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18/01/2012 - 10:41

Tecnologia nas relações de trabalho: bem ou mal necessário?

Tem sido alvo de debates calorosos na mídia a possibilidade de se pagar horas extras aos trabalhadores que realizam serviços à distância, por meio de smartphones, tablets ou qualquer outro meio de comunicação informatizado e dinâmico que permita o comando direto do empregado pelo empregador, mesmo que ambos não estejam localizados num mesmo ambiente de trabalho.

A discussão em torno do assunto foi propagada principalmente depois que a presidenta Dilma Rousseff, no final do ano passado, sancionou a Lei n.º 12.551, que alterou o artigo 6º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), passando este a vigorar com a seguinte redação:

Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego. Parágrafo único. Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio.

Com isso, não só a partir da mudança legislativa, mas há um bom tempo muitos trabalhadores estão reclamando o direito de recebimento de horas extras nos tribunais trabalhistas, sob a alegação de estarem exercendo as suas funções laborais fora do local de trabalho e após a jornada ordinariamente exercida, por meio da utilização desses novos aparelhos de comunicação, que praticamente aboliram o velho entendimento do homem sobre o significado do binômio "espaço-tempo".

Os empresários, por sua vez, estão preocupados com o fato de ter de começar a pagar hora extra por cada e-mail ou mensagem que estiver sendo mandado além do expediente normal de trabalho, o que certamente acabaria refletindo nas provisões contábeis corporativas com os encargos trabalhistas e fiscais. Entretanto, a despeito da polêmica que se tem criado sobre a matéria, não há razão para excessos de ambos os lados.

De fato, não há dúvida de que a nova lei atinge a uma necessidade real dos tempos modernos. Afinal, com a inovação tecnológica, ainda mais no setor das telecomunicações, uma série de facilidades nos foi permitida, como por exemplo a possibilidade de podermos nos contatar onde e quando quisermos. Naturalmente, isto acabou se refletindo nas relações de trabalho, trazendo uma série de benefícios econômicos, mas também alguns malefícios sociais.

Assim, se por um lado houve o incremento da dinâmica das vias empresariais, facilitando a comunicação e a velocidade das transações, por outro lado, as pessoas acabaram se rendendo aos excessos promovidos por essas comodidades, ficando reféns do uso desenfreado dessas novas tecnologias. Nesse contexto, tantos os empresários como os trabalhadores, por motivos diversos, acabaram sobrepondo as relações trabalhistas, deixando para trás as outras relações que permeiam o nosso dia-a-dia.

As pessoas, no entanto, precisam de descanso. Ficar 24h online, todos os dias, é inegavelmente prejudicial à nossa saúde. Nessa medida, a lei é correta ao determinar que se paguem horas extras aos empregados que, mesmo fora do trabalho, continuem trabalhando e executando as suas tarefas à serviço do empregador. Contudo, o conforto tecnológico, obviamente, não pode se tornar num subterfúgio para burlar as normas trabalhistas.

Por outro lado, isso não significa que qualquer tipo de comunicação realizada externamente ao meio ambiente de trabalho ou à jornada comumente efetuada pelo empregador será considerado prova de que o empregado tem direito a receber hora extra. Ao contrário, será preciso avaliar com precisão o conteúdo dessas comunicações e se o trabalhador, por conta delas, estava ou não em regime de sobreaviso, ou seja, à disposição do empregador em modo full-time.

Por isso, não há de se causar alvoroço sobre o tema. A lei foi alterada apenas para adequar-se à realidade em que vivemos, mas o conteúdo e os princípios que a consubstanciam são os mesmos de antes, refinados às particularidades dos tempos presentes. Afinal, em concordância com o pensamento de Georges Ripert, se o direito acabar ignorando a realidade, a realidade se vinga e acaba ignorando o direito.

Em suma, o que se faz necessário é o bom senso de ambas as partes. Nem toda ligação feita ou e-mail mandado pelo empregador após a jornada ou fora do local de trabalho será considerado como indicativo de hora extra devido ao empregado. Da mesma forma, os trabalhadores precisam entender que as relações contemporâneas de trabalho não podem mais ficar atreladas ao antigo modelo fabril, com serviços e horários fixos, praticamente inalterados.

Nesse passo, respeitados os limites que circundam as nossas relações humanas, todos tendem a ganhar. Precisamos ter em mente que a tecnologia veio para nos ajudar, e não para nos prejudicar. Por mais que seja difícil atingir o equilíbrio ideal, não podemos deixar de tentar aperfeiçoar as nossas relações interpessoais, visando ao benefício mútuo. Do contrário, ao invés de usarmos a tecnologia como nossa aliada, acabaremos ficando escravos dos nossos próprios inventos.

.Por: Peterson Muta, André Mendes e José Daniel Gatti Vergna são integrantes do Contencioso Empresarial do escritório L.O. Baptista-SVMFA.

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