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05/04/2018 - 06:46

“Não posso me afastar da clareza do texto constitucional”


Senhores o título do texto diz tudo! Vamos rasgar ou não a constituição e jogarmos na latrina um dos mais caros direitos fundamentais que é a liberdade de locomoção. O título do texto é extraído do lapidar voto da Ministra Rosa Weber quando do julgamento das liminares nas Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADCs) 43 e 44. Sua Excelência irá manter esse entendimento, eis a questão?

Nesta quarta (4), o Supremo Tribunal Federal, pela sua composição plena, decidirá o Habeas Corpus impetrado em favor do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Não vou discutir aqui a extensão direta da decisão. Não importa aqui se o presidente será preso ou não. Ou se é culpado ou não.

O que se quer discutir é a possibilidade de alguém ser preso após condenação em segunda instância. Melhor dizendo, antes do trânsito em julgado, isto é, com esgotamento das vias recursais ordinárias e extraordinária.

O texto constitucional expressamente aponta que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória" (art. 5º, LVII). O dispositivo constitucional é claríssimo, ninguém sai da condição de acusado para condenado sem que a haja sentença penal condenatória transitada em julgado. O Ministro Ricardo Lewandowski assevera com brilhantismo que “Não vejo como fazer uma interpretação contrária a esse dispositivo tão taxativo”.

Não se pode perder de vista que esta garantia constitucional de só perder do estado de inocência com o esgotamento dos recursos conflita, aparentemente, com a pretensão punitiva do estado. Nesta tensão constitucional, não há menor dúvida que deve ser sopesada caso a caso. O que não pode é sobrepujar, como pretende o Ministro Roberto Barroso, a pretensão punitiva ao status libertatis pura e simplesmente com a condenação em segunda instância.

Quando do julgamento realizado no dia 17 de fevereiro de 2016, o Supremo Tribunal Federal, por seu Plenário, ao julgar o Habeas Corpus 126.292/SP, relatado pelo ministro Teori Zavascki, por maioria de votos, considerou que é possível dar início à execução da pena após à confirmação da sentença condenatória em segundo grau. Uma aberração para dizer o menos!

A fundamentação para tamanha teratologia consistia no fato de que a condenação em segunda instância encerraria a análise de fatos e provas que assentaram a culpa do condenado, o que autoriza o início da execução da pena, ainda que provisoriamente. É uma interpretação pueril, pois as Cortes Superiores podem rever penas ilegalmente aplicadas, afastar provas ilegais, para tanto analisam, sem sobra de dúvidas, os fatos. O que não podem é revolver as provas ou fazer novas instruções. Assim, poderiam manterem presos pessoas inocentes. Cumpre destacar que 30% (trinta por cento) das condenações são revertidas no Superior Tribunal de Justiça, quer com a mudança de regime, quer com a redução da pena, quer ainda com a absolvição como ocorreu no RHC nº 61.367 – RJ, Relator MINISTRO REYNALDO SOARES DA FONSECA, julgado em 27 de fevereiro de 2018, oportunidade que o C. STJ: “Acontece que, para fins penais, as Turmas que compõem a Terceira Seção desta Corte Superior, na esteira também de orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento o Habeas Corpus n. 125.218/RS, não admitem que os dados sigilosos obtidos diretamente pela Secretaria da Receita Federal do Brasil sejam por ela repassados ao Ministério Público ou à autoridade policial, para uso em ação penal, pois não precedida de autorização judicial a sua obtenção, o que viola o princípio constitucional da reserva de jurisdição.”

Torna-se evidente que as Cortes Superiores podem, via recursal, modificar o destino de um ser humano. Não podemos agir no afã midiático, pois inúmeras injustiças são cometidas assim.

No mesmo sentido, segundo o mestre Gustavo Badaró há que ser feita as seguintes indagações aqueles que defendem a esdrúxula possibilidade de início de cumprimento de pena com a condenação em segunda instância: “seria da essência da presunção de inocência que tal estado do acusado vigore temporalmente até que a condenação transite em julgado?” Inequivocamente a resposta é não.

Por derradeiro, não se poderia olvidar da magnífica lição do Decano CELSO DE MELLO. Sua Excelência, com a clareza e ponderação que caminharam junto a ele durante sua longe e irretocável história na magistratura nacional, enfaticamente, defende a incompatibilidade da execução provisória da pena com o direito fundamental do réu de ser presumido inocente conforme expressamente garante a Constituição da República Federal. Segundo o Ministro, a presunção de inocência é conquista histórica dos cidadãos na luta contra a opressão do Estado e tem prevalecido ao longo da história nas sociedades civilizadas como valor fundamental e exigência básica de respeito à dignidade da pessoa humana.

Os Nobres Ministros, na missão que Vossas Excelências que tem em suas mãos, devem se apartar das inflexões midiáticas e das pressões da magistratura e do ministério público, que abandonaram seus misteres para lutar contra o texto constitucional, e se pautar na mens contitucionalis, a qual buscou com o artigo 5º, inciso LVII, conforme lição de Badaró “dar efetividade máxima ao compromisso do Estado brasileiro com a preservação da dignidade da pessoa humana, reforçou entre nós a garantia da presunção de inocência: estabeleceu como marco temporal final de sua aplicação o momento derradeiro da persecução penal. O acusado tem o direito de que se presuma a sua inocência “até o trânsito em julgado” da sentença penal condenatória”.

Não poderia deixar de finalizar com a declaração da Ministra Rosa Weber, que categoricamente afirmou em outra oportunidade que “Não posso me afastar da clareza do texto constitucional”. Senhores Ministros! pensar e dizer o contrário é rasgar o direito fundamental à presunção de inocência e ferir de morte a Constituição da República. O destino do Estado Democrático de Direito está nas mãos dos integrantes da Corte Máxima do país.

. Por: Marcelo Gurjão Silveira Aith, especialista em Direito Público e Criminal.

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