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28/09/2007 - 08:32

Por que investir na merenda escolar?

Na minha infância, por várias vezes eu ouvi minha mãe dizer “saco vazio não pára em pé”. E lá ia eu para a escola lembrando do bordão dito por ela e já tentando adivinhar qual seria o prato servido no grupo escolar de Ribeirão Bonito, minha cidade natal, no interior de São Paulo. Tinha sopa de arroz, de feijão, de legumes e até de fubá com carne; a minha preferida. Minha memória olfativa se liga toda vez que esses pratos e seus temperos aparecem por perto. E me vem uma agradável lembrança desses momentos tão felizes.

A frase de minha mãe me vem à mente todas as vezes em que leio alguma notícia sobre a merenda escolar ou quando reflito sobre a realidade educacional brasileira. Para mim e para muitos brasileiros a merenda era o grande momento das atividades nas escolas públicas pois resolvia uma sensação desagradável: a fome! E liberava a cabeça e a emoção para as outras coisas que a escola oferecia. Entre elas o aprender. Ninguém consegue aprender sentindo fome!

Não é à toa, portanto, que um dos mais importantes programas públicos do Brasil é o programa de merenda escolar, que existe no Brasil há mais de 50 anos. Gerido de diferentes maneiras ao longo dessas cinco décadas, este programa foi o responsável pela única refeição de várias gerações de crianças em regiões absolutamente pobres do país. Atualmente, pela introdução do tema educação alimentar e com a qualidade nutricional dos cardápios escolares é possível afirmar que, para muitos estudantes brasileiros o programa de merenda é a única garantia de acesso a pelo menos uma refeição diária com qualidade nutricional.

A longevidade do programa, a sua manutenção ao longo dos diferentes governos e o ritmo intenso de modificações para o aprimoramento da execução atestam a importância desta política. E qualquer atitude que comprometa a qualidade da merenda ou limite a quantidade dos alimentos deve ser repreendida vigorosamente.

Durante muitos anos, eu sempre pensei que apenas os alunos e os pais de alunos eram capazes de avaliar a importância da merenda. Acreditava também que só quem passou por escolas públicas na infância era capaz de avaliar o que significava a hora da merenda. Sem saber, subestimava a capacidade de sensibilização de empresas e empresários que, além de consciência social, investem indiretamente na boa execução do programa de alimentação escolar financiando o projeto Gestão Eficiente da Merenda Escolar, que tem o objetivo de garantir que os recursos públicos destinados à merenda sejam efetivamente gastos em merenda de qualidade e em quantidade suficiente para todos os alunos do sistema público de ensino. São mais de 90 empresas brasileiras que cooperam para a execução das várias ações deste projeto entre elas, o prêmio Gestor Eficiente da Merenda Escolar destinado aos municípios que se destacam por gestões criativas e inovadoras do programa Nacional de Alimentação Escolar, também conhecido por PNAE.

Em 2007, mais de setecentos municípios brasileiros se inscreveram no prêmio. Isto significa que essas cidades acreditam tanto no trabalho que realizam, que o colocam à disposição de uma avaliação científica e metodologicamente construída. Nos quatro anos de existência, a equipe que coordena o prêmio reuniu exemplos de soluções que comprometem a imagem de displicência e falta de cuidado que normalmente habita o imaginário das pessoas em relação ao serviço público.

Até hoje são 25 cidades, de diferentes tamanhos e com diferentes realidades, que ganharam o prêmio gestor eficiente da merenda escolar. O que têm em comum é o fato de entenderem a merenda como uma decisão política relevante que se reflete nos seguintes aspectos: em primeiro lugar, a complementação financeira da prefeitura para aquisição de alimentos ou para investimentos em projetos de infra-estrutura como refeitórios, cozinhas, equipamentos, são iguais ou superiores ao repasse do governo federal e representa em média um esforço de 9% da receita do município; o segundo dado importante a ressaltar é o fato de que essas cidades possuem uma nutricionista responsável pelo balanço nutricional dos cardápios e que, na maioria das vezes, conta com a ajuda de técnicos de nutrição; em terceiro lugar, nos municípios pequenos, que desenvolvem atividade rural, os governos locais estimulam a produção local organizando os pequenos produtores em torno de cooperativas, utilizando os programas do governo federal que estimulam a aquisição do pequeno produtor. É comum verificar que nessas cidades existem leis municipais que facilitam o comércio com o pequeno produtor que vê na merenda escolar um comprador fiel. E finalmente, as prefeituras premiadas possuem um conselho de alimentação escolar atuante.

O conselho de alimentação escolar é o principal instrumento de controle do programa de merenda. É um grupo independente e com poder de decisão formado por sete pessoas que tem de fiscalizar a prefeitura e não pode se deixar controlar por ela. Um conselho de alimentação atuante é aquele que se reúne freqüentemente, acompanha as compras das prefeituras, analisando as notas fiscais e verificando a qualidade dos alimentos comprados, visita periodicamente as escolas e observa a qualidade da merenda ofertada aos alunos, controlando os desperdícios e apontando os cuidados com a higiene. O trabalho dos conselheiros não é remunerado mas é tão importante que deveriam ganhar uma medalha.

Conhecendo os casos premiados é possível constatar muitos exemplos que podem ilustrar boas práticas de administração pública. Todos eles podem ser resumidos na seguinte receita: são decisões tomadas a partir da idéia de uma pessoa bem intencionada que constrói uma rede de apoios que alcança a decisão política do gestor local. E o que vale é a decisão política

Este Brasil revelado por meio da metodologia do prêmio Gestor Eficiente da Merenda Escolar é um país silencioso que age sem luzes e holofotes e constrói uma nação revigorada, sem fome, com predisposição para a aprendizagem e que dá orgulho para quem conhece.

. Por: Antoninho Marmo Trevisan, é presidente do comitê gestor da Ação Fome Zero, organização não governamental de empresários que desenvolve o projeto Gestão Eficiente da Merenda Escolar. É também diretor da Trevisan Escola de Negócios.

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