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01/04/2014 - 11:11

A dor e a tortura - uma visão médica

Ditadura Militar Brasileira – 1964.

Métodos de tortura física existem desde o início da história humana, em geral quando se busca confissões ou delações de adversários ou inimigos. Além de todos os questionamentos éticos e morais que envolvem esta prática, há um enfoque científico que a faz algo ainda mais abominável: a dor.

A tortura: uma pessoa submetida a métodos físicos que provoquem dor, além de toda a pressão emocional que um momento como este produz, vai, progressivamente, perdendo seu controle de ideias e ações. Seu cérebro não entende o motivo de tantos estímulos desagradáveis repetidos, não consegue impedir que as lesões sejam produzidas, e tudo entra em falência. O cérebro passa a mandar a pessoa falar o que o torturador quer ouvir, equilíbrio e ponderação passam a não mais existir. Só resta uma sensação primitiva de sobrevivência, que faz o torturado ainda ter alguma força para poder interagir.

Entre os muitos métodos de inflingir dor, um dos mais ‘populares’ são estímulos aos pés e tornozelos, como compressão, torção, queimaduras e choques. São regiões muito sensíveis e que facilmente geram dor insuportável. Diferente de afogamentos, sufocamentos e outras agressões que podem alterar a consciência da pessoa, a agressão aos pés geralmente mantém o torturado lúcido, em extremo sofrimento. E também facilmente se gera o componente de dor crônica, quando este estímulo de agressão é frequente, intenso, mais ainda quando gera lesões definitivas nos nervos e articulações.

Em resumo: a dor gerada em sessões de tortura, além de rebaixar o indivíduo ao menor nível de dignidade possível, gera consequências por toda a vida: seu corpo tende a ser mais sensível a estímulos dolorosos, a dor provoca alterações significativas de comportamento e induz quadros de depressão e ansiedade, afetando o convívio social de modo permanente. Isto deve ser lembrado quando se discute punições aos que torturam: seus atos não são meros momentos de maldade, e sim ações que afligem sofrimento físico e mental por toda a vida aos que à tortura foram submetidos.

A dor pode ser definida como uma experiência desagradável ao corpo e ao emocional, causada por danos físicos e que, quando persistente, pode estar presente mesmo na ausência de um estímulo nocivo (a chamada ‘dor crônica’).

Sabe-se que a dor é fundamental para que se sobreviva; ela nos alerta de problemas e nos motiva a buscar e eliminar causas. Quem ‘percebe’ a dor é um complexo sistema que se assemelha ao alarme de uma casa: uma cerca elétrica, um sensor de movimento, quando estimulados, geram sinais que disparam uma sirene. É o que fazemos quando tocamos a mão em uma chapa quente. Pequenos filamentos de nervos geram um estímulo elétrico, que é conduzido até nossa medula, na coluna vertebral, que encaminha esta informação ao nosso cérebro.

No meio do caminho, já existe uma resposta, o reflexo de retirada da mão, mediada pela medula. No cérebro, ocorre o processamento definitivo da informação e a definição do que fazer ao longo do tempo: procurar um médico, tomar um remédio, repousar, etc. É como se a pessoa que está na central de monitoramento do alarme decida se vai chamar a polícia, avisar o proprietário ou simplesmente desligar a sirene, entendendo que foi um alarme falso.

Quando o estímulo de dor é frequente e repetido, as coisas vão se complicando. A sirene toca a todo momento, a central de controle das informações vai ficando confusa e todo este delicado sistema de percepção, condução e interpretação de estímulos fica comprometido. A dor passa a acontecer mesmo com estímulos fracos ou até sem qualquer provocação. Chama-se isto de dor crônica.

.Por: José Luis Zabeu, Ortopedista do Hospital e Maternidade Celso Pierro da PUC-Campinas.

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