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07/08/2018 - 08:38

Bioacessibilidade, você sabe o que é isso?

O mundo globalizado, a internet e suas ferramentas digitais (facebook, whattsapp, google, etc.) facilitam nossa comunicação, ao mesmo tempo em que inundam nossas vidas com informações diversas a respeito de alimentação, saúde, educação, lazer, dentre outras. Nesse universo de conhecimento, alimentação é um dos tópicos mais procurados, principalmente com relação ao consumo de alimentos seguros e que tragam maiores benefícios à saúde humana. Dentro desse contexto, muitas são as recomendações: “comam produtos lácteos para ingestão de cálcio, importante nutriente para manutenção dos ossos e prevenção da osteoporose”; “peixes são fonte de minerais, proteína e gordura boa, e fazem bem ao coração”.

Mas será que de fato, tudo o que comemos é absorvido pelo nosso organismo? E em quais proporções? Alimentos de origem vegetal e animal representam boas fontes de quais nutrientes? E ainda, existem riscos relacionados à ingestão de alimentos contendo resíduos de agrotóxicos e de outros produtos nocivos?

Até há pouco tempo atrás, estudos clínicos avaliavam essas questões acompanhando cobaias e voluntários em sua dieta diária e analisando os alimentos, cabelos e sangue, além de suas secreções e excreções. No entanto, hoje, existem ferramentas inovadoras usadas em laboratório (chamadas de técnicas in vitro) que nos dão essas respostas em curto espaço de tempo, com baixo custo e sem uso de animais ou seres humanos. Podemos citar: a cultura de células e tecidos, os sistemas in vitro, modelos matemáticos e, mais recentemente, a bioacessibilidade.

A bioacessibilidade corresponde à fração de um composto libertada a partir do alimento durante sua digestão gastrointestinal, tornando-se disponível para absorção pelo organismo humano, ou seja, o que pode ser aproveitado em termos de nutrientes ou contaminante a partir do alimento que comemos. Ela é determinada em laboratório a partir de uma simulação da digestão humana. Uma porção do alimento proporcional à sua quantidade ingerida em uma refeição normal é submetida à digestão na boca, durante cinco minutos, seguindo-se pelas digestões gástrica e intestinal, cada uma com duração de 2 horas. Cada etapa digestória é composta por sucos gastrointestinais, elaborados com sais minerais, compostos e enzimas orgânicas, similares às condições fisiológicas encontradas no nosso organismo. Ao final desse processo de digestão, obtém-se uma porção bioacessível (onde estarão os nutrientes e possíveis contaminantes disponíveis para absorção humana) e uma porção não-bioacessível, correspondente à excreção. Esse método permite que um número relativamente elevado de amostras sejam analisadas em paralelo, com reprodutibilidade, possibilidade de assegurar condições controladas e fácil amostragem.

Embora amplamente utilizadas no mundo e aceitas pela comunidade científica, as pesquisas com bioacessibilidade no Brasil ainda estão iniciando. Trabalhos determinaram que apenas 1 a 5% dos carotenoides (substâncias antioxidantes) em batata doce e 10 a 15% em cenouras são bioacessíveis. Para a mandioca cozida, apenas 5% do betacaroteno é bioacessível, enquanto que a mandioca frita apresenta 25% de bioacessibilidade para o mesmo composto. Outro estudo conduzido com o feijão-caupi apresentou 36 a 52% de bioacessibilidade para o zinco e 2 a 34% para o ferro, dependendo do tipo de cultivar e do tratamento térmico aplicado ao feijão (cozido em panela de pressão ou panela comum).

Isso quer dizer que nossa digestão é mais eficiente ou não segundo o tratamento culinário aplicado aos alimentos. Para produtos cárneos isso é igualmente bem evidente. Os minerais cálcio, ferro, zinco e cobre têm maior bioacessibilidade (pelo menos 50% maior) na carne cozida do que in natura ou crua. O ferro apresenta maior bioacessibilidade em fígado cru (93%) comparado ao fígado grelhado (43%), sendo bioacessível também no feijão cozido (39%), brócolis cozido (38%), açaí (32%), e espinafre cru ou cozido (17%). O cálcio é importante na formação de ossos e dentes, manutenção do tecido ósseo, regulação da pressão arterial, coagulação do sangue, contração muscular, secreção hormonal e formação de enzimas. O ferro faz parte da composição da hemoglobina e participa do transporte de oxigênio no organismo. O zinco participa do crescimento e desenvolvimento sexual, produção de insulina, faz parte do sistema imune e contribui para ação antioxidante do corpo. O cobre está relacionado à formação da hemoglobina e influencia no metabolismo do ferro (reduz ou eleva sua absorção).

Muito ainda precisa ser pesquisado nessa área, para que possamos mapear os alimentos segundo a bioacessibilidade de seus compostos ou nutrientes, avaliando-se o efeito do tratamento culinário aplicado. A Embrapa abraçou essa ideia e está investindo na formação de pessoal qualificado e infraestrutura para pesquisas com bioacessibilidade em alimentos. Recentemente desenvolveu o projeto “Riscos e benefícios associados ao consumo do pescado: desenvolvimento de ferramentas para determinação dos principais nutrientes e contaminantes e avaliação de sua bioacessibilidade” em uma parceria internacional com o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA/Portugal), referência em bioacessibilidade em pescado. O projeto determinou, dentre seus resultados preliminares, que: 1) apesar dos moluscos bivalves como o marisco serem organismos bioacumuladores de minerais, apresentam bioacessibilidade de elementos como cálcio e potássio quase nula; 2) a bioacessibilidade do ferro em pescado é menor que 20%; 3) a bioacessibilidade do selênio em macroalgas marinhas é quase nula; 4) a bioacessibilidade de elementos tóxicos como o arsênio e mercúrio é maior em peixes quando comparada a moluscos, crustáceos e algas; 5) a bioacessibilidade do chumbo é maior em camarões marinhos; 6) devido a bioacessibilidade do selênio estar em média entre 40 a 60%, há necessidade de ingestão de maiores quantidades de pescado (em torno de 35% mais) para suprir a exigência diária recomendada pelos nutricionistas.

Diversas enzimas celulares são afetadas pelo arsênio, que em altas doses pode causar a morte por dano à respiração celular. Seu acúmulo no organismo pode causar doenças de pele, cardiovasculares e distúrbios do sistema vascular periférico, a médio e longo prazo. O mercúrio pode causar fraqueza muscular generalizada, fadiga, dor de cabeça, irritabilidade e dificuldade de concentração, e em casos graves causa tremores, espasmos, coma e até mesmo a morte. O chumbo quando inalado, é absorvido ao longo do trato respiratório e gastrointestinal, provocando perda de apetite, constipação, anemia, palidez, mal-estar, fraqueza, insônia, dores de cabeça, irritabilidade, neuropatia periférica em adultos, encefalopatia em crianças, dores musculares e articulares, tremores finos, cólica, pressão arterial elevada, problemas renais e câncer em adultos.

Todas essas descobertas trazem novas formas de observar nossa alimentação, para que possamos escolher os alimentos que estarão em nosso prato, e por consequência, nos ajudarão a manter um organismo saudável. Por isso, fique de olho nessas e em outras pesquisas relacionadas à bioacessibilidade em alimentos.

. Por: Fabiola H. S. Fogaça, Pesquisadora Embrapa Agroindústria de Alimentos

. Por: António Marques, Investigador IPMA. | www.embrapa.br e, Redes Sociais.

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