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04/08/2017 - 06:01

Yes, nós temos florestas!

A agenda nacional de meio ambiente vem sendo corroída por seguidos cortes de verbas, manobras legais pró-desmatamento e, pior de tudo, negligência sobre os interesses estratégicos do país frente ao Acordo do Clima. Apesar do cenário conturbado, estudos mostram que o Brasil poderá, a partir de 2020, quando o Acordo entrar em prática, agregar uma nova e lucrativa commodity ao portfólio nacional: os créditos de carbono florestais.

Modelagem do Environmental Defense Fund (EDF), baseada em estimativas de preços futuros do carbono, avalia que a redução do desmatamento pode render benefícios líquidos da ordem de US$ 70 bilhões até 2030, suficientes para cobrir com folga os US$ 26 bilhões também orçados pelo EDF para o Brasil cumprir o Acordo do Clima. Uma das importantes fontes de receita dessa equação é o REDD+ (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal), mecanismo que segue padrões e metodologias reconhecidos e auditáveis para remunerar a redução do desmatamento. Ao mesmo tempo, ele fomenta a economia florestal sustentável, ao promover o desenvolvimento socioeconômico das comunidades que atuam como guardiãs da floresta.

Em novembro próximo, na 23ª COP do Clima, em Bonn, Alemanha, voltarão a se reunir os signatários do Acordo celebrado em Paris. Agora, com o objetivo de encaminhar as normas que embasarão as políticas públicas climáticas e os projetos de mitigação passíveis de financiamento internacional. Um dos desafios do Brasil é sair do isolamento em que se colocou ao rejeitar o REDD+ como um dos instrumentos elegíveis à condição de Mecanismo de Desenvolvimento Sustentável (MDS).

O assunto é regulado pelo artigo 6 do Acordo, que estabelece as iniciativas classificáveis como MDS e, portanto, geradoras de créditos de emissões comercializáveis (os chamados offsets, que permitem compensar remotamente parte das emissões de um país). Em Paris, o Brasil havia assumido que o REDD+ já estava regulado pelo Artigo 5 e relacionava-se apenas aos incentivos positivos e não às atividades de mitigação. Hoje, o maior operador nacional de REDD+ é o Fundo Amazônia, que, no entanto, captou apenas 6% do crédito gerado entre 2006 e 2014. Nesse período, a redução do desmatamento na Amazônia evitou a emissão de 5 bilhões de toneladas de carbono para a atmosfera e deixamos de arrecadar 94% do valor dos créditos a que o Brasil teria direito por esse feito.

Noruega e Alemanha têm sido os principais doadores do Fundo e estão longe de concordar com a posição brasileira de exclusão do REDD+ do MDS. A primeira já se declarou a favor, junto com Coreia, Suíça, México, Congo, Camarões, Tunísia, Etiópia, dentre outros. A Alemanha manteve a posição em aberto, do mesmo modo que África do Sul, Costa Rica, Austrália, Equador, Singapura e Nova Zelândia. Outros, como Japão, Rússia, Indonésia e o bloco caribenho, não trataram do tema. Na contramão da inclusão, apenas Brasil e Bolívia.

Há preocupações legítimas em relação ao REDD +, como o efeito depreciativo que uma grande quantidade de créditos florestais poderia desencadear no mercado de carbono. Mas é possível administrar esse efeito por meio de regulações adequadas do acesso a esses créditos. Já o argumento brasileiro de ameaça à soberania nacional não é compartilhado por outros países em desenvolvimento, que preferem ampliar suas opções voluntárias. Mais real do que qualquer risco à soberania é o perigo de ter a maior floresta tropical do mundo perdida pelo desmatamento.

Talvez, o Brasil pretenda contar com o excedente do REDD+ para fechar a conta da redução de emissões em 2020, caso setores como energia e transportes não atinjam suas metas. Isso ajudaria a explicar a negativa ao uso do potencial do REDD+. Porém, rejeitá-lo nas negociações de implementação do Acordo de Paris é privar o país dessa fonte concreta de financiamento para o fortalecimento da economia florestal e do desenvolvimento sustentável. REDD+ é reconhecidamente um bom negócio e o Brasil já tem experiências que comprovam esse fato. Cabe aos nossos negociadores promover as condições para que o país participe do promissor mercado em formação e essa é uma agenda que não pode ficar na gangorra dos acontecimentos políticos.

. Por: Pedro Soares, gerente do Programa de Mudanças Climáticas e REDD+ do Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (Idesam) e Paula Bernasconi atua na iniciativa de Incentivos Econômicos do Instituto Centro de Vida (ICV).

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