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18/11/2016 - 09:43

Submarino nuclear: um mar de novas possiblidades para o crescimento industrial


De acordo com o contra-almirante Alan Paes Leme Arthou, o submarino é uma ótima oportunidade para o país desenvolver tecnologia e agregar valor aos seus produtos.

A construção do submarino com propulsão nuclear pode representar um ganho para a indústria brasileira e para o desenvolvimento do país. A opinião é do contra-almirante (RM1-EM) Alan Paes Leme Arthou, que conhece bem o projeto. Ele foi gerente da coordenadoria-geral do Programa de Desenvolvimento de Submarino com Propulsão Nuclear da Marinha. “O que for feito para o submarino, que exige tecnologia de ponta, certamente terá múltiplas possibilidades de uso, como já ocorreu com muita tecnologia militar. Isso pode significar um grande incremento na indústria nacional, agora é preciso que o governo faça a sua parte. Ele deve incentivar e estabelecer políticas que permitam esse crescimento”, afirma. membro da ANE, o contra-almirante Alan Paes Leme Arthou falou sobre essa grande obra da engenharia para o Boletim da Academia. Nesta entrevista, o Acadêmico fala sobre as vantagens do submarino nuclear e as possibilidades que ele representa para o país.

. Boletim ANE: Por que o Brasil deve investir em submarino?

. Alan Paes Leme Arthou — A primeira coisa que temos que analisar é se há ou não necessidade de defesa. Se fizermos uma casa, vamos fazer uma cerca ou muro para evitar que o ladrão tente assaltar; para evitar que ele tenha acesso fácil. Isso chama-se dissuasão. Um sistema de defesa, uma Marinha, por exemplo, existe para dissuasão, assim como as forças armadas. Somos um país que não quer gastar muito com defesa, mas é preciso lembrar que qualquer navio de superfície é localizado facilmente por satélite. Navios de superfície, embora tenham várias aplicações, não são tão eficientes em dissuasão quanto um submarino. Este último, ao mergulhar fica invisível, ninguém sabe onde está. Em termos de custo-benefício é a arma do pobre, da mesma forma que a guerrilha contra exércitos bem armados. O custo é baixo para o benefício.

. B/ANE: Que oportunidades o desenvolvimento de um submarino pode gerar para o país?

. Alan Paes — Ele é o único projeto nacional com potencial para ser integrador e desenvolvedor de conhecimento. O único com envolvimento de mais de 100 tecnologias diferentes, que exigem uma série de requisitos que depois, aplicados a produtos similares – mesmo que não seja para uso em um submarino- aumentam sua qualidade e competitividade no mercado externo. O lucro que o Brasil terá ao exportar ou deixar de importar equipamentos, por conseguir desenvolver tecnologia, é muito maior do que o gasto. O desenvolvimento de equipamentos nacionais para o submarino é um alavancador de tecnologia. Vamos melhorar a qualidade do nosso produto de linha.

. B/ANE: Por que a Marinha resolveu investir no submarino nuclear?

. Alan Paes — A ideia inicial de um submarino como arma de guerra apareceu na Guerra da Secessão americana onde alguém pensou em fazer um barril de madeira que afundasse e pudesse assim se aproximar do casco do navio inimigo, sem ser visto, para colocar explosivos. O fato é que se esconder sob a água facilita a ação agressiva. No Brasil, começamos a usar submarinos em 1908, com a importação de submarinos italianos. O submarino é uma arma terrível. Você nunca sabe de onde vem o tiro, é um terrorista. Então, ele é sempre temido porque pode causar muito estrago.

. B/ANE: Mas por que nuclear?

. Alan Paes — O submarino tradicional depende de bateria, quando a carga dela acaba é preciso recarregar usando o conjunto motor diesel e gerador e para isso é necessário vir próximo à superfície para admitir ar. Ao fazer isso, o submarino torna-se detectável ao radar, apesar de já existir material absorvedor de onda radar. Ele também pode ser detectado por satélite, por meio dos sistemas de infravermelho. Um submarino convencional navegando na velocidade máxima ficará sem bateria em duas horas. Se a navegação for feita a 6 nós (cerca de 11km/h), uma velocidade baixa e silenciosa, consegue passar no máximo 24 horas submerso. Depois, deverá voltar próximo à superfície e permanecer entre 7 e 10 horas, vulnerável à detecção, para recarregar as baterias. O submarino nuclear não precisa vir a superfície porque a propulsão dele usa reação nuclear que dispensa oxigênio, além disso pode andar na máxima velocidade o tempo todo (que, dependendo do submarino, pode chegar a 35 nós – quase 65km/h). A limitação do tempo de operação submerso vem da tripulação uma vez que estudos indicam que os seres humanos aguentam no máximo três meses submersos. Após esse período, o alto nível de estresse pode provocar erros operacionais.

. B/ANE: E com relação ao custo?

. Alan Paes — O nuclear é muito mais caro. Um submarino normal custa cerca de U$$ 500 milhões e o nuclear U$$ 2 bilhões, mas no nuclear há uma grande economia de combustível o que, ao longo da vida útil do meio, torna os preços equivalentes. No caso do projeto do nosso submarino nuclear, o combustível é para ser trocado a cada 8 anos; alguns submarinos americanos, por exemplo, não trocam combustível.

. B/ANE: O que temos pronto do submarino nuclear?

. Alan Paes — Só a planta de propulsão nuclear que será usada em uma instalação terrestre para teste. O Laboratório de Geração de Energia Nucleoelétrica (LABGENE), em Aramar, Iperó (SP). Fizemos o combustível e temos todo o equipamento dessa planta, agora estamos em fase de montagem. O nome anterior era reator nuclear de água pressurizada, mas como sabia que o termo nuclear sofre resistência e dificulta a obtenção de verbas, optamos por mudar o nome. Trabalhei no Ministério de Ciência e Tecnologia, e sabia que era mais fácil obter recursos para laboratórios e o LABGENE é um laboratório. Será preciso testar, medir tudo na planta propulsora, fazer melhorias no projeto antes de colocar no submarino. Quase todo o conhecimento desse laboratório pode ser usado na indústria nuclear civil.

. B/ANE: Ainda há muita resistência ao termo nuclear?

. Alan Paes — Sim. Logo após a explosão da bomba atômica, os Estados Unidos ficaram maravilhados com o que a energia nuclear podia fazer. Ela não solta fumaça, não solta CO2, é uma energia limpa. Os resíduos são muito reduzidos se comparados com outras formas de geração térmica. Diante desse cenário, fizeram uma série de propagandas mostrando como seria um mundo só com energia nuclear e criaram o programa “Átomos para a Paz” onde ensinavam diversos países a pesquisar e a desenvolver reatores. O Argonauta, reator da UFRJ, foi doado pelos EUA por esse programa, assim como o reator IEA-R1 do IPEN (Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares), em SP. Tenho um filme da Disney falando sobre os benefícios da área nuclear. O que mudou esse quadro foi o fato da Índia ter montado um reator que possibilitava tirar plutônio com muita facilidade e ter construído a bomba de plutônio, que explodiu em 1972. Todos acenderam o alerta, já que qualquer país poderia fazer uma bomba. Decidiram então parar o programa “Átomos pela Paz” e encerrar o estímulo ao desenvolvimento de tecnologia. Hoje, para conseguir qualquer informação é preciso assinar o tratado de não proliferação nuclear. No final dos anos 70, lançaram o filme “A síndrome da China” - a história de um acidente em uma usina nuclear. A partir daí, a propaganda negativa passou a ser maciça, mas os EUA não abandonam a energia nuclear. Eles têm 109 reatores. A França, em termos percentuais, é o país que mais usa energia nuclear. O perigo existe, como ocorre em vários outros modelos de geração de energia. Uma usina nuclear é a prova de terremoto e tem várias contenções para evitar vazamentos, mas se vazar, o que acontece é que as pessoas expostas aumentarão a possiblidade de desenvolver câncer no futuro, mas não é certo e nem imediato, é futuro. Mas há um cuidado muito grande em tudo o que envolve a energia nuclear. Ela é, aliás, a desenvolvedora de análise de risco. Todas as possiblidades de falhas são pensadas.

. B/ANE: Que oportunidades o Sr. acredita que o desenvolvimento do submarino nuclear vai gerar para o desenvolvimento tecnológico e para a economia brasileira?

. Alan Paes — Diria mais. O sistema é tão complexo que vai permitir melhoras também na área de gerenciamento; de como melhorar o controle e a garantia de qualidade. Nesses aspectos, a área nuclear dá banho e está muito à frente. Na área nuclear tudo é normatizado e todos os efeitos que podem acontecer são estudados. Não é o simples fato de estarmos fazendo o submarino que fará com que a indústria nacional se desenvolva. Precisamos de um programa específico, com a participação da indústria, para fazer isso acontecer. O submarino pode ser usado como elemento alavancador de tecnologia, mas o governo precisa participar desse processo. Ele deve ter ciência que eventualmente vai pagar mais caro por uma peça produzida aqui, mas a questão não é o custo em si, e sim o incentivo ao desenvolvimento e ao crescimento do país. Importar pode ser mais barato, mas nem sempre é o melhor caminho. A Lei Nº 8.666/93 obriga o gestor a comprar pelo menor preço. Quando temos uma concorrência de produtos nacionais é preciso considerar outros aspectos, além do custo. Quando compramos fora o dinheiro vai para o exterior e pronto acabou. Quando compramos aqui, a indústria paga o funcionário, que recebe o seu salário e paga suas contas e cada vez que o dinheiro passa de mão, o governo retém cerca de 30% via impostos, ou seja, recupera parte do que investiu. É preciso pensar nisso na hora da compra. O submarino nuclear é uma ótima possibilidade para desenvolvermos tecnologia e agregarmos valor a nossos produtos. O que for feito para o submarino, que exige tecnologia de ponta, certamente terá múltiplas possibilidades de uso, como já ocorreu com muita tecnologia militar. Isso pode significar um grande incremento na indústria nacional, agora é preciso que o governo faça a sua parte.

. B/ANE: O que foi desenvolvido pela engenharia nacional para o submarino nuclear?

. Alan Paes — No momento estamos em fase de projeto e conversações com empresas nacionais, ainda não existe nada de concreto. Apenas os submarinos convencionais tiveram um programa de nacionalização muito intenso e muitos desses equipamentos nacionalizados servirão de base para os equipamentos do submarino nuclear.

. B/ANE: Qual foi o desafio de nossa engenharia nesse projeto?

. Alan Paes — Na área gerencial, o maior desafio foi a complexidade do projeto. Gerenciar uma quantidade muito grande de sistemas e equipamentos, em um espaço restrito e garantir que o peso final e a posição do centro de gravidade serão iguais ao planejado. Do ponto de vista técnico isso também é um desafio, mas projetar e construir um reator nuclear e seu combustível que opere em condições seguras, mesmo sob várias condições de aceleração, é o maior obstáculo para qualquer país que almeje ter um submarino nuclear. Além disso, vários sistemas de bordo são novidades, o que os torna desafios a serem vencidos. | Por: Andréa Antunes.

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