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21/02/2017 - 08:18

Alterações na autonomia dos partidos e os impactos na política brasileira

O Plenário da Câmara dos Deputados aprovou recentemente o regime de urgência para o Projeto de Lei 4424/16, que revoga o direito do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de expedir instruções para a execução da Lei dos Partidos Políticos (Lei 9.096/95) e busca garantir mais autonomia às legendas partidárias.

Muito tem se falado sobre o projeto, de autoria do deputado Maurício Quintella Lessa (PR-AL), hoje ocupante da cadeira de ministro dos Transportes. As críticas à aprovação do regime de urgência foram severas, ferrenhas, as palavras de reprovação foram contundentes, as reportagens veiculadas na mídia nacional deram uma conotação de que a proposição será uma mutilação das competências do TSE e uma autonomia absoluta dos partidos políticos, o que não procede.

O texto do projeto prevê a alteração dos artigos 3º, 10, 14, 15, 32 e revoga o artigo 61 da Lei nº 9.096/95, (Lei dos Partidos Políticos), que entre os pontos mais cruciais versam sobre as prestações de contas, organização das agremiações no âmbito estadual e municipal, constituição de seus órgãos de direção, definitivos ou provisórios e, os nomes dos respectivos integrantes. Por fim, estabelece a revogação do artigo 61, de seguinte redação: “O Tribunal Superior Eleitoral expedirá instruções para a fiel execução desta Lei”.

As críticas ventiladas são fruto dos progressivos desgastes dos partidos, ora vivenciados pela instabilidade política e jurídica do país, destacadamente pelos erros e incompatibilidades entre a pauta das ruas e a pauta que hoje conduz o Parlamento. A consequência deste antagonismo é a insatisfação e a impaciência com temas relacionados à política partidária, como no presente caso, em que as críticas foram rápidas e nada piedosas.

Entretanto, há que se enxergar o outro lado do horizonte desta matéria, que são as garantias asseguradas constitucionalmente aos partidos políticos, que teórica e institucionalmente são entes jurídicos de sustentação da democracia.

Em sua justificativa o, então deputado, autor da proposição assim escreveu: O Plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) aprovou, por unanimidade, na sessão administrativa realizada no dia 17 de dezembro de 2015, a Resolução Administrativa nº 23.465/2015, que disciplina a criação, organização, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos.

Com a aprovação da citada Resolução a Justiça Eleitoral promoveu diversas alterações no funcionamento dos entes partidários o que interfere de forma direta na autonomia constitucional concedida aos partidos políticos pelo legislador constitucional conforme previsto no artigo 17 da Carta Magna.

Além de criar regras não contempladas no ordenamento jurídico vigente a Resolução criou ainda sanções aos órgãos partidários até então inexistentes numa clara usurpação do poder de legislar que compete ao Congresso Nacional.

[…] No que se refere à usurpação de competência perpetrada pela Corte Superior Eleitoral, os mecanismos de garantia de coexistência harmônica e independente, bem como os meios para coibir tal prática, estão inequivocamente estampados na Constituição Federal, a saber:

‘Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.’

Na espécie têm-se que além de inovar em diversos aspectos a famigerada Resolução do TSE ‘legislou’ em duas searas totalmente reprováveis:

1) Criou a obrigatoriedade de que os partidos políticos tenham órgãos definitivos em todas as suas esferas, excluindo a possibilidade das agremiações, com base em sua autonomia constitucional e no interesse partidário, de ter órgãos provisórios com vigência indeterminada; e

2) Criou a sanção de “suspensão do registro de órgão partidário” quando o mesmo tiver contas julgadas como não prestadas.

Inegavelmente, entendo, houve excesso na Resolução do TSE que avançou na linha de sua competência e estabeleceu limitações e sanções que destoam daquilo que a Constituição Federal assegura no seu artigo 17, no qual prevê que é “...livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos...” e que “...é assegurada aos partidos políticos autonomia para definir sua estrutura interna, organização e funcionamento...”.

Diz mais a Constituição Federal que “...os partidos políticos têm direito a recursos do fundo partidário e acesso gratuito ao rádio e à televisão, na forma da lei. ”

Outra crítica a se fazer, que será melhor compreendida por quem é dirigente partidário ou milita nesta área, são os excessos de formalismos nas Resoluções do TSE que versam sobre prestações de contas, incluindo detalhamentos e filigranas que tornam quase impossível a aprovação das contas prestadas pelos Partidos, submetidas ainda a interpretações mais rígidas e engessadoras do que já são tais resoluções.

Com todo este arcabouço de resoluções que tornam as prestações de contas partidárias uma jornada de perfeição inalcançável, gera-se aos Partidos a perda do direito de recebimento de recursos do Fundo Partidário, o que é praticamente uma pena capital para muitas agremiações que dependem deste amparo.

E mais, ao adentrar no modo de organização partidária no âmbito estadual e municipal, para obrigar os Partidos a terem diretórios estáveis e não comissões provisórias por prazo indeterminado, o TSE igualmente atentou contra o §1º do artigo 17 da Constituição Federal, que não apenas prevê uma autonomia, mas assegura esta autonomia organizacional partidária.

É certo que a política partidária brasileira precisa de revisão. Principalmente para mudar o cenário de inumeráveis partidos sem identidade alguma, compostos para meros arranjos eleitorais, firmando-se normas rígidas para criação e cláusulas de barreira restritivas para manutenção de partidos. Entretanto, não é mitigando e subjugando as agremiações partidárias que teremos uma melhoria na democracia, pelo contrário.

Encerrando, não podemos confundir a relevância dos partidos políticos com a desgastada classe representativa atual, nem postular pelo fim dos partidos políticos. Devemos, sim, buscar uma reforma política que aproxime o eleitor de seu representante e que preveja a permanência ativa apenas de partidos políticos com identidade e estrutura clara e singular.

. Por: Marcones Santos, advogado de Direito Eleitoral e sócio do escritório Lopes, Leite & Santos Advogados Associados.

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