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01/09/2007 - 09:56

Cerco ao cooperativismo habitacional

Como presidente da Federação das Cooperativas Habitacionais do Estado de São Paulo (Fecoohesp), leio com espanto algumas reportagens veiculadas pela imprensa sobre o cooperativismo habitacional. Muitas delas colocam em xeque o sistema cooperativista como alternativa de redução do enorme déficit habitacional. Em um país onde quase 8 milhões de famílias não têm onde morar ou vivem em locais precários, isso é preocupante.

Antes de qualquer análise precipitada, a sociedade precisa ser informada de que cooperativas habitacionais não são construtoras nem incorporadoras. As cooperativas não são regidas pela Lei da Incorporação Imobiliária e sim pela Lei Federal 5.764/71, conhecida como Lei do Cooperativismo, com respaldo da Constituição Federal.

As diferenças entre os dois tipos de instituições são claras, como pode ser visto na cartilha do cooperativismo habitacional. Para não me alongar, cito apenas duas das muitas diferenças: as cooperativas habitacionais têm como objetivo principal a prestação de serviço para benefício mútuo; as incorporadoras e construtoras têm como objetivo principal o lucro do empresário; as cooperativas habitacionais, ao lançar um empreendimento, não precisam fazer a incorporação imobiliária; as construtoras e incorporadoras devem fazê-la. Ou seja, uma visa ao bem comum, a outra, ao bem individual; uma não visa ao lucro, a outra tem que investir para ter lucro.

O mais assustador é que algumas reportagens deixam transparecer um cooperativismo habitacional fracassado, que não traz nenhum benefício para a sociedade, o que não é verdade. Basta uma apuração mais profunda para se constatar que as cooperativas habitacionais cumprem seu objetivo social, dando acesso à casa própria a milhares de pessoas. Diga-se de passagem, sem nenhum apoio governamental ou de instituições financeiras.

Dizer que não existem irregularidades entre as cooperativas também pode ser uma inverdade. Mas, manchar o cooperativismo habitacional é, no mínimo, falta de responsabilidade. Aliás, é irresponsabilidade penalizar uma cooperativa, já que esta é formada pelo conjunto dos cooperados e não apenas por sua direção. Se existe alguma coisa errada é preciso punir o infrator e não a instituição.

Em casos de suspeitas de irregularidades, até quando não houver sentença judicial, de acordo com a Constituição Federal, ninguém pode ser considerado culpado, nem pela mídia nem por nenhuma outra instituição jurídica ou pessoa física. Mas, muitas vezes, talvez por preconceito de uma sociedade extremamente capitalizada contra o cooperativismo, acontece o inverso e, dessa forma, mesmo com a inexistência de provas, as pessoas são consideradas culpadas.

Na verdade, o fato constatado em minha longa experiência no cooperativismo é que, ao aderir ao sistema, o cooperado age como um consumidor. Paga para ter a sua casa (individualismo) e não quer saber de mais nada. Acha que basta pagar para conquistar seu sonho e se esquece de que é um cooperado e que, se os outros cooperados não pagarem haverá problemas no fluxo de caixa e as obras podem atrasar, já que, no cooperativismo, não existe um investidor que injete capital para obter lucro posteriormente.

Essa falta de cultura cooperativista gera “cooperados-consumidores”, que não participam nem do cotidiano da cooperativa nem de assembléias. Não fiscalizam, não se preocupam em ler e entender o estatuto da cooperativa, o termo de adesão e a Lei do Cooperativismo, pleiteiam apenas seus direitos e deixam de cumprir seus deveres. E, como num câncer, quando o problema aparece pode ser tarde demais.

Aí, passa a ser mais fácil atirar pedra na vidraça da cooperativa. Esses “cooperados-consumidores” não se atêm que a vidraça é a da casa deles também, já que a cooperativa é formada por todos os cooperados. O artigo 80 da Lei do Cooperativismo diz que “as despesas da sociedade serão cobertas pelos associados mediante rateio”. Assim, eles mesmos terão que pagar pela “vidraça quebrada”.

Cabe à diretoria cumprir o estatuto e fazer valer tanto os direitos quanto os deveres dos cooperados. Aqueles que não cumprem suas obrigações estão sujeitos às conseqüências previstas em estatuto, como, por exemplo, a eliminação do quadro de associados e, se já estiverem em posse da unidade habitacional, ser solicitada a reintegração de posse. Tudo isso em defesa dos demais cooperados que cumprem com suas obrigações.

Da mesma forma, como presidente da Fecoohesp, sob pena de ser responsabilizado por não defender os cooperados que têm o sonho da casa própria e o cooperativismo habitacional como uma alternativa viável para contribuir com a redução do déficit habitacional e com a inclusão social de milhares de pessoas, tenho o dever de esclarecer que, ao se manchar a imagem de uma cooperativa, não é apenas a direção desta instituição que se coloca em risco, mas todo o conjunto de cooperados. Mais do que isso, pode-se colocar em risco o cooperativismo habitacional, que já beneficiou milhares de pessoas, não apenas em São Paulo e no Brasil, mas no mundo todo.

. Por: William Kun Niscolo, advogado e presidente da Federação das Cooperativas Habitacionais do Estado de São Paulo (Fecoohesp).

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