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14/09/2007 - 11:47

Desrespeito ao trabalho

O Brasil, dado o pluralismo de sua estrutura demográfica, na qual distintas etnias, credos e ideologias convivem em paz e entendimento, não tem vocação sociológica para o conflito de classes. Também contribui para isto, ao lado dessa positiva causa, o fato de a renda nacional ser nivelada por baixo. Ou seja, quem ganha dois mil reais mensais está incluído entre os 10% mais “ricos” do País. Nesse contexto, há, sim, um conflito, mas entre o Estado e a sociedade. O primeiro, apesar do avanço e consolidação da democracia, ainda demonstra arrogar-se o status de prioridade e fim de tudo.

A “Nomenclatura” à brasileira, incrustada nos gabinetes estatais, parece esquecer-se de que o governo é o meio de garantir o equilíbrio entre direitos e deveres e fomentar o bem-estar, segurança e qualidade de vida dos indivíduos e da sociedade. Não é a Nação que deve servir ao estado, numa relação medieval de suserania. Em meio a essa arrogância oficial, campeiam medidas e atitudes que invariavelmente contrariam os interesses maiores da coletividade.

Um exemplo claro dessa inversão de valores é o desrespeito aos trabalhadores das estatais do setor elétrico por parte do Governo do Estado de São Paulo. Há mais de três meses, os funcionários da Companhia Energética de São Paulo (Cesp) e da Empresa Metropolitana de Águas e Energia S.A. (Emae) estão tentando fechar acordo coletivo. Como não houve avanço nas negociações, realizou-se, em 22 de agosto, audiência pública de conciliação, no Tribunal Regional do Trabalho — 2ª Região, com a presença do Sindicato dos Eletricitários de São Paulo (STIEESP) e do Sindicato dos Engenheiros e representantes da Cesp e EMAE.

Os trabalhadores, num gesto de boa vontade, aceitaram o acordo proposto pelas empresas, exceto nos itens relativos à participação nos lucros e resultados (PLR); reajuste; e vigência. O advogado das estatais argumentou que não há possibilidade de aceitar o acordo parcialmente. Além disso, apresentou documento da Casa Civil do Governo de São Paulo, no qual há diretrizes para o pagamento da PLR em total desacordo com direitos adquiridos dos trabalhadores. Ora, a PLR e a vigência são práticas que acontecem há anos nessas estatais. O que os trabalhadores solicitam é tão somente a manutenção dos benefícios. É um absurdo subtrair esse direito, como se ele não fosse fruto de acordos anteriores, que devem ser honrados.

O episódio evidencia ausência de sensibilidade da Secretaria de Energia, referendada pela Casa Civil do governo paulista. Será que o Palácio dos Bandeirantes quer mais demissões no setor de energia elétrica do Estado? É como se não bastasse a enxurrada de desemprego suscitada, há alguns anos, por uma privatização mal conduzida, que culminou com a desastrosa substituição de profissionais altamente especializados por mão-de-obra não-qualificada, colocando em risco a segurança dos consumidores e da sociedade.

No final de agosto, o Governo José Serra trouxe novamente à tona o programa de privatizações. Com isso, o Estado torna-se, mais uma vez, agente do desemprego. O principal foco é a Cesp, maior empresa energética de São Paulo e terceira do País, há dez anos incluída no Programa Estadual de Desestatização (PED). É estimado que o governo tenha 33% de seu capital, o equivalente a cerca de R$ 3 bilhões. Engraçado é que, para alavancar recursos, o governador não mede conseqüências, inclusive sociais, ignorando a gravidade da demissão dos trabalhadores e os danos às suas famílias, à sociedade e à economia como um todo. Ora, São Paulo, com adequada gestão fiscal, não precisaria sacrificar seus trabalhadores para equilibrar as contas públicas.

Repete-se a arrogância estatal, muitas vezes ancorada na confiança de que, na dúvida, a Justiça acaba pendendo para o governo. É preciso mudar essa cultura anacrônica, um obstáculo real ao desenvolvimento. É chegada a hora de o Estado integrar-se de modo sinérgico à Nação e às metas de crescimento, distribuição de renda, multiplicação de empregos e prestação de serviços compatíveis com os impostos pagos pelos cidadãos.

. Por: Antônio Carlos dos Reis "Salim" é vice-presidente da UGT (União Geral dos Trabalhadores) e presidente do Sindicato dos Eletricitários de São Paulo e da Federaluz.

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