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18/10/2011 - 10:28

Guerra Fiscal e o seu lado oculto: ganhadores e perdedores

A Guerra Fiscal, mecanismo utilizado pelos Estados para minorar a imensa desigualdade regional na atração de investimentos privados, está sob fogo cerrado de importantes economistas e poderosas unidades da Federação que por diversos motivos a combatem. Antes de mais nada, devemos entender que esta prática é uma conseqüência natural de décadas de descaso da União que não implementou uma política de desconcentração industrial – que vinha impedindo o desenvolvimento de regiões como o Norte e o Nordeste e concentrando a industrialização em grandes pólos como São Paulo.

A ordem econômica tem uma característica básica que é a tendência à concentração em locais onde a atividade econômica já está mais estruturada e adensada, com melhores condições logísticas, mercado consumidor de maior fôlego, trabalhadores treinados, entre outras vantagens competitivas. Tal situação impõem aos locais menos desenvolvidos barreiras adicionais, às vezes quase intransponíveis, na competição por atrair investimentos privados se considerados as ditas regras do mercado. Impõe-se, desta forma, um ciclo vicioso de pobreza que só pode ser combatido com a ação do Estado através da desconcentração econômica.

Desde o final do século passado, estados como São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais – beneficiários de décadas do poder político, financiamentos e atração de empresas – abrigavam quase a totalidade de empreendedores do Brasil e contavam também com uma pequena carga tributária incidente sobre os negócios (em 1947 estimava-se 13,8% do PIB). Além disto o Estado não contava com estrutura de controle para auditoria dos impostos. Com este ambiente altamente favorável estes estados criaram as condições necessárias para concentrar a indústria nacional.

A este fatores se somou mais de 50 anos de protecionismo primeiro provocado pela Segunda Guerra e depois uma política protecionista baseada na substituição de importações. Com isto, desde a década de 1930 até aproximadamente 1990, não existia competição com os produtos importados – o que obrigou os brasileiros a consumir, na maioria dos casos com produtos de baixa qualidade. O Mercado brasileiro tinha duas bolhas protecionistas: a local (entre os estados) e a nacional (entre os países).

Tentativas de mudança deste cenário foram feitas com grandes dificuldades, principalmente políticas. Cito a Zona Franca de Manaus, o Pólo Petroquímico de Camaçari e a Refinaria Landulfo Alves, as duas últimas responsáveis pela completa alteração da matriz econômica da Bahia, com reflexos na estrutura social perceptíveis até hoje.

Politicamente, a Constituição de 1988 somou à incapacidade da União em criar uma política de desenvolvimento regional eficiente, um sistema que sujeitou os estados a encontrar, desde que por unanimidade, caminhos para a redução das desigualdades regionais: o Conselho Nacional de Política Fazendária- CONFAZ.

O sistema comandado pelo CONFAZ já nasceu morto por sua exigência em deliberar apenas por unanimidade. Estados díspares, nível de desenvolvimento e interesses absolutamente opostos dificilmente chegariam a uma conclusão. Na prática, o que se criou foi um verdadeiro “cada um por si” – inicialmente de forma tímida e depois agressivamente – entre os estados. Como a União não conseguiu fazer seu papel, coube aos governos estaduais buscar caminhos para se desenvolver. Estava criada a Guerra Fiscal, fazendo com que um novo empreendimento que em condições normais que iria para o Sul e Sudeste, se deslocasse para outras regiões por conta dos incentivos.

A prática funcionou durante anos como indutora do desenvolvimento das regiões menos desenvolvidas, mas evidenciou as fragilidades legais do modelo e as colocou frente a frente com a União e, como não dizer, contra os Estados mais desenvolvidos, capitaneados pelo Estado de São Paulo, principal perdedor no processo da Guerra Fiscal.

A União, ente concentrador da carga tributária brasileira, deseja controlar o maior imposto do País, o ICMS. Assim, lança os holofotes para o fato de que modificá-lo é a reforma tributária possível, na prática, uma reforma fatiada. Com isso, ganha tempo para não partilhar com os Estados e os Municípios a imensa arrecadação de suas contribuições e concentra ainda mais seu poder político. Agindo desta forma a União evita o debate sobre o verdadeiro combate às imensas disparidades regionais, a distribuição de empreendimentos produtivos por todo o País e, especialmente, ser o principal indutor da desconcentração através da isenção dos impostos e contribuições federais de sua competência.

O estado de São Paulo, e outros que estão em níveis de desenvolvimento parecido, será o maior beneficiário com o fim da Guerra Fiscal, por ser o principal mercado consumidor brasileiro, porque dispõe da melhor infraestrutura logística, possui grandes investimentos já programados – inclusive um Trem Bala de mais de R$ 40 bilhões – e mão de obra treinada e preparada. São Paulo será o catalisador principal dos novos empreendimentos, recuperando e aumentando sua participação no PIB Nacional, será a noiva da vez, cada dia mais atraente.

Com o fim da Guerra Fiscal (somado à adoção da alíquota interestadual de 4% do ICMS), os estados menos desenvolvidos como os do Norte e Nordeste, terão suas possibilidades de desenvolvimento sensivelmente atingidas, na maioria dos casos condenados a ser apenas consumidores de mercadorias e vendo aumentar a cada dia suas desigualdades regionais.

A quem interessa a reforma tributária hoje em pauta? Aos estados menos desenvolvidos certamente não. Muito menos a Bahia.

.Por: Sérgio Furquim, Auditor Fiscal do Estado da Bahia e Diretor de Assuntos Econômicos e Financeiros do Instituto dos Auditores Fiscais do Estado da Bahia (IAF).

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