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31/05/2012 - 10:30

A segurança dos cruzeiros marítimos


A colisão seguida de naufrágio do cruzeiro Costa Concórdia em meados de janeiro, na Ilha de Giglio, no Mediterrâneo, é uma tragédia que deve nos servir de alerta. Os “ingredientes” que determinaram o acidente, resultando na morte de 32 pessoas, com corpos ainda desaparecidos, são recorrentes em outros episódios envolvendo essas embarcações no Brasil.

Negligência com o meio ambiente e com as normas de navegação, despreparo da tripulação, recrutada aleatoriamente e sem qualquer treinamento, bem como descaso com passageiros têm sido o pano de fundo da série de incidentes e acidentes que vêm ocorrendo com os cruzeiros marítimos a cada temporada na costa brasileira.

Note-se que somente no verão 2008/2009 quatro brasileiros morreram a bordo de mais de um cruzeiro em águas nacionais. Ainda em 2009, mais de 300 passageiros do MSC Sinfonia sofreram intoxicação alimentar. De lá para cá, como o noticiário tem mostrado, os problemas se repetem, num variado leque de eventos de contornos macabros que incluem desde manobras arriscadas junto à costa a incêndios mal explicados, passando por descargas de dejetos nas águas de famosos balneários, como o registrado em setembro passado em Angra dos Reis. Ainda que tais cruzeiros agregassem valor ao nosso turismo e benefícios a nossa economia – propaganda enganosa que não resiste a uma honesta análise - o rastro de problemas que deixam a cada ano já justificaria a adoção de medidas que viessem a colocar essa atividade definitivamente - embora de forma tardia - dentro de patamares operacionais seguros tanto para a navegação e o meio ambiente, quanto e, sobretudo, para os passageiros.

Sim, porque o que talvez se desconheça é que essas embarcações, operadas por companhias estrangeiras, em sua maior parte italianas, navegam por águas territoriais brasileiras, escalam nossos portos, fundeiam em nossas baías e enseadas e transportam brasileiros, sem que nenhuma autoridade ou órgão do governo tenha conhecimento prévio de sua operação.

Devido a um hiato legal, esses navios chegam ao Brasil sem submeter à Marinha ou à Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) suas rotas e escalas. Atuam livre de qualquer regulação porque a Lei 9.432/97, que disciplina o transporte aquaviário no país, por uma inexplicável omissão do legislador, não disciplinou os cruzeiros marítimos. O vácuo normativo, na verdade, é simples de ser sanado, bastando para tanto que haja vontade política, o que, até o momento, parece não haver.

O problema torna-se ainda mais urgente se considerarmos que, em realidade, esses cruzeiros quase nada acrescentam à atividade turística brasileira, podendo-se dizer, na verdade, que constituem uma concorrência desleal à rede hoteleira das cidades pelas quais passam. Há de se considerar que a esmagadora maioria dos passageiros a bordo é de brasileiros, e não de turistas estrangeiros. São pessoas que gastam seus dólares dentro desses navios, ao invés de fazê-lo em balneários e destinos turísticos nacionais. Não raro, desembarcam para passear em cidades litorâneas, em deslocamentos curtos, e retornam a bordo para as refeições. Até o consumo de roupas e outros produtos tende a ser feito a bordo.

Devemos considerar que esses dólares gastos por brasileiros nos transatlânticos não são tributáveis, o que caracteriza dupla desvantagem para a economia brasileira: perda de movimento do comércio nas cidades turísticas, tais como Rio de Janeiro, Salvador, Florianópolis e Búzios; e a consequente perda de arrecadação. Em suma, potencializam fuga de divisas.

Um problema adicional está no recrutamento da mão de obra. Em geral essas companhias utilizam pessoal oriundo de países de escassa proteção legal ao trabalho e de baixa renda. São trabalhadores que por absoluta necessidade se submetem a jornadas extremas de trabalho, às vezes de 14 horas sem descanso. Tais circunstâncias explicam as deficiências do atendimento aos passageiros, sobretudo em emergências. No naufrágio do Costa Concórdia, além da negligência do capitão italiano, o despreparo e o improviso da tripulação ficaram comprovados. Não se pretende aqui uma guerra contra os cruzeiros. Mas apenas que sejam submetidos à devida regulação pelo Estado brasileiro. E que, a partir de então, possam ser uma atividade segura, complementar ao turismo nacional, com benefícios para todos, sobretudo para os passageiros. Que não precisemos de um novo Costa Concórdia como alerta para tomarmos as medidas óbvias necessárias!

.Por: Severino Almeida Filho, Presidente do Sindicato Nacional dos Oficiais de Marinha Mercante (Sindmar) e da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transporte Aquaviário e Aéreo, na Pesca e nos Portos (Conttmaf). [www.sindmar.org.br].

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