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25/07/2013 - 12:12

Nossos dois países

Os telespectadores do "Jornal Nacional" do dia 18 de julho passaram vários minutos a presenciar a destruição do Leblon. Um símbolo da beleza material do Rio de Janeiro se tornava um amontoado de vidros quebrados e entulho. Uma turba andrajosa, seminua e mascarada, provavelmente oriunda das favelas, disseminava focos de incêndio e quebrava raivosamente as portas comerciais. Uma terra arrasada resultou desse "protesto" tresloucado. As autoridades entrevistadas não tiveram dúvidas em capitular às escancaras e aos montes os crimes praticados: dano, furto, periclitação da vida, formação de quadrilha etc, etc. Lamentável a ira dos despossuídos de dinheiro, educação e o mínimo sentido de respeito ético ao patrimônio privado e público.

É comezinho que, em direito penal, não há compensação de culpas. Não é como o direito civil, em que obrigações contrárias, da mesma espécie, se extinguem até onde se compensam. Porém, o povo deve pensar politicamente, o que significa para além das balizas estreitas do direito.

E, por consequência, fazer a pergunta importante à "res publica", aquela pertencente a todos, não apenas ao Estado: qual o maior prejuízo causado à estética, considerada sob seus vários aspectos, do Rio de Janeiro: a depredação do Leblon ou o sucateamento, sob o beneplácito da União, do lendário Hotel Glória, edificado na Marina da Glória e que abrigou eventos da maior relevância para a história brasileira, que tinha em Rui Barbosa e tantos outros um de seus mais ilustres frequentadores?

Assim como nos deprimiram as cenas do Jornal Nacional, a foto do estado atual do hotel e a narrativa estampada na página principal do "UOL" ("De Olho no Cofre", 19 de julho), são capazes de comover até as lágrimas. A distinção está em que, no segundo caso, os criminosos foram engravatados que não se utilizaram de violência física, mas de esperteza. Resta saber qual foi o prejuízo mais grave ou, em outras palavras, qual o patrimônio que envolverá mais custos, dispêndios e tempos para ser recomposto.

O hotel ícone da terra carioca foi inaugurado em 1922 e se tornou um de seus cartões postais. Quem teve oportunidade de pernoitar uma vez em suas dependências ou participar de um ato político em seu interior tem de segurar as lágrimas, do mesmo modo como o fizeram os comerciantes do Leblon.

Foi comprado em 2008 (quando já deveria estar tombado) pelo Grupo EBX de Eike Batista, pela pechincha, considerado seu aspecto material e histórico, de R$ 80 milhões. No entanto, o contrato apalavrado com o BNDES só veio à tona em 2010, quando se iniciou a reforma do prédio, que deveria estar encerrada no final de 2011.Todavia, as sucessivas paralisações dos trabalhos levaram à protelação inicial para 2013 e depois para 2014. Hoje ninguém mais diz coisa alguma sob a perspectiva de o Rio de Janeiro voltar a ser ornamentado por esse enciclopédico hotel.

O Presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio, Sidney Menezes, pede explicações cabais, "para ter mais clareza sobre o rumo daquilo ali". É preciso ter não mais clareza, mas clareza absoluta, por parte de todo o povo carioca e brasileiro.

Dos R$ 200 milhões compromissados pelo BNDES ao grupo de Eike Batista sabe-se com segurança que foram liberados R$ 50 milhões. Mas, no país da ignorância absoluta sobre os fatos públicos, não sabem as autoridades vinculadas ao banco informar o valor exato das liberações. Sob a ditadura militar, os então autênticos do MDB cunharam a expressão "república do talvez ou do quem sabe". Melhor do que república em que ninguém sabe, sempre, de coisa alguma. Somente dizem, acacianamente, que as liberações são feitas na medida dos trabalhos; paralisados estes, paralisam-se os repasses...

As obras estão completamente paralisadas e as fotos estampadas pelo mencionado veículo da internet é de causar indignação e lamentos. O hotel Glória lembra um dos edifícios de Detroit, cidade americana que acaba de requerer falência.

Acrescente-se, finalmente, que o empréstimo de R$ 200 milhões foi tomado para pagamento em 18 anos e a juros de 6,9% ao ano. A construtora não precisaria abrir seus cofres. Os pagamentos seriam saldados tranquilamente com as diárias pagas pelos hóspedes, com sobras.

Essa hipótese comparativa, no Brasil, não desencadeia caso de polícia e tampouco de crimes como os referidos. A conclusão é de que vivemos em dois países, como, de resto, aconteceu, amiúde, na história da humanidade: um país de delinquentes de casacas e o outro, de sandálias ou de pés no chão.

.Por: Dr. Amadeu Garrido de Paula, advogado.

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