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30/11/2011 - 11:33

A engenharia “Ça Bouge”

Imagine um país que em certo momento identifica que sua produção de inovações não está adequada para garantir sua liderança mundial em alguns segmentos estratégicos, apesar dos vários incentivos de toda ordem oferecidos.E mais ainda, seu produto interno mais querido e que se tornou a imagem do país, resultante de uma grande inovação no início dos anos 1980, está hoje reproduzido em vários países, dentre os quais alguns asiáticos, que o vendem ao exterior a preços bem menores que os seus.

Não entre em pânico, este país não é o Brasil, embora o exemplo se aplique bem ao nosso caso.

Estamos falando da França, cujo trem de alta velocidade (TGV) deixou de ser sua marca exclusiva há anos e, como país, vem observando grande declínio de sua influência intelectual no mundo devido a tradições não mais aplicadas nos dias atuais.

Focando na educação superior, a tradição das “Grandes Ecoles” está em cheque. Primeiro pelo fato de que, por ser pequena, não consegue ter visibilidade nos rankings internacionais, o que limita sua internacionalização, uma vez que os estudantes que buscam formação no exterior se balizam nestes indicadores para escolher seu destino; em segundo, sua alta especialização está jogando contra a tão procurada busca pela inovação, pois é patente que a inovação é típica do ambiente multidisciplinar.

Alguns exemplos desta evidência podem ser encontrados em eventos marcantes, que mudaram o mundo. Em recente artigo citamos a IBM, que apesar de sua grande especialização na fabricação de computadores, não foi a criadora do microcomputador, concebido em uma garagem por alguém que de especialista não tinha nada. Citamos também o caso de que algumas empresas fabricantes de telefones celulares enfrentam sérias dificuldades por não imaginar que o celular poderia fazer algo mais do que colocar em contato duas pessoas.

Uma autocrítica muito bem feita levou o governo francês a tomar decisões radicais que estão mudando completamente o cenário da educação superior francesa. As universidades daquele país, que no passado não eram consideradas, com raríssimas exceções, instituições de primeira linha, ocupam agora uma posição de destaque neste novo cenário da educação superior francesa.

Em um movimento sem precedentes, o governo francês promoveu aglutinações de várias “Grandes Ecóles” em torno de uma universidade, reunindo-as em campus imensos, cuja consequência será, possivelmente, colocá-las no cenário internacional das grandes universidades de classe mundial, aquelas classificadas pelos principais rankings internacionais entre as 100 melhores do mundo.

As reações foram grandes, pois as medidas retiraram da zona de conforto um contingente enorme de professores e pesquisadores que precisarão trabalhar longe de sua residência e se adaptar a um novo sistema de governança. Enfim, os franceses descobriram o valor de uma grande universidade.

O impacto dessas ações nas engenharias foi interessante, pois agora a palavra de ordem é a inovação, e esta precisa ser conquistada a todo custo por meio de ambiente multidisciplinar que só uma grande universidade pode oferecer.

Como resultado deste movimento, laboratórios de engenharia elétrica foram fundidos com laboratórios de biologia para explorar o biomagnetismo; laboratórios de estruturas fundidos com laboratórios de materiais e de computação para explorar novas tecnologias construtivas de toda a ordem; entre outros.

Assim, a engenharia francesa está se transformando, de modo que é importante observar seus resultados, visto que poderemos extrair grandes lições.

Agora, e a engenharia brasileira? Continuará a se sujeitar aos mesmos paradigmas da década de 1970? Esta é uma questão importante que precisamos colocar na mesa de discussões, pois nos parece que as nossas escolas de engenharia continuam a imaginar cada habilitação como um campo do conhecimento isolado com pouca ou nenhuma comunicação com as demais.

.Por: José Roberto Cardoso – Diretor da Escola Politécnica da USP.

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