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14/10/2015 - 08:07

Cuidado ao angariar fundos, através de financiamento coletivo, para um projeto aprovado pela Lei Rouanet

Quero fazer neste artigo algumas considerações sobre a legislação de incentivo à cultura criada pelo Governo Federal, também conhecida como Lei Rouanet (Lei n. 8.313/91), e a possibilidade de se criarem projetos para arrecadação em sites de financiamento coletivo no Brasil.

O tema é importante na exata medida em que algumas plataformas anunciam projetos a serem financiados e que oferecem o benefício fiscal dessa lei. E nesse ponto é que justamente precisamos analisar, com cautela, se o arcabouço jurídico existente (ou inexistente!) no Brasil oferece subsídio a esse tipo de aproveitamento fiscal.

Resumidamente, a Lei Rouanet possibilita que empresas e pessoas físicas possam abater do seu imposto de renda os valores doados a projetos previamente autorizados e aprovados pelo Ministério da Cultura, de maneira que podem ser adotadas cotas de doação ou patrocínio, de acordo com os requisitos exigidos pela lei. Esse, aliás, tem sido um forte instrumento de arrecadação e alavancagem de projetos culturais e educacionais Brasil afora, de maneira que, em uma primeira análise, não haveria impeditivo em se adotar o financiamento coletivo para angariar os valores para o projeto, além de gerar benefícios fiscais aos doadores ou patrocinadores.

Vale lembrar que, um site de financiamento coletivo (ou crowdfunding) nada mais é do que um intermediador entre o idealizador do projeto (seu dono) e os usuários do site (financiadores ou doadores). E que, por esta intermediação, recebe o site uma comissão, descontados os custos com os meios de pagamento utilizados no site. Além disso, a massiva maioria dos projetos oferece, em troca desse financiamento, uma “recompensa”, a qual precisa ser devidamente analisada.

Visto isso, passamos a analisar a possibilidade ou não de utilização dos sites de financiamento coletivo para angariar doações para projetos aprovados e incluídos na Lei Rouanet, bem como se os doadores poderão se aproveitar dos benefícios fiscais inerentes a essa doação ou patrocínio.

Sem adentrarmos em detalhes quanto a essência da Lei (se é boa, omissa ou ruim), queremos considerar objetivamente a questão a figura do intermediador na operação de busca e levantamento da doação ao projeto, que nesse caso é o site de crowdfunding.

Ao verificarmos os artigos 23, II, § 1o e art. 28 da lei, expressam clara Proibição (ou ao menos restrições contundentes) que, os projetos por aquela lei abarcados, utilizem-se de intermediários para angariar doadores ou patrocinadores. Isso significa dizer que, em uma primeira análise literal da lei, os projetos autorizados pela Lei Rouanet não poderiam utilizar quaisquer níveis de intermediadores, o que inclui, por natureza, os sites de crowdfunding. Proíbem ainda que o patrocinador ou doador receba qualquer tipo de vantagem financeira ou material pelo ato (e que portanto, seriam as recompensas, independentemente de seu valor financeiro).

Temos ainda mais subsídios para interpretar que essa intenção legal realmente é o objetivo da lei, haja vista que, conforme analisarmos fartamente na obra “Dinheiro da Multidão: oportunidades x burocracia no crowdfunding nacional”, o entendimento existente no Brasil acerca da natureza dessas plataformas é proibitivo no que tange ao tratamento entre os entes públicos e os atores privados. O posicionamento do Tribunal Superior Eleitoral acerca da proibição de se utilizar sites de crowdfunding para que candidatos pudessem angariar fundos para suas campanhas, vem na mesma linha dessa proibição da Lei Rouanet.

Ainda nessa linha, demonstramos no livro que a figura jurídica das recompensas, dependendo do tipo de campanha e projeto a que estão vinculadas, podem caracterizar um presente, uma retribuição material ou mesmo uma compra antecipada de produto, e isso atingiria a figura da lei que trata da proibição de qualquer vantagem material ou financeira.

Dessa forma, artistas, músicos, escritores, estudiosos que pretendem que seus projetos sejam alavancados através de plataformas de financiamento coletivo precisam tomar o cuidado de, ao apresentarem seu projeto para analise, deixar claro que, independente do reconhecimento da Lei para aquele projeto, via Ministério da Cultural, os doadores provavelmente não poderão se beneficiar das isenções e abatimentos fiscais. Tudo porque, diante dessa vedação expressa, a utilização do site de financiamento coletivo implica automaticamente no pagamento de uma comissão, o que desvirtuaria a finalidade pretendida pela lei.

Entendo perfeitamente que existem plataformas que alegam não cobrar comissões ou valores dos idealizadores dos projetos, especialmente os ligados a Lei Rouanet. Porém, também sei que não existe almoço grátis. Mais ainda, o perigo está em que, em uma análise futura pela Receita Federal (que pode levar até 5 anos para rever uma operação desse tipo), ela entenda que houve infração da Lei e, além de tributar o doador, com multa e juros, ainda obrigue o idealizador do projeto a restituir o que recebeu.

A questão pode parecer distante do dia a dia das plataformas, mas deveria receber a devida atenção de suas equipes. Afinal, divulgar um projeto em uma plataforma, alegando que as doações para ela poderão gozar de benefícios fiscais, os quais podem e provavelmente estarão infringindo a legislação especifica, além dos riscos fiscais, está induzindo a erro o doador, de modo que a responsabilidade civil e criminal por permitir essa divulgação pode respingar fortemente na reputação do site e seus administradores.

Minha intenção aqui não é jogar um balde de água fria nas plataformas que aceitam tais projetos aprovados pela Lei Rouanet, tampouco desestimular as doações e patrocínios. Antes disso, preocupo-me em alertar para tais riscos, já que, se permanecer essa insegurança quanto ao formato e a interpretação que o fisco brasileiro adotara sobre o crowdfunding, as empresas estão sim correndo riscos potencias, além dos riscos que o próprio detentor do projeto corre de perder o reconhecimento do seu projeto pelo Ministério da Cultura como elegível para benefícios fiscais.

. Por: Vinicius Maximiliano Carneiro, O autor é advogado corporativo, gestor contábil e financista. Possui MBA em Direito Empresarial pela FGV. É Especialista em Direito Eletrônico pela PUC/MG, atuou como advogado de Propriedade Intelectual no Brasil para a Motion Picture Association (MPA), Associação de Defesa da Propriedade Intelectual (ADEPI) e também para a União Brasileira de Video (UBV). Em seguida, foi gestor de projetos especiais na Associação Brasileira das Empresas de Software (ABES) - e Business Software Alliance (BSA). Também ocupou lugar na Comissão de Mercado de Capitais e Governança Corporativa da OAB/SP. Idealizador do projeto vencedor do Prêmio Sesi-Senai Inovação 2010 sustentável “Dinheiro Verde”. O Blog "No País da Fiscalização", de autoria do advogado, é focado no mercado de financiamento coletivo nacional. Empreendedor serial, é diretor executivo da Etecon Contabilidade, diretor financeiro da Mhydas Fomento Mercantil e presidente no Brasil da Mhydas North America. Apaixonado por Internet, novos mercados e Economia Digital, agora Vinicius se lança no mercado editorial com a obra “Dinheiro na Multidão” –Oportunidades x Burocracia no Crowdfunding Nacional. [http://viniciuscarneiro.adv.br]. Desde dezembro até junho, foram feitos mais de 8 mil downloads da obra. [http://viniciuscarneiro.adv.br/minuto-do-crowd].

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