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10/09/2011 - 15:13

Sobre meninos e lobos

O título deste belo filme, dirigido por Clint Eastwood, em 2003, talvez sirva para ilustrar o que aconteceu ao mundo, durante os dez anos que se sucederam o fatídico 11 de Setembro de 2001. Balanços são sempre passionais e emotivos, além de tendermos necessariamente a retrospectos que, em geral, não levam a novidades.

De qualquer forma, ao arriscar fazer um breve retrospecto em poucas linhas, gostaria de retroceder vinte anos no tempo, para evocar a obra de Francis Fukuyama, que dizia ser a queda do Império Soviético o “fim da história”. A história, já previa o velho Marx, tem seus movimentos dialéticos e um acontecimento pode ser “rebento e coveiro” de outro.

Assim, parece que Fukuyama pensou em “fim da história”, quando deveria ser “fim de uma história” e “começo de outra”. Errou, como erramos todos ao considerar que o fim da bipolaridade era o início de uma era em que a democracia, os valores universais, a convergência e a livre circulação de coisas e pessoas poderiam ser marcas indeléveis da globalização. Nada disso aconteceu. O mundo desigual ficou ainda mais desigual. Produzimos hoje muito mais alimentos do que a população mundial necessita e boa parte dela passa fome.

No entanto, talvez tivesse razão Raymond Aron, quando afirmava, no que tange à velha dicotomiaentre guerra e paz, que “o amigo de ontem pode ser o inimigo de hoje”. Se os formuladores de política externa dos Estados Unidos tivessem pensado nisso,talvez não tivessem ajudado, há trinta anos, exatamente os talebans do Afeganistão e o sunita Saddam Hussein a lutarem contra a União Soviética e o Irã, respectivamente.

Tudo bem, alianças internacionais são efêmeras, mas armar populações inteiras sem prever como isso poderia voltar-se contra si mesmo é um erro brutal. Matar agora parte dessas populações famélicas, em nome da Guerra ao Terror, erro típico de quem não sabe que caminho tomar. Como diria o gato de Alice no País das Maravilhas, para quem não sabe onde ir, qualquer caminho é válido.

Bin Laden, aposta certeira em outros tempos na luta contra a União Soviética, passa de um fanfarrão saudita a um herói venerado e um defensor inconteste da necessidade de derrotar os “infiéis” do ocidente.

Por que os Estados Unidos deram armas a seus futuros inimigos? Resposta complexa, mas que envolve interesses. Como sabemos desde Clausewitz, famoso teórico da guerra, grandes interesses levam a grandes guerras. O que não se esperava é que facas cerâmicas tomassem o lugar de sofisticadas armas tecnológicas. Estamos preparados para o futuro, não para o passado.

O problema é que, nesses dez anos, o ataque passou a poder estar em Bali, Mombai, Madrid, Londres, Moscou ou Trípoli. O fator surpresa é a grande vantagem do terror. Desse ponto de vista, se tivéssemos de eleger um vencedor, talvez tenha sido quem tentou disseminar o medo.

Populações inteiras de jovens sem perspectiva derrubam governos no mundo árabe, mas também vestem-se de bombas e explodem várias vidas, inclusive as próprias, para sentirem-se recompensados, ao menos uma vez.

Matar Bin Laden, quase dez anos depois, pode ter sido um belo trunfo eleitoral, mas não apaga as marcas do 11 de Setembro. O mundo ficou um pouco mais triste, muito mais controlado e menos solidário.

O mundo dez anos depois deu-se conta que meninos podem ser lobos e que lobos podem se travestir de meninos. Perdemos, mais uma vez, uma certa ingenuidade. Como diria o título do belíssimo livro do saudoso historiador britânico Tony Judt: um certo mal ronda a terra. Esse mal tem que ver com os dez últimos anos. “Quem é o inimigo, quem é você?”

.Por: Moisés Marques, coordenador e professor do curso de Relações Internacionais da Faculdade Santa Marcelina.|E-mail: [email protected].

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