Página Inicial
PORTAL MÍDIA KIT BOLETIM TV FATOR BRASIL PageRank
Busca: OK
CANAIS

13/04/2013 - 10:13

O dilema da proibição da doação de sangue por homossexuais

Todo mundo sabe o quanto os bancos de sangue lutam para conseguir convencer mais e mais pessoas a doarem sangue. Estima-se que 1,9 % dos brasileiros doem sangue regularmente. Essa estimativa está dentro dos parâmetros mundiais de 1 a 3% estipulados pela OMS, mas a instabilidade das doações e a constante necessidade de sangue causam muitos transtornos para os hospitais e colocam em risco a vida de muitas pessoas. Uma simples doação, que leva cerca de 40 minutos, pode salvar de 3 a 4 vidas. Portanto, doar sangue é um ato de cidadania.

No ato da doação, o voluntário é submetido a uma entrevista de triagem, que inclui informações sobre doenças, uso de drogas e medicamentos, tatuagens e piercings recentes e comportamento sexual. Todas essas coisas levam em conta um risco aumentado de transmissão de HIV e hepatites, mas há uma grande incoerência sobre a realização dessa triagem, uma vez que todo o sangue doado é testado para essas doenças antes de ser utilizado pelo receptor. A justificativa da triagem é eliminar doadores em condições de saúde que coloquem em risco a vida do doador e do receptor e potencialmente infectados pelas mesmas razões e também para "não desperdiçar material de coleta".

Em minha opinião, a questão do comportamento sexual é depois do medo que os brasileiros têm de agulhas, a segunda razão que mais inibe que pessoas doem sangue, porque ter que revelar dados sobre o número de parceiros, comportamento sexual sem proteção, além de parecer irrelevante, porque todas as amostras são sistematicamente testadas, me parece, no mínimo, preconceituoso. Há também outro fator: pessoas que se declaram homossexuais têm sua intenção de doação vetada, mesmo que tenha uma relação estável, mesmo que não faça sexo há meses. Homossexuais são considerados promíscuos e com um risco maior de estarem contaminados.

Pergunto: e quem mente na hora de doar sangue para um familiar? Será que um heterossexual promíscuo, na hora que tiver que doar sangue para a sua mãe hospitalizada, revelará, no momento da triagem, que participou de uma orgia na semana anterior? Eu duvido. E aquele homossexual que estiver passando pela mesma situação? Será que ele vai dizer a verdade, será que ele se assumirá homossexual na tal triagem, correndo o risco de ser proibido de doar sangue para um familiar na UTI? Certeza que não.

Negar o direito de um homossexual doar sangue é negar o direito à cidadania. Alguns podem dar de ombros, pensando "danem-se se eles não querem meu sangue", mas conheço diversos homossexuais que mentem, ocultam sua sexualidade para poderem ajudar conhecidos e desconhecidos, doando regularmente o seu sangue. Além disso, doar sangue é uma forma bastante cidadã de conhecer as suas sorologias.

O que parece mais fácil: assumir que essa prática é retrógrada, preconceituosa e burra ou instalar detectores de mentiras nas triagens dos bancos de sangue? Pense nisso.

.Por: Marcelo Niel: Médico psiquiatra e psicoterapeuta de orientação junguiana e especializado no tratamento de dependentes químicos. Mestre em Ciências e colaborador da Unifesp. Professor Instrutor do Departamento de Psiquiatria da Santa Casa de São Paulo. Um dos autores do livro: Série Dilemas Modernos 1: Drogas, Família e Adolescência. E-mail: [email protected]| Telefone: (11)98145-4178.

Enviar Imprimir


© Copyright 2006 - 2024 Fator Brasil. Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Tribeira