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13/12/2011 - 12:06

Um fantasma ronda a Europa

A renúncia de Silvio Berlusconi da chefia de governo da Itália representa muito mais do que o fim das fanfarronices e histrionismos de um milionário que resolveu brincar de fazer política. Na verdade, como sugere a frase de Marx e Engels que dá título a este artigo, parece que a Europa precisa reinventar-se urgentemente e repensar as bases de sua integração. Caso contrário, será assombrada pelo fantasma da desunião.

Reduzir o problema europeu aos chamados PIIGS (acrônimo para Portugal, Itália, Irlanda, Grécia e Espanha) é tapar os olhos para a questão de fundo, que diz respeito aos limites de um projeto realmente europeu. Alguns políticos e mesmo analistas mais apressados apontam a leniência do bloco com os países que entraram na década de 1980 (Grécia, Portugal e Espanha) como o fator preponderante da atual crise. Já não cumpriam, de início, os pré-requisitos para fazer parte do projeto e, posteriormente, estavam à margem das exigências da Eurozona. Portanto, quem sabe fazê-los voltar no tempo e recuperar a dracma, o escudo e o peso seria a solução ideal, deixando o euro para quem sabe administrá-lo, notadamente os acalentadores da ideia: Alemanha e França.

Na verdade, dois parecem ser os problemas de fundo e em muito transcendem a questão da aderência ou não ao euro. A primeira questão diz respeito ao que se quer da Europa. A segunda exige que se pensem instituições supranacionais que realmente funcionem.

Quando o projeto europeu foi alavancado, na década de 1950, o continente saía de uma situação caótica, com administração compartilhada de parte do território germânico e a inundação dos dólares do Plano Marshall para a reconstrução dos países assolados pela guerra.

Ali travou-se a batalha até hoje inconclusa: o que se quer da Europa? Deve-se recuperar o ideário saintsimoniano e projetá-la como uma Confederação (uma espécie de Estados Unidos da Europa) ou deve-se deixá-la como Europa das Pátrias, como parecia querer De Gaulle. A história se encarregou de colocar Churchill, De Gaulle e Adenauer em um momento maquiaveliano e incumbiu-lhes de escrever o roteiro da integração. O problema é que parece que os atores atuais acreditam que o filme não tem um final razoável e resolveram mudá-lo, à medida em que atuam.

O grande dilema atual é: aprofundamento do projeto ou alargamento da União Europeia (UE)? Depois de 2004, quando dez novos membros adentraram ao projeto e particularmente em 2007, quando Romênia e Bulgária (dois dos mais pobres países da região) chegaram à integração, parece que o fantasma do esfacelamento definitivamente ronda a Europa. O que fazer com Ucrânia, Servia, Bosnia Herzegovina e tantos outros que pleiteiam a entrada no projeto? Pagar para que não entrem? E a Turquia? Como lidar com um país que é majoritariamente muçulmano, populoso, importante historicamente e não reconhece um dos atuais membros da UE?

Por outro lado, temos a questão institucional. Se vários países não cumpriram os requisitos do Tratado de Maastricht, nem foram controlados pelo Banco Central Europeu como deveria acontecer, o que deve acontecer agora com o Tratado deLisboa? É possível supranacionalidade sobre países soberanos e que atuam, muitas vezes, em carreira solo? Como lidar com dívidas monstruosas em países sem saída macroeconômica razoável?

A complexidade da crise europeia é diretamente proporcional ao emaranhado defatores que leva alguns a acreditar que existam várias Europas, com gradações de importância diferentes. Socorrer a fundadora Itália é muito mais importante do que olhar para os recém-chegados húngaros, na visão destes. Mas, afinal, que mundo é esse que dificulta as coisas para quem mais precisa e premia quem incorreu em moral hazard?

De fato, um fantasma ronda a Europa e, como rezava o velho Manifesto, todos querem exorcizá-lo. As quedas de vários governos parlamentaristas, entre eles o de Berlusconi, apenas atestam a reincidência desse antigo conhecido da Velha Senhora.

No entanto, ainda há esperança! A Europa integrada foi parida em uma crise. Quem sabe, não renasça em outra.

.Por: Moisés Marques, mestre e doutor em Política Internacional e coordenador do curso de Relações Internacionais da Faculdade Santa Marcelina.

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