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29/06/2016 - 08:10

Por que os britânicos decidiram sair?


Nos últimos meses foi possível acompanhar a opinião de analistas de economia, finanças e geopolítica a respeito de uma eventual saída do Reino Unido da União Europeia. De cada dez especialistas ouvidos, nove opinavam pelas desvantagens e péssimas conseqüências que os próprios britânicos iriam sofrer em caso de saída do bloco. Por que então os britânicos decidiram sair?

Quem acompanha com interesse a história do Reino Unido não recebeu com tanta surpresa o resultado do plebiscito de 23 de junho. Há razões milenares e outras mais recentes que facilitam a compreensão desta polêmica decisão.

Desde sempre existe um palpável senso comum britânico (mais especialmente inglês) de não se sentir parte da Europa. Nos sonhos de um cidadão de Boston (a original, do extremo leste da Inglaterra, no qual o “Sair” teve 75% dos votos) não há cinco continentes, mas seis, sendo a Grã-Bretanha o mais importante deles. Ao se analisar o mapa dos resultados eleitorais, é fácil perceber que – na Inglaterra – apenas as grandes metrópoles multiculturais e internacionalizadas (Londres, Manchester e Liverpool) votaram pela permanência. O restante do país votou pela saída.

Esse sentimento nacionalista, bairrista e apaixonado não pode ser deixado de lado numa análise séria. Lembre-se que a urna é secreta, não exige fundamentação, razoabilidade, racionalidade e nem está sujeita à perseguição da imprensa.

Dentre as razões mais recentes, duas se destacam. A primeira é que a União Europeia não foi – no curto prazo e na vida prática do cidadão médio inglês – um grande benefício. A abertura das fronteiras gerou duas conseqüências negativas. A primeira foi a entrada de mão de obra especializada e qualificada proveniente de toda a Europa e a segunda foi a saída de indústrias e empresas para países nos quais a mão de obra é mais barata, levando consigo grande fonte de empregos diretos e indiretos, tributos, circulação de dinheiro, capital e bens. Para o agente do mercado de capitais londrino pode ter sido ótimo, para o operário de Horncastle, nem tanto.

A segunda razão tem nome e sobrenome: David Cameron. Para assegurar sua reeleição em 2015 e agradar ao baixo clero do seu próprio partido e partes do eleitorado do partido oposicionista, ele aceitou o compromisso de fazer o plebiscito no ano seguinte, calculando (mal) que jamais perderia. Os Republicanos nos Estados Unidos sofrem do mesmo mal: para vencer as primárias, precisam agradar os radicais de seus próprios partidos e – para isso – prometem o impossível.

Cameron colocou, enfim, nas mãos da grande população uma decisão que deveria ser tomada por um altíssimo conselho de notáveis acadêmicos e profissionais do ramo (lembre-se que no Brasil, por exemplo, nem tudo pode ser decidido pelas urnas, conforme o art. 60, parágrafo 4°, da Constituição). Cameron perdeu o plebiscito, o cargo e possivelmente a carreira política.

Foi enfim, um dia de amarga derrota. Derrota para Cameron, para a União Europeia (que se despede de um gigante aliado econômico), para dezenas de países que começam a pedir o mesmo, derrota para o Reino Unido (que antevê uma desintegração) para britânicos que vivem na Europa e europeus que vivem na Bretanha e derrota para os ideais unificadores de Mitterrand, Kohl e Delors que – com visão além de seu tempo – lançaram e semearam sementes na direção de uma Europa unida e pacífica.

. Por: Dr. Gustavo Nicolau, Advogado; Mestre e Doutor pela Faculdade de Direito da USP; Professor da Faculdade de Direito da Universidade Mackenzie e do Curso LFG. Entre os livros publicados estão “União Estável e Casamento - Diferenças Práticas”, “Medidas Provisórias: O Executivo que legisla” e “Direito Civil - Parte Geral”.

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