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25/06/2014 - 10:57

Sociedade de massas e justiça com as próprias mãos


Sociedade sustentável é que desenvolve a empatia (entrar no estado emocional das pessoas que sofrem e sentir suas dores como se fossem nossas; vontade de tomar parte na experiência de outra pessoa e de compartilhar a sensação dessa experiência) (veja Rifkin 2010: 21) e que se esforça duramente para evitar a entropia (a desordem, a desintegração, a destruição). A luta contínua dos povos civilizados consiste em preservar suas conquistas éticas e culturais positivas, não permitindo o desenvolvimento (ou incremento) das negatividades das sociedades de massas, que tendem à desintegração, à destruição. Ortega y Gasset (no seu clássico livro Rebelión de las masas, 2013: 177), nas primeiras décadas do século XX, afirmava:

"Em uma boa ordenação das coisas públicas [leia-se: numa sociedade sã, solvente, razoavelmente igualitária e, consequentemente, sustentável], a massa é precisamente a que não atua por si mesma. Essa é sua missão. Ela veio ao mundo para ser dirigida, influída, representada, organizada. Não veio ao mundo para fazer tudo isso por si só. Necessita guiar a sua vida por uma instância superior, constituída pelas minorias excelentes (...) Podemos discutir quais são esses humanos excelentes, mas sem eles a humanidade não existiria (...) é uma lei da física social (...) no dia em que voltar a imperar a autêntica filosofia, se perceberá que o humano é um ser constitutivamente forçado a buscar uma instância superior (...) Pretender a massa atuar por si mesma é, pois, rebelar-se contra seu próprio destino e, como isso é o que ela está fazendo agora, falo eu da rebelião das massas (...) a única coisa que substancialmente pode ser chamada de rebelião é a que consiste em não aceitar cada qual seu destino, em rebelar-se contra si mesmo (...) Quando a massa atua por si mesma, o faz somente de uma maneira, porque não sabe outra: lincha. Não é casual que a lei de Lynch seja americana, já que América [incluindo o Brasil] é, em certo sentido, o paraíso das massas (...); onde as massas triunfam, triunfa a violência, que é transformada na única ratio da sua existência, na única doutrina".

Os linchamentos, na medida em que incrementa o genocídio já instalado, constituem sintomas preocupantes de uma sociedade entrópica (destrutiva, desorganizada, doente), marcada pela violência, sobretudo na sua retórica (como dizia Ortega y Gasset): "Quando uma realidade humana já cumpriu a sua história, quando já naufragou e já morreu, as ondas retóricas são as que sobrevivem, porque elas são o cemitério das realidades humanas". O Brasil, hoje, é um país totalmente partido (e bastante rancoroso). Temos que sempre respeitar as divergências e os debates, mas não podemos permitir o vandalismo, nem físico nem verbal. A cada dia se nota que o termômetro da radicalização da violência está subindo (são 57 mil assassinatos no Brasil, por ano; ele é o 13º país mais violento do planeta, com 29 mortes para cada 100 mil pessoas). Adote um bandido" (campanha lançada pela jornalista Sheherazade, estimuladora da justiça com as próprias mãos), é só mais um sinal dos tempos sombrios que estamos vivendo. Nenhum nação civilizada sobrevive com o discurso e a prática da violência.

Precisamente quando a sociedade começa a agir por conta própria é que devemos difundir o discurso da empatia e da ética. Recordemos: a sociedade de massas, para protestar contra a escassez de alimentos e de pão, costuma destruir as padarias (Ortega y Gasset); para reivindicar melhores transportes públicos, queima os ônibus existentes; para pedir mais justiça, começa a matar pessoas com as próprias mãos (Mauro Rodrigues Muniz em Araraquara-SP, Fabiane Maria de Jesus, em Guarujá-SP, Hugo Neves, em Campo Grande-MS). O destino das nações civilizadas nunca pode ficar ao sabor dos humores (e ódios) das massas. Necessitamos urgentemente de novos modelos de educação (de todos) que ensinem menos competição e mais colaboração, que mostrem menos sofrimento e mais empatia, menos individualidade e mais bem-estar de toda coletividade.

. Por: Luiz Flávio Gomes, jurista e diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Estou no professorLFG.com.br e no twitter: @professorlfg.

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