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04/03/2008 - 14:16

Tempo de prova para economia internacional

Nas últimas semanas, a avalanche de notícias desconexas tem deixado perplexos o mercado financeiro e o investidor brasileiro. Qualquer novo indicador sobre a economia americana faz tremer os mercados. Se a notícia é boa, as bolsas disparam; se é má, as bolsas despencam. Dado a disparidade de opiniões, o investidor não consegue chegar a uma conclusão sobre o futuro próximo da economia mundial. Diante disso, todos se perguntam: os Estados Unidos entrarão em recessão? Se isto ocorrer, qual será o tamanho e a duração? Ela vai contaminar a economia mundial? Em que medida? E o Brasil, sofrerá muito? As ações na Bovespa vão despencar?

É verdade que a economia não é uma ciência exata, mas não se esperava que fosse tão inexata assim. Um pouco de racionalidade deve haver neste campo. Sem querer ser racionalista, proponho considerar alguns pontos que podem explicar um pouco o momento atual.

Durante o qüinqüênio 2002-2006, o Produto Interno Bruto (PIB) americano cresceu 14%, enquanto o da Europa e do Japão cresceram 8%. Tamanha disparidade ocorreu devido ao aumento do volume de consumo das famílias americanas, que foi possível graças ao efeito-riqueza gerado pela expansão do crédito fácil, pela redução dos impostos e pelos baixos preços dos produtos importados. Durante este período, o consumidor americano viveu no melhor dos mundos: muito gasto e pouca inflação. Como resultado desta farra, aumentaram os déficits fiscais e em conta-corrente, que chegaram a uma média anual de 3,8 % e 5,4 % do PIB ao ano.

Todo esse desequilíbrio foi financiado pelos países exportadores, que compravam títulos americanos para mantê-los em reserva. Por um lado, havia um cliente que consumia mais do que ganhava, e por outro, fornecedores que financiavam este cliente porque dependiam dele. Somente no qüinqüênio mencionado, o volume do déficit em conta-corrente americano foi de US$ 3,2 trilhões, mais do que o dobro do tamanho do PIB do Brasil. As reservas da China, principal exportador para os Estados Unidos, passaram de US$ 292 bilhões no final de 2002 para US$ 1,6 trilhões no final de 2006.

Com o aumento dos juros, que passaram de 1,25% no início de 2002 para 5,25% no final de 2006, os custos dos financiamentos subiram e a inadimplência cresceu. O aumento dos preços do petróleo e das principais commodities agrícolas e minerais colocou mais lenha na fogueira. Daí, até o estouro da bolha de crédito, foi só questão de tempo. Então, o melhor dos mundos chegou ao fim.

Agora vivemos o tempo de correção dos desequilíbrios. O dinamismo e atratividade do ambiente de negócios e os altos investimentos em inovação e produtividade nos Estados Unidos nos dá garantias que a correção chegará a bom termo, mas, dado o porte do problema, isto demanda tempo.

Parte da correção vem dos efeitos da desvalorização do dólar –encarecimento das importações e barateamento das exportações nos Estados Unidos –, leva a uma redução do déficit comercial. Outra parte vem do aumento dos investimentos estrangeiros nos Estados Unidos: queda do dólar torna muito atrativos os ativos americanos, e parte das enormes reservas acumuladas pelos países árabes e asiáticos tende a fluir para os Estados Unidos.

Durante o período em que durar o processo de correção, os mercados tendem a ficar mais sensíveis, com medo de que o processo desande. Neste período, a economia americana sofrerá forte desaquecimento, podendo, inclusive, entrar em recessão. O cenário mais provável é de crescimento próximo de zero, mais ainda positivo. Economias como a da China e da Índia, com forte mercado interno, deverão ter seu processo de crescimento reduzido em algo como dois pontos percentuais; e o Brasil também sofrerá, com recuo do seu crescimento de 5,5% em 2007 para algo em torno de 4,5% em 2008.

Para o Brasil, se tudo correr como descrito acima, pode até ser bom. Se a economia mundial continuasse acelerada, os altos preços das commodities agrícolas e minerais e a escassez interna de energia poderiam pressionar a inflação a ponto de o Banco Central precisar elevar bastante as taxas de juros. Com menor crescimento econômico mundial, o preço das commodities devem cair um pouco, ajudando a manter a inflação próximo da meta. Além disso, ganhamos tempo para que os investimentos feitos ao longo de 2007 possam maturar, ajudando a aumentar a capacidade de oferta no mercado interno.

Para os investimentos em Bolsa de Valores, a volatilidade deve continuar bastante alta ao longo de 2008. No entanto, o bom desempenho das principais empresas listadas na Bovespa pode garantir aos investidores rendimentos ainda compensadores. O processo de internacionalização de grandes empresas, como a Vale do Rio do Doce e a Gerdau; além do anúncio de aumento da produção de petróleo e gás natural pela Petrobrás, também devem contribuir para o desempenho da Bovespa.

Embora haja risco de solavancos neste período de ajuste da economia mundial, o processo será menos doloroso do que pressupõe a maioria dos gurus de crise que povoam nosso cotidiano.

. Por: Alcides Domingues Leite Júnior, professor de Mercado Financeiro da Trevisan Escola de Negócios. Email: [email protected]

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