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25/01/2013 - 06:54

A difícil luta de quem precisa de tratamento para câncer

Raimundos, Gustavos e Marias. Entre eles, há milhares de pacientes com mieloma múltiplo, tipo de câncer que acomete a medula óssea e que não tem cura, os quais têm lutado, cada um a sua maneira, para ter direito e acesso aos melhores tratamentos para a doença disponíveis no mundo hoje. Vou citar o caso do paciente Raimundo Bruzzi, que mora em São Paulo. Trabalhou mais de trinta anos. Profissional competente e exemplar, além de chefe de família. Ao chegar aos 58 anos de idade, quando a maioria das pessoas reduz o ritmo de trabalho para aproveitar melhor a vida, Bruzzi foi surpreendido com o diagnóstico de mieloma. Os pacientes, no entanto, quando são tratados da forma adequada, podem conseguir uma sobrevida com qualidade e até conseguem trabalhar e ter uma vida social normal.

Depois de passar por tratamento de quimioterapia e transplante de medula óssea, Bruzzi teve uma nova recaída. Nesses casos, a maioria dos especialistas em mieloma em todo o mundo indica um tratamento com um medicamento já aprovado e frequentemente usado em mais de 80 países. Trata-se da lenalidomida. Todo paciente com mieloma, em algum momento, vai recidivar, o que aconteceu com esse que relato na história acima. É exatamente para tais pessoas que as novas drogas são importantes. Nesse cenário, torna-se possível aumentar a sobrevida e melhorar significativamente sua qualidade de vida.

O medicamento já foi aprovado pela rigorosa agência Food And Drug Administration (FDA), nos Estados Unidos em 2005, e em seguida na Europa e na América Latina. Já são mais de 80 países que o incluíram no tratamento de seus pacientes com mieloma, exatamente porque reconhecem os benefícios da droga. Mas o Brasil, infelizmente, está fora dessa lista. Por isso, além de lutar contra a doença, Bruzzi também teve que lutar para conseguir o remédio, o que só foi possível pela via judicial.

Não há nenhuma dúvida na comunidade científica sobre os benefícios proporcionados pela lenalidomida. Cientistas como o espanhol Jesús San Miguel, o italiano Antonio Palumbo e o americano Paul Richardson, entre outros, têm inúmeros trabalhos publicados em renomadas revistas científicas nos Estados Unidos e na Europa, demonstrando a evidência científica do tratamento, principalmente para os pacientes pré e pós-transplante.

No Brasil, calcula-se que haja mais de 30 mil pacientes com a doença e milhares deles sofrem recaída. Ao contrário de algumas coagulopatias que podem ser tratadas com um único medicamento, o paciente com mieloma é tratado com uma combinação que inclui vários remédios.

Enquanto isso, uma nova geração de imunomodulador conhecida como pomalidomida já apresenta resultados positivos e, no próximo mês de fevereiro de 2013 será aprovada nos Estados Unidos, segundo adiantou o FDA. Além disso, são animadores os resultados de estudos com uma nova droga chamada carfilzomibe, já aprovada há cerca de seis meses pelo mesmo FDA.

Todas as instituições brasileiras vinculadas ao assunto reivindicam o registro da lenalidomida: a Associação Brasileira de Hematologia, Hemoterapia e Terapia Celular (ABHH), que representa os médicos brasileiros especialistas em doenças oncohematológicas; a International Myeloma Foundation Latin America (IMF) e a Associação Brasileira de Leucemias e Linfomas (Abrale), entre outras.

Durante o congresso anual da American Society of Hematology (ASH), o maior do mundo, em Atlanta, na segunda semana de dezembro de 2012, os maiores especialistas do mundo mostraram as evidências científicas do uso da lenalidomida para mieloma múltiplo e apresentaram novos estudos sobre sua eficácia também para outras doenças, como leucemias e linfomas.

Os pacientes mal tratados sofrem dores horríveis com constantes fraturas dos ossos e isso passa a impedir a locomoção deles. Mas para além da questão humanitária, é importante observarmos o aspecto econômico desse contexto, afinal um paciente bem tratado custa menos para o sistema de saúde do País (tanto público quanto privado). O tratamento adequado reduz o número de internações e de faltas ao trabalho.

A situação atual provoca o seguinte quadro no Brasil: os pacientes mais esclarecidos e dispostos a lutar, como é o caso de Raimundo Bruzzi, procuram seus direitos, criam blogs, fazem abaixo-assinados, vão à justiça e, com muita sorte, conseguem o medicamento original, como ele, e depois de muita batalha. Enquanto a maioria com diagnóstico de mieloma ainda não se conscientizou de seus direitos à cidadania. Não é por acaso que a Constituição Federal em seu artigo 196 diz que a saúde é um direito do cidadão e um dever do Estado.

Mas a ANVISA acaba de indeferir o pedido de registro do medicamento no Brasil o que está provocando profunda indignação de médicos e de pacientes dentro e fora do país. Considero isso um grave descaso da agência que se acha acima das agências reguladoras internacionais como FDA (EUA) e EMEA (Europa) em prejuízo de milhares de pacientes em todo o Brasil.

.Por: Dra. Vania Hungria, hematologista, professora Adjunta da Disciplina de Hematologia e Oncologia da Santa Casa de São Paulo. Diretora da International Myeloma Foundation Latin America. Membro do International Myeloma Working Group e da Diretoria do International Myeloma Society.

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