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07/06/2018 - 08:18

Fernando Valente Pimentel — O manto da Padroeira


Fernando Valente Pimentel épresidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit)

É interessante observar como a Seleção Brasileira, que busca o hexa nos gramados russos em 2018, tem uma relação holística e transcendental com o seu uniforme, para o bem ou o mal. Há episódios antológicos, nos quais ele, como se fosse mais um jogador, ganha forte identidade como protagonista ou vilão.

Uma dessas passagens ocorreu há 68 anos, na chamada "tragédia do Maracanã", quando perdemos, de virada, a final da Copa do Mundo de 1950 para os uruguaios. Poucos se lembram, mas o goleiro Barbosa não foi o único responsabilizado pela derrota por parte da imprensa e a opinião pública. A camisa branca com golas azuis também foi sumariamente condenada, sob a acusação de que não era "suficientemente nacionalista". Expressando tal sentimento da torcida, o jornal carioca Correio da Manhã publicou editorial criticando-a pela "falta de simbolismo moral e psicológico".

Oito anos depois da frustração pela perda do título no Rio de Janeiro, nossa seleção, já com a tradicional indumentária canarinho, ganhou sua primeira Copa do Mundo, na Suécia, em 1958. O traje da finalíssima, embora improvisado, foi um dos protagonistas da vitória: alguns dias antes da partida, houve um sorteio para decidir a cor da camisa dos times, pois os adversários suecos, donos da casa, também vestiam amarelo. Perdemos. Por isso, foi necessário comprar às pressas um lote de camisetas azuis para a decisão.

A mudança parecia afetar os jogadores. Percebendo o risco dessa reação emocional, o chefe da delegação, Dr. Paulo Machado de Carvalho, o Marechal da Vitória, reuniu o elenco antes do jogo e enfatizou: "Eu quis que vocês jogassem de azul porque é a cor do manto de Nossa Senhora Aparecida, que está conosco". O resultado todos conhecem! Sob as bênçãos da Padroeira, a seleção passeou no gramado do Estádio Rasunda, na cidade de Solna, batendo a Suécia por cinco a dois. Foram dois de Pelé, dois de Vavá e um de Zagalo. Desde então, o azul foi oficializado como segundo uniforme da seleção.

Transcorridos 60 anos da histórica conquista e às vésperas de tentarmos ganhar o sexto título mundial, é importante entender que, mais do que nunca, o uniforme tem significativos efeitos no desempenho da seleção. Aliás, não apenas da nossa, mas de todas as que estarão participando da Copa da Rússia, assim como da grande maioria dos times de futebol profissional e demais esportes. Agora, a influência não tem mais fatores emocionais, psicológicos, ufanistas, supersticiosos ou religiosos. Estamos falando de tecnologia!

O notável avanço dos equipamentos industriais, materiais, fios, fibras, tecidos e confecção resultaram em trajes de competição que reduzem a resistência do ar e da água nas disputas do atletismo e da natação e nos jogos de futebol, basquete, vôlei e outras modalidades. São mais leves, não retêm o suor, não irritam a pele, garantem plena ventilação, aumentam a microcirculação sanguínea, retardam a fadiga muscular e aceleram sua recuperação, podendo até mesmo monitorar eletronicamente a performance.

Exemplo dessa evolução é o uniforme do futebol. Até o início dos anos 80, o material utilizado retia o suor. Um jogador perde de dois a três quilos durante o jogo. Metade disso ficava na camisa. Aí, veio outro tipo de fibra, utilizado pela primeira vez pela Seleção Brasileira na Copa do México, em 1986. Porém, o suor permanecia retido, agregando peso de 10 gramas e esfriando o corpo do atleta. A partir dos anos 90, como consta no blog "Imortais do Futebol", surgiram novos materiais, fibras e tecnologias de acabamento e fabricação. Tecidos inteligentes absorvem o suor e propiciam rápida evaporação. Hoje, 20 anos depois do primeiro modelo desse tipo de camisa, a atual é 13% mais leve e tem passagem de ar 7% mais efetiva.

A melhor notícia é que esses avanços também beneficiam os consumidores, pois são aplicados na produção regular do vestuário. Entretanto, os uniformes que estarão vestindo as seleções na Rússia, assim como as roupas de nosso dia a dia, não chegaram ao limite da evolução tecnológica. Vem aí a Manufatura Avançada, na qual o setor têxtil e de confecção tem sido um dos pioneiros no Brasil.

Por outro lado, já é tempo, em plena era do conhecimento e da informação, de fazer justiça, inocentando o goleiro Barbosa e a camisa branca, que obviamente não podem ser condenados pela derrota de 1950. Pertinente, também, reafirmar a fé na Padroeira, que, na alma pluralista dos brasileiros, transcende à tecnologia e a todos os ritos e crenças!

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