas com sede e administração no Brasil, tal distinção remanesce no artigo 172 da Constituição Federal que determina que "a lei disciplinará, com base no interesse nacional, os investimentos de capital estrangeiro, incentivará os reinvestimentos e regulará a remessa de lucros".

Desta forma, quando se lêem as restrições de 1971 para a aquisição de imóvel rural por empresa com sede e administração no Brasil sujeita ao controle de estrangeiros, tais restrições seriam interpretadas na Constituição Federal de 1988 como a disciplina aos investimentos de capital estrangeiro, conforme previsto no artigo 172.

Ainda, cumpre salientar que a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 190, determina que "a lei regulará e limitará a aquisição ou o arrendamento de propriedade rural por pessoa física ou jurídica estrangeira". Essas pessoas, para fins da Constituição Federal, seriam o estrangeiro pessoa física e o estrangeiro pessoa jurídica (empresa criada e existente de acordo com leis de outros países).

Assim sendo, independentemente da revogação da distinção entre empresa brasileira e empresa brasileira de capital nacional, o Consultor Geral da União entende que as autoridades brasileiras têm o direito de disciplinar os investimentos de capital estrangeiro e, nesse sentido, as restrições de 1971 são válidas e eficazes.

Todas essas discussões eminentemente jurídicas não são um fim em si mesmo. Por trás disso tudo existem razões para imposição de restrições para aquisição de imóvel rural por estrangeiro, seja pessoa física, seja pessoa jurídica, seja empresa brasileira controlada por estrangeiro. As razões oficiais do Parecer AGU 2008 são as seguintes: (a) Expansão da fronteira agrícola com o avanço do cultivo em áreas de proteção ambiental e unidades de conservação;

(b) Valorização desarrazoada do preço da terra e incidência de especulação imobiliária gerando aumento no custo do processo de desapropriação voltada para reforma agrária, bem como a redução do estoque de terras públicas para esse fim;

(c) Crescimento da venda ilegal de terras públicas;

(d) Utilização de recursos oriundos da lavagem de dinheiro, do tráfico de drogas e da prostituição na aquisição de terras;

(e) Aumento da grilagem de terras;

(f) Proliferação de laranjas na aquisição de terras;

(g) Incremento dos números referentes à biopirataria na Região Amazônica;

(h) Ampliação, sem a devida regulamentação, da produção de etanol e biodiesel; e

(i) Aquisição de terras em faixa de fronteira pondo em risco a segurança nacional.

Expansão da fronteira agrícola sobre as áreas de proteção ambiental, crescimento ilegal de venda das terras públicas, lavagem de dinheiro, tráfico de drogas, prostituição e grilagem são problemas de polícia. O que nossas autoridades têm que fazer a respeito desses problemas é investir em educação, tecnologia e inteligência, de forma a conscientizar as pessoas e combater tais ilicitudes. Afinal, tanto brasileiros quanto estrangeiros podem cometer os ilícitos ora considerados.

No que se refere à valorização desarrazoada do preço da terra e seus impactos no custo da reforma agrária, quanto mais restrito for o mercado de terras rurais, menos precificado o será e, por conseguinte, mais atrativo será para a lavagem de dinheiro. Quanto à reforma agrária, vivemos em um mundo de 7 bilhões de potenciais famintos e temos uma grande vantagem que é de ter capacidade para gerar produtos agrícolas para alimentar parte substancial dessa gente. Esse potencial não será aproveitado com agricultura familiar pretendida pela reforma agrária. Alias, existem muitos beneficiários da reforma agrária que arrendam as áreas que lhe foram outorgadas pelo plano de reforma agrária para a agricultura ou extrativismo vegetal em escala. Todo capital a ser destinado à maximização do aproveitamento de nossas terras, seja brasileiro, seja estrangeiro, deveria ser bem vindo e o investimento incentivado, de forma que possamos manter nossas exportações primárias em alta. O mesmo se aplica ao etanol e ao biodiesel. Os mesmos 7 bilhões de potenciais famintos, também são potenciais consumidores de energias renováveis.

Proliferação de laranjas. Francamente, só faz sentido se interpretarmos tal preocupação exclusivamente no que se refere à venda ilegal de terras públicas o que, conforme salientado anteriormente, é um problema de polícia.

Quanto a questão da biopirataria, independentemente do dono da terra ser brasileiro ou estrangeiro, as espécies que são contrabandeadas elas passam pela fronteira para sair do Brasil. Até o Osama Bin Laden passa pela nossa fronteira sem ser percebido. Faça idéia uma semente ou uma plantinha. E é na vigilância das fronteiras onde a biopirataria dever ser combatida.

E, por fim, o mais prosaico de todos os argumentos para justificar a restrição à aquisição de imóvel rural por estrangeiro: o risco à segurança nacional em razão de estrangeiros serem proprietários de terras na fronteira. Não é possível imaginar-se no mundo de hoje, que tropas inimigas vão fazer fila para entrar em território nacional e se aquartelarem em um imóvel de um cidadão do país invasor na fronteira. Se assim o fizerem, a defesa do país fica mais fácil, porque se concentram todas as forças na cerca do imóvel rural de propriedade de estrangeiro onde estiverem aquarteladas as forças inimigas.

As justificativas conjecturais para defender a restrição ao investimento estrangeiro na aquisição de imóveis rurais não fazem o menor sentido no mundo atual. Imaginem quantas vidas seriam poupadas se ao invés dos aliados desembarcarem em diversas praias da Normandia no Dia D, os ingleses ou americanos comprassem uma propriedade de frente para o Canal da Mancha e ali desembarcassem todos os contingentes necessários para vencer os alemães.

Se há alguma restrição que faria sentido, seria a segurança alimentar do país, porém, isso se resolve com barreiras alfandegárias de exportação. Está na hora do Brasil assumir a posição mundial compatível com sua grandeza e de suas riquezas naturais. Restringir ou limitar qualquer forma de investimento estrangeiro que resulte em crescimento da capacidade produtiva do país, neste momento, é remar contra a corrente do futuro que temos pela frente.

. Por: Marcelo José Lomba Valença, Thiago Ferreira Magalhães, sócio e advogado-sênior do Almeida Bugelli e Valença Advogados Associados

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