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Os cartórios e o ISS no Município de São Paulo

Nos últimos meses, vem crescendo na cidade de São Paulo o número de ações judiciais em que se sustenta que os tabeliães e oficiais de registro público, ou seja, os titulares dos cartórios extrajudiciais espalhados pela cidade, estariam livres da cobrança do Imposto Sobre Serviços (ISS), instituído pelo Município sobre os serviços notariais e de registros públicos.

A principal alegação dos notários e registradores é de que os serviços que prestam são públicos, eis que delegados pelo próprio Estado, razão pela qual seriam remunerados por tributo (os chamados “emolumentos”, que teriam a natureza jurídica de taxa), incidindo, então, a chamada “imunidade tributária recíproca”, uma vedação posta pela norma inscrita no art. 150, VI, a da Constituição Federal, que proíbe que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituam impostos sobre o patrimônio, a renda ou os serviços uns dos outros.

O Município de São Paulo, nesse cenário, estaria incidindo em comportamento inconstitucional, ao gravar com o ISS serviços pertencentes ao Estado de São Paulo.

A questão, contudo, parece-nos merecer alguns temperamentos.

Com efeito, as serventias extrajudiciais são instituídas pelo Poder Público para o desempenho de funções técnico-administrativas, destinadas a “garantir a publicidade, a autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos” (Lei 8.935/94, art. 1°). São órgãos que sem dúvida exercem parcela da autoridade estatal (do poder certificante), desempenhando função eminentemente pública.

Contudo, não obstante se reconheça a oficialidade de que se revestem as funções notariais e de registro público, não se pode olvidar que, segundo texto expresso da Constituição da República, “os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público” (art. 236, caput). Assim, os notários e registradores, enquanto delegados de função pública, nada mais são que particulares em colaboração com a Administração, isto é, particulares alheios à intimidade do aparelho estatal que praticam atividades próprias do Poder Público, delas se desincumbindo sob regime próprio, privado, desvinculado do regime a que se submetem os serviços públicos prestados diretamente pelo Estado, por seus próprios servidores.

Os titulares de serventias extrajudiciais, portanto, conquanto exprimam manifestação estatal em seu ofício, são estranhos ao conceito de funcionário ou de servidor público, posto que, por expressa determinação constitucional, conservam sua qualidade de particulares.

Nesse passo, o que vem sendo tributado pelo Município de São Paulo por meio do ISS são serviços prestados em regime de direito privado e remunerados pelo Estado sob a forma de repasses aos particulares que os prestam – os cartorários. Estes, mesmo exercendo função pública delegada, não perdem, por expressa imposição constitucional, sua condição de particulares, circunstância que afasta a invocada imunidade tributária recíproca, que só protege os serviços públicos prestados diretamente pelo Estado, por seus servidores, não alcançando aqueles que, públicos na essência, são cometidos a particulares para que os prestem em caráter privado, da mesma forma que todos os outros serviços públicos concedidos, permitidos ou delegados.

Impende registrar, neste ponto, que os notários e registradores foram submetidos, na Cidade de São Paulo, a regime especial de recolhimento do ISS, em que se toma em consideração, ao invés do total efetivamente faturado, uma receita bruta previamente estimada pela lei (Lei Municipal 13.701/03, art. 15, I, a), tendo em vista serem variáveis os repasses feitos pelo Estado como remuneração do serviço prestado pelos cartorários.

Assim, a “mordida” do Fisco Municipal no bolso dos notários e registradores, em valores atualizados para outubro de 2006, é de exatos R$ 45,48 (resultado da alíquota do ISS de 5% incidente sobre a base de cálculo atualizada, de R$ 909,77), não obstante se saiba que há cartórios na cidade que recebem repasses de dezenas de milhares de reais.

Fosse alterada a legislação municipal para que se considerasse como base de cálculo do ISS incidente na espécie o valor exato do repasse feito pelo Estado a cada mês para o cartorário, talvez se tornasse mais justa a tributação na cidade, evitando-se que aqueles que recebem fortunas pelos serviços que prestam paguem um imposto meramente simbólico.

Diante desse quadro, não resta dúvida de que alguma coisa está errada com a tributação dos notários e registradores. Mas não nos parece que a injustiça esteja sendo cometida contra eles.

. Paulo Marcos Rodrigues de Almeida, 27, Procurador do Município de São Paulo e membro do Instituto Brasileiro de Advocacia Pública

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