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18/09/2013 - 11:26

O voto do Ministro Celso de Mello

A essência do passado voto do Ministro Celso de Mello para votar contra a aplicação imediata da Lei da Ficha Limpa consistiu no princípio da presunção de inocência: "Não admito a possibilidade de que decisão ainda recorrível possa gerar hipótese de inelegibilidade".

Ao longo de seu evolver, o homem foi criando histórias que embasaram a formação de sua cultura, inclusive jurídica, e a presunção de inocência não foi exceção: "O machado roubado.

Lao-Tsé conta que, um dia, um camponês perdeu seu machado. Ele o procurou, mas em vão.

Então percebeu um dos vizinhos, que passeava evitando seu olhar, e imediatamente suspeitou de que ele tivesse roubado seu machado. O homem, com efeito, tinha o comportamento de um ladrão de machado. Seu rosto, sua impressão, sua atitude, seus gestos, as palavras que pronunciava, tudo revelava nele, sem a menor sombra de dúvida, um ladrão de machado.

O camponês estava a ponto de denunciá-lo, de acusá-lo publicamente, de levá-lo diante de um juiz, quando encontrou seu machado, que tinha caído num mato, não longe dali.

Quando reviu o vizinho, este não apresentava o menor indício que pudesse evocar nele um ladrão de machado."

Eis aí uma explicação do sentido cultural do princípio da presunção de inocência, que conduziu o culto Ministro Celso de Mello a emitir aquele pronunciamento.

Pressões são inúteis ante um jurista de tal envergadura.

O que pode sensibilizar o decano é um argumento de ordem estritamente jurídica. Não seria o amplo interesse nacional, o imperativo de não frustrar as expectativas generalizadas de dar um fim à corrupção, uma bactéria que abala a saúde de todos os preceitos da Constituição Federal, um preceito constitucional de natureza fundamental implícito, portanto subordinante do direito de recorrer com base num regimento, de resto de aplicação duvidosa?

Esse princípio deve preponderar na decisão de um colegiado político, em que a vontade massiva da nação se projeta sobre todos os pontos do Plenário, para lembrar aos Ministros que ela é a entidade que dá sentido à própria existência do Tribunal.

Outrossim, essa interpretação se compatibiliza com várias declarações do texto magno, indicativas da finalidade do Estado brasileiro. São formadoras dos princípios, ainda que não expressos na letra falível do constituinte. Trata-se de política, mas não em sentido comum depreciativo, porém de política jurídica e jurisdicional, a inspirar as decisões daqueles que são responsáveis por uma constituição aberta, posto terem ficado no passado as constituições fechadas, em que suas declarações pomposas de nada serviam, consideradas meramente programáticas.

Argumentos e pressões metajurídicas não impressionarão o Ministro Celso. Seu voto somente seguirá fundamentação que contenha um princípio de direito, cuja violação, para muitos constitucionalistas, a exemplo de Celso Antonio Bandeira de Mello, é mais grave do que a ofensa a um preceito escrito.

. Por: Amadeu Garrido, advogado.

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