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03/10/2013 - 09:03

As Raízes do Marxismo

Muitos consideram o marxismo como um sistema filosófico completo e acabado, o cume da filosofia moderna. Para entender melhor o marxismo, no entanto, é necessário colocá-lo dentro do processo de desenvolvimento do Pensamento Moderno. O próprio Engels dizia: “Não chegamos ao comunismo senão através da dissolução da especulação hegeliana realizada por Feuerbach...”. Isto é, Marx e Engels não chegaram à filosofia a partir do socialismo, mas chegaram ao socialismo a partir da filosofia.

O Pensamento Moderno teve como base a reforma protestante de Lutero (1483-1546) e o pensamento filosófico de Descartes (1596-1650). Lutero, ao afirmar que o ser humano está totalmente corrompido pelo pecado e que a única forma de salvação é pela fé, implanta uma forma de religião fiducial. Para Lutero, não importava o que Jesus Cristo era em si mesmo, mas que Ele era o seu salvador. Operou-se então uma espécie de subjetivismo religioso, onde a fé está completamente separada da razão.

Descartes, buscando um método filosófico que unificasse todos os campos do saber, entendeu ser necessário duvidar de tudo (dúvida metódica) até chegar ao que não se pode duvidar, ao que ele chamava de ideias claras e distintas. Este seria então o princípio do filosofar. Como a dúvida atinge tudo o que está fora do pensamento, a razão humana torna-se o centro, a regra e a medida da verdade. A verdade não está na realidade das coisas e sim na capacidade humana de aprendê-las. Já foi dito que: “a ciência cartesiana prefere uma explicação de algo que não existe à existência de algo que não entende”. Temos, portanto, com Descartes, uma verdade idealizada, um subjetivismo filosófico. A matéria e espírito são colocados como coisas opostas, dois mundos que nada têm em comum, que são unidos por Deus.

Este dualismo ontológico (separação entre matéria e espírito) gerado pelo subjetivismo religioso de Lutero e pelo subjetivismo filosófico de Descartes, leva ao imanentismo (justificação do mundo por si mesmo) idealista, que considera a matéria como um produto do espírito ou ao imanentismo materialista, que considera o espírito como produto da matéria. Do lado idealista, temos uma série de grandes pensadores, dentre os principais: Spinoza, Kant e Hegel.

Spinoza (1632-1677) afirmava ser o mundo manifestação de uma única substância divina em inúmeras formas finitas. Ele pregava uma espécie de monismo panteísta. Deus e o mundo são a mesma coisa. Já Kant (1724-1804) afirmava que o homem tem formas a priori no interior da consciência que fazem possíveis os juízos universais a partir da experiência particular. Para ele, o ser é o ser pensado, e o dever é uma lei que se impõe como Imperativo Categórico. Em Hegel (1770-1831) temos o idealismo já acabado, onde tudo o que é real é racional e tudo o que é racional é real. A história não é mais que um processo racional, com saltos dialéticos onde cada momento (tese) é preparado por meio da sua negação (antítese), originando outro momento superior (síntese). Hegel segue o conceito alemão da palavra alienação (algo que tem que ser superado, mas conservando o que foi superado). O pensamento hegeliano, posteriormente, se bifurca entre a direita hegeliana e a esquerda hegeliana.

A esquerda Hegeliana (caminho de Marx) optou pelo método, pela dialética. O principal expoente da esquerda hegeliana foi Feuerbach (1804-1872), que afirmou: “meu primeiro pensamento foi Deus, o segundo, a razão e o último, o homem”. Para Feuerbach, Deus não seria mais do que a projeção psicológica que o homem faz de si, a personificação da infinitude do gênero humano. E assim ele conclui: “O homem é para o homem a essência suprema”.

Assim, como disse Engels, na citação inicial deste texto, chegamos ao marxismo. Marx (1818-1883), filho de pai judeu alemão convertido ao luteranismo para poder exercer uma profissão liberal, estudou em Bonn e Berlin, e começou sua carreira escrevendo para diversos jornais e revistas. Tomou contato com os movimentos socialistas em Paris, mudou-se para a Bélgica e finalmente, estabeleceu-se na Inglaterra. Engels (1820-1895), filho de família burguesa de empresários da indústria têxtil, conheceu Marx em 1843. A parceria entre os dois durou até o fim da vida de Marx. A principal obra da dupla foi o Manifesto do Partido Comunista, publicado pela primeira vez em 1848. Grande parte do pensamento de Marx foi reunido no seu livro “O Capital”, cujo primeiro volume foi publicado em 1867. Os outros dois volumes foram preparados por Engels, após a morte de Marx.

Tivemos outros pensadores anteriores à Marx que buscaram implantar uma espécie de socialismo utópico, como Saint-Simon (1760-1825), Fourier (1771-1837), Owen (1771-1858) e Cabet (1788-1856), e também aqueles que buscaram implantar uma forma mais democrática de socialismo, algo mais palatável à sociedade capitalista, como Proudhon (1809-1865). Podemos também lembrar de outros adversários do marxismo no campo da esquerda, como o Socialismo de Estado de Lasalle, que considerava caber ao Estado e não à revolução, implantar o socialismo, e o anarquismo de Bakunin, para quem o Estado era a negação da liberdade individual e a sociedade política era a causa de todos os crimes. Tanto os socialistas utópicos, os socialistas democráticos, os socialistas de Estado, como os anarquistas tiveram menos sucesso, como propagadores de suas idéias, do que tiveram Marx e Engels.

Vimos então que o Marxismo foi resultado de um processo iniciado por Lutero e Descartes, que rompeu com a realidade externa e trouxe a origem da religião e da filosofia para dentro da razão humana. Este processo cortou o fio-terra que liga o ser humano à existência real das coisas. Invés de considerar a matéria e o espírito como manifestações do mesmo ser, considerou-se como coisas separadas. Daí desenvolveu-se uma filosofia que pouco a pouco vai tornando o homem o ser supremo, superando o sentimento religioso, que era visto como uma bengala para justificar as coisas que ainda não haviam encontrado resposta racional.

Aqueles que consideram o marxismo como um sistema completo e acabado, não estão completamente errados se têm como referência o Pensamento Moderno. Numa visão mais ampla, no entanto, podemos dizer que o deus idealista, morto por Feuerbach e enterrado por Marx, continua vivo, como Deus real, como Ser por excelência, como causa incausada, no pensamento atemporal da filosofia Aristotélico-Tomista.

. Por: Alcides Leite, economista e professor da Trevisan Escola de Negócios.

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