Página Inicial
PORTAL MÍDIA KIT BOLETIM TV FATOR BRASIL PageRank
Busca: OK
CANAIS

02/07/2016 - 08:24

O paradoxo do trabalho como construtor e desconstrutor da personalidade

Um dos maiores papas no mundo do direito do trabalho, Christophe Dejours, cientista francês que estuda o fenômeno trabalho e loucura, assinalou na última palestra que fez que no Brasil, na fundação Getúlio Vargas, que “não existe trabalho sem sofrimento”.

A tendência atual da sociedade parece ser a de negar essa realidade, pois o trabalho é sempre visto de forma positiva e é considerado como elemento integrante da construção da personalidade, influenciando diretamente o conceito da auto- estima do indivíduo.

Chega-se a se dizer que o trabalho ocupa a mesma posição do amor, no termômetro de apuração da felicidade. Ou seja, feliz é o homem que ama e é amado e que tem trabalho.

De fato, através do trabalho o homem ascende a uma condição de superioridade na vida. Hoje é considerado sinônimo de competência material e emocional, pois ele gera riqueza. E não é só. Também se destaca aquele indivíduo que sabe lidar com as pressões do trabalho sem se contaminar por sentimento de tristeza e ansiedade. Todo aquele que resiste ao sofrimento decorrente do trabalho é bem visto nesta sociedade demagoga, globalizada.

Contudo, um paradoxo se estabelece. Pois, as exigências do mundo do trabalho o transformaram sobejamente. Na sociedade atual o ambiente de trabalho está se deteriorando de tal forma, que o trabalho deixa de ser algo que gratifica e motiva, para se tornar um elemento desconstrutor da identidade.

Isso ocorre quando o trabalho deixa de ser fonte de satisfação e se torna um peso, um martírio; o que é muito comum. Nesta plataforma, o trabalho desinteressante, humilhante, penoso, não envolvente e estafante, vira palco para a doença física e mental.

O trabalho cria e potencializa a doença psiquiátrica. Adoece e leva à loucura. É importante, portanto, abrir a cortina e enfrentar de frente a realidade do trabalho, rompendo com paradigma clássico e utópico de que o trabalho é sempre palco para felicidade. É preciso usar novas lentes para enxergar a deterioração da saúde do trabalhador quando personagem de uma relação de trabalho, prestada num ambiente degradante. Bancos, escolas, hospitais, siderúrgicas e outras empresas brasileiras estão abarrotadas de trabalhadores doentes, massacrados pelas péssimas condições laborativas, que impõem metas absurdas, jornadas desumanas, pressões de todo tipo, convivência com o assédio moral e sexual, enfim; com uma série de elementos estressores.

Não há como tecer um discurso verdadeiro, sem análise da realidade. O sintoma atual do mundo do trabalho é o adoecimento do trabalhador provocado pelo próprio trabalho.

O trabalho então assume uma verdadeira dualidade. Ora traz felicidade. Ora traz doença. Por isso, fechar os olhos para essa verdade e esquecer que há uma onda crescente vertical no quantitativo de indivíduos que adoecem pelo trabalho, é quase um crime. O trabalho no Brasil é um potencial causador de doenças.

Chega de demagogia. Rompamos todos os paradigmas limitadores e tenhamos a compreensão exata que o tema suscita. O trabalho é bom, mas também é mal. Muito mal.

. Por: Maria Inês Vasconcelos,Advogada Trabalhista, especialista em direito do trabalho, professora universitária, escritora

Enviar Imprimir


© Copyright 2006 - 2024 Fator Brasil. Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Tribeira