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22/10/2013 - 08:38

A responsabilidade do juiz na concessão de liminares em ações societárias

As relações empresariais têm ganhado contornos muito complexos ao longo do tempo. Administrar empresas não é função fácil, especialmente quando se tem por prisma uma avaliação concorrencial e de mercado global.

Não há como se negar que as complexidades administrativas tendem a causar pontos de vista conflitantes e ações divergentes, que por vezes, desembocam em demandas judiciais, que ao baterem a porta do Poder Judiciário podem não encontrar acerto quanto à decisão da controvérsia.

O juiz é um técnico do direito e não deve – ao menos em tese – se exigir que transite com destreza em outros campos do conhecimento humano, tais como administração de empresas, contabilidade e economia, para tais situações existe o auxilio de profissionais de tais áreas para elucidação de questões que fujam ao conhecimento do julgador.

Com estas breves premissas, propomo-nos a discutir a suspensão dos poderes de administração de sócios concedida especialmente em fase de cognição sumária, bem como seus desdobramentos no mercado e na sociedade.

O Código Civil de 2002 foi o diploma que substitui o antigo Código Comercial. Trouxe alguns avanços e deixou algumas matérias importantíssimas de fora de sua previsão. Não se sabe se pela evolução das relações, ou demora na tramitação dos projetos de lei que já nascem com patente desatualização.

As questões que chegam a juízo versam em sua maioria sobre direitos atinentes às obrigações e direitos dos sócios, bem como sobre a administração das sociedades.

Não incomum o Magistrado deparar-se com pedidos baseados na urgência – seja pelo manejo de cautelares, antecipações de tutela ou pedidos em caráter liminar – e como não pode furtar-se de decidir, tem obrigatoriamente que fazer exercícios de interpretação para tomada de decisão e neste ponto é que queremos abordar o tema, especialmente fitando o princípio da preservação da empresa.

A concessão de medidas liminares em ações que visem a suspender ou afetar direitos de administração ou de representação de sociedade devem ser absolutamente excepcionais, e, infelizmente não é o que vislumbramos no dia-a-dia forense.

Não é incomum que sob o pálio de proteger direito material do sócio que busca guarida do Poder Judiciário sejam concedidas liminares ou outras modalidades cautelares com o fim de suspender atos de sociedade, gestão ou ainda administração. A pergunta que se deve fazer é: Poderia o direito individual de sócio se sobrepor aos direitos sociais que integram o plexo de funcionamento das empresas? Em nosso sentir a resposta é negativa embora não seja fácil a fórmula de decisão daquele que exerce a função judicante.

É de rigor fixarmos que o “princípio” da preservação da empresa, é vastamente aceito pelos Tribunais Superiores, e, visa a projeção dos direitos privados de empresa na orbita dos direitos sociais constitucionalmente resguardados, e assim sendo, ainda que se reconheça a importância do poder geral de cautela do Magistrado, este há de ser lido nas duas vertentes possíveis: a proteção do direito individual do sócio e a proteção do direito social decorrente da própria atividade da sociedade empresária.

Há autores que projetam a função social da propriedade como fundante de uma interpretação alargada da matéria reservada à preservação da empresa. Embora haja certa imbricação de matéria, temos que pode não ser está a melhor leitura.

Entendemos que se trata de uma proteção de mercado; por assim dizer de proteger o ambiente socioeconômico do país, e, por vezes é exatamente neste ponto em que muitos Magistrados fazem uma valoração inicial das demandas de forma completamente equivocada.

A realidade é que o Magistrado ao avaliar tem consigo a solidão de seus conceitos e predisposições; construídas ao longo da vida, e por vezes, sem nenhuma experiência no meio empresarial.

Os efeitos de uma suspensão ab initio dos direitos de administração ou representação geralmente causam efeitos nefastos às empresas, por vezes, implicando na impossibilidade de atividade da sociedade empresaria.

É inegável a urgência das questões societárias. Basta avaliar brevemente os prazos para contestação nos pleitos de dissolução de pleno direito (48 horas) ou de dissolução contenciosa (5 dias) que por força dos artigos 655 e 674 do Código de Processo vetusto, e, do artigo 1.218, VII do Código de Processo Civil atual continuam a nos inquietar e discutir sobre seu entrosamento com a atual sistemática. São inegavelmente prazos muito exíguos e que fogem a regra processual brasileira, sem dúvida, pela necessidade de urgência na tramitação dos processos.

Todavia, a urgência, embora relevante, deve ser mitigada pela necessidade de preservação da empresa.

Em empresas pequenas ou médias, basta a suspensão de direitos de representação ou administração próxima a pagamento de funcionários ou fornecedores importantes para instauração do caos administrativo, que muitas vezes deságuam na impossibilidade de continuidade da atividade.

Certamente virão aqueles menos crentes na realidade forense e dirão: “Mas o juiz como precavido que é nomeará de imediato um administrador judicial para que não haja desmandos societários”.

É bem verdade que a figura do administrador ou representante judicial é importantíssima – não só nas recuperações judiciais ou falências (síndicos) – mas, é inegável que a demora na assinatura do compromisso de atuação, bem como, tempo necessário para ambientação na empresa, na prática leva as sociedades à bancarrota.

Em regra é impraticável a interferência judicial em sede de concessão de medidas iniciais, exceto em raríssimas exceções, ainda que para resguardar direitos materiais de sócio, especialmente quando tangenciados aqueles direitos descritos nos artigos 1010 a 1021 do Código Civil Brasileiro, que falam das responsabilidades do administrador. Especialmente por em nosso país a grande maioria das sociedades contar com um sócio administrador e não profissional mandatário.

É sem dúvida matéria que como regra deve aguardar a instauração do contraditório. Noutras palavras a concessão de medidas iniciais é claramente uma exceção, mas, neste caso de reforço em uma postura preservacionista por parte do juiz.

As situações e efeitos de pedidos cautelares ou iniciais gerais são mais comuns nas sociedades contratuais, e menos nas companhias ou sociedades anônimas. Isto porque nas sociedades anônimas, em geral, há uma maior profissionalização dos procedimentos de administração, estancando e permitindo uma maior fluência dos afazeres ainda que afetados por ordem judicial.

A interpretação quando se trata de companhias também é diferente por parte do Poder Judiciário, quase sempre sob o pálio da proteção dos direitos dos acionistas. E tal exercício tem total respaldo; é além de uma proteção a terceiro interessado (próprio acionista), uma proteção de mercado.

O que afirmamos é que a mesma interpretação deve prevalecer para as sociedades contratuais, ainda que outros sejam os argumentos, entretanto, com o mesmo viés de proteção de mercado e visão preservacionista por parte do Magistrado no que tange a função social da empresa.

Há muito que a justiça brasileira se recente da formação de varas especializadas em direito de empresa.

A recente alteração da lei de arbitragem preenche uma lacuna importante. Todavia, é inegável que o instituto da arbitragem está distante de ser o meio de composição de conflitos utilizado pela maioria do empresariado brasileiro. Seria necessária a “popularização” do instituto que hoje tem grande identidade com questões de grande monta e que envolta companhias multinacionais.

A chamada “segmentação de mercado” procurou trazer especialização aos meios empresariais, fenômeno que foi acompanhado inclusive pela advocacia.

Na justiça, embora existam as varas especializadas, ainda é tímida a especialização em razão da matéria; e a maior ausência é sem dúvida de Julgadores especializados nas complexas questões empresarias que envolvem não só empresas pequenas e nacionais como vários conglomerados mundiais.

O Poder Judiciário tem como função precípua a guarda da estabilidade legal, e, por consequência social, e para tal, o cotejo entre direitos pessoais que irradiem efeitos para órbita de desestabilidade social é exercício diário.

Neste sentido, se a concessão de medidas imediatas já é exceção no direito brasileiro, questões que possam gerar desemprego ou quebra da empresa são de restrição ainda mais qualificada por todos os princípios envoltos na tônica de preservação de mercado e das empresas que o compõe.

. Por: Artigo escrito por Aílton Soares de Oliveira, advogado, especialista em Direito Tributário pela PUC-SP, sócio responsável pela área de Direito Público de GDO Advogados.

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