Página Inicial
PORTAL MÍDIA KIT BOLETIM TV FATOR BRASIL PageRank
Busca: OK
CANAIS

30/11/2012 - 06:30

Os perigos do marketing eleitoral no brasil

Já faz mais de um mês, mas as campanhas eleitorais para vereador de 2012 continuam a assombrar os eleitores. Uma assombração atípica, na medida em vez que não se manifesta em lampejos da memória, mas através do mais abjeto esquecimento.

Para além da banalidade e do desrespeito à inteligência do eleitor, o show das campanhas eleitorais produz ecos. Ecos que se estendem inaudíveis e esquecidos por quatro anos.

As campanhas eleitorais justificam de forma cada vez mais enfática a posição daqueles que não se interessam por política. Ter o marketing como principal departamento de campanha é um sinal irrefutável de quão desvirtuada está a nossa vida política.

A Resolução 23.370, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) é clara nas instruções a respeito de como as campanhas das eleições de 2012 deveriam ser comunicadas aos eleitores brasileiros :

“Art. 5º – A propaganda, qualquer que seja a sua forma ou modalidade, mencionará sempre a legenda partidária e só poderá ser feita em língua nacional, não devendo empregar meios publicitários destinados a criar, artificialmente, na opinião pública, estados mentais, emocionais ou passionais”.

Trata-se quase de uma lei às avessas: o antônimo da prática. E o questionamento que parece mais razoável em nosso cenário eleitoral é: quais são os meios empregados que não visam a criar (artificialmente) na opinião pública, estados mentais, emocionais ou passionais?

E é fácil reparar esse absurdo. Basta ver os elementos mais comuns das campanhas, como os jingles, por exemplo. Criamos “musiquinhas”, J-I-N-G-L-E-S, eleitorais! Já estamos acostumados com isso, o que torna a situação ainda mais embaraçosa para nós mesmos. E qual é a pretensa justificativa da presença de um jingle em uma campanha eleitoral? Existe algum outro motivo – além de conduzir o eleitor a decorar o nome, número e o jargão do candidato?

A simples existência de um jingle retrata nossa incapacidade crônica de nos relacionarmos com exigências mínimas da vida democrática. Se o fenômeno da música em campanhas existe é porque o modelo de campanha eleitoral no Brasil confia sabidamente sua capacidade persuasiva sobre os tais elementos destinados a produzir estados mentais, emocionais ou passionais sobre a opinião pública, contra o qual adverte o TSE em sua nota.

Não é que o jingle chegando ao fim fosse automaticamente tornar mais racionais as campanhas, mas a sua presença aponta para um distúrbio muito grave do nosso sistema de representação. No fundo, percebe-se um descolamento completo entre o processo eleitoral e o resto da vida política.

É a velha história: o único contato diário que as pessoas (aquelas interessadas) têm com a esfera política é intermediado pela imprensa, que – juízo de valor à parte – tende a dar espaço quase exclusivamente a casos de irregularidades.

Pois bem, vivemos ainda sob uma democracia representativa, o que significa que confiamos o exercício da soberania popular sobre a capacidade de representação. É por meio da representação que os interesses da população devem ser considerados dentro das esferas formais de poder. No entanto, a experiência democrática brasileira demonstra dia sim dia também que não é possível haver representação, se não houver meios efetivos de comunicação entre os políticos e aqueles por ele representados.

A relação entre representantes e representados não pode se resumir ao momento das eleições; ela deve ser contínua, caso contrário nosso sistema de representação está falhando gravemente em sua principal função.

Em razão dessa relação à distância, os raros encontros entre representantes e representados não podem ser outra coisa senão lúdicos - não à toa existem showmícios. É em virtude de tal abismo entre representantes e representados que testemunhamos campanhas eleitorais tão absurdas. Em tal cenário, faz-se necessária a presença da publicidade, pois esta é a ferramenta mais eficiente na arte de forjar relações que só existem em abstrato, como é a relação de uma marca com o seu público.

Se, de fato, queremos campanhas eleitorais mais racionais, devemos investir no fortalecimento dos vínculos entre a sociedade e os políticos. Criar estratégias de fiscalização e accountability que se estendam ao longo do mandato e não apenas a cada quatro anos. A implantação do sistema majoritário para eleições legislativas, o conhecido Voto Distrital, são sem sombra de dúvidas um avanço no estreitamento dos laços entre os representantes e os representados; e consequente diminuição da parafernália publicitária na esfera política.

. Por: Ricardo Borges Martins – Sociólogo, formado em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo (FFLCH-USP), com foco em Cultura Política e Tendências Democráticas. Com especialização em Argumentação e Influência Social pela Université d’Aix-Marseille (França), é um dos organizadores do Movimento #EuVotoDistrital. www.euvotodistrital.org.br

Enviar Imprimir


© Copyright 2006 - 2024 Fator Brasil. Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Tribeira