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10/02/2015 - 07:23

Desfiladeiro intransponível, por Amadeu Garrido de Paula

As sociedades e o Estado caminham sobre uma planície, preferencialmente aprazível, em busca da felicidade. Dizia-se até pouco tempo em busca do melhor PIB, visão reducionista da circunstância existencial do homem e dos fins do Estado democrático. São inevitáveis os momentos de tempestade, os tremores de terra, os desvios íngremes, as montanhas a serem escaladas, mas, de braços dados, a sociedade e o Estado logram superar todas essas dificuldades na busca incessante daquele objetivo superior.

Não faz sentido a existência de um Estado como um aparato governado à distância ou até mesmo contrariamente aos propósitos e necessidades da sociedade. São um todo uno, indivisível, harmônico. O idealismo anarquista esperava que a sociedade pudesse tocar o barco só, mas a complexa realidade da administração de múltiplos interesses comuns demonstrou que um equipamento condutor é indispensável. Espera-se dele a veiculação das ideias da maioria, no plano rigoroso da lei e sob o regime democrático, um conceito ainda aberto que permite inúmeras formulações concretas de governo sob o nome de democracia.

Em que pese a miríade de problemas que afligem este século XXI, por todos os horizontes que logramos avistar, há um imperativo básico condicionante dessa marcha da sociedade e do Estado. Não podem ser inimigos. Em geral, as sociedades tendem a se acomodar ante o império de leis e de políticas adotadas por um governo livremente eleito. Não o elege para em seguida lançar flechas contra os governantes. Regra geral, é o Estado, cujo governo se fragilizou, por desvios éticos, incapacidade de governança, imperícia administrativa, que, contrapostos seus interesses de um projeto de governo contra a natural rebeldia da sociedade, converte-se no Estado inimigo.

O Brasil passa por um momento em que essa contradição entre o Estado e a sociedade está patente na consciência da grande maioria dos cidadãos. Nunca a corrupção foi tão grosseira e grossa, sob os aspectos do método e dos volumes inacreditáveis de recursos públicos desviados em favor de interesses partidários e privados. A corrupção da Petrobrás estremeceu definitivamente a relação entre sociedade e Estado. Não marcham mais em grupo por uma planície. Entre ambos se antepôs um desfiladeiro profundo, mortal e intransponível.

Esse é o verdadeiro significado da escolha de Aldemir Bendine, Presidente do Banco do Brasil, para não só conduzir, mas tirar de seu soterramento nossa empresa petrolífera. Em verdade, não houve uma escolha livre da Presidente Dilma Rousseff. É que ela e sua administração, O Estado, não conseguem mais atrair colaboradores, "experts" que ousem tentar atravessar o desfiladeiro. Nenhum empresário ou executivo que dê valor à sua paz e dignidade praticaria a temeridade de aceitar um convite para administrar a Petrobrás. Restou à Presidente fazer a escolha entre os que se encontram em sua banda. E, já que é assim, que o governo é desprovido de condições morais e de confiabilidade para recrutar os melhores quadros sociais para exercerem as mais importantes funções estatais, então que o escolhido seja alguém que lhe dedique uma devoção canina. Com tal opção preencheu a vaga e blindou-se. Simples assim.

Todavia, o câncer político brasileiro prossegue implacavelmente no sentido da temida metástase. O mercado imediatamente demonstrou seu inconformismo ante o Estado inimigo. Essa dualidade contraditória, esse organismo cortado ao meio, não tem retorno da UTI onde se encontra.

No passado, esses momentos críticos correspondiam aos momentos revolucionários, muitos acompanhados da violência que lhes pode ser inerente. Hoje, temos um conjunto instrumental, devidamente normatizado, no plano da democracia institucional, que permite a realização da gigantesca tarefa de reaproximação entre sociedade e Estado. O "recall", o "impeachment" e até mesmo a renúncia, que, sob certos ventos demolidores, torna-se inevitável. Somente com um novo pacto político, honrado por novos governantes, conscientes do drama que estremeceu nosso País, é a solução. E o povo nas ruas é fundamental para que seja alcançada.

. Por: Amadeu Garrido de Paula, advogado especialista em Direito Constitucional, Civil, Tributário e Coletivo do Trabalho.

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