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18/04/2008 - 10:58

Dante D'Aquino

Em outubro de 1988, o poder constituinte originário, representado pela Assembléia Nacional Constituinte, promulgou -- para organizar e limitar o Estado brasileiro -- uma Constituição Dirigente. Mas o que vem a ser, exatamente, esta característica que informa nosso texto constitucional? A resposta a essa interrogação pode ser encontrada no conteúdo jurídico e social de nossas normas constitucionais.

Para se chegar ao exato significado do que vem a ser uma Constituição Dirigente, é mister entender quais as funções indispensáveis que uma constituição voltada a reger um país em desenvolvimento deve apresentar. O Professor Canotilho Gomes identifica três funções primordiais de uma Constituição: ordenação jurídico-política plasmada num documento escrito; declaração dos direitos fundamentais e das respectivas garantias; organização do poder político de modo a torná-lo limitado e moderado.

A partir dessa premissa doutrinária, começa a se afigurar mais palpável o atributo "Dirigente" de nosso texto constitucional. O Brasil, por ser um país em desenvolvimento, não poderia editar um texto constitucional voltado unicamente para reger e estruturar o seu presente. Isso, porquanto, tanto em 5 de outubro 1988, quanto hoje, nosso País apresenta uma carência de estrutura social que demanda programas futuros de atuação estatal, instituição de projetos voltados à construção e estruturação de bases para a sociedade. Deste modo, como uma forma de garantir a atuação futura do Estado ou, pelo menos, proporcionar legalmente os meios para se exigir essa atuação, é que a Assembléia Nacional Constituinte encartou no texto constitucional vários preceitos voltados para a atuação posterior do Estado. Diante de situação semelhante, o teórico lusitano Jorge Miranda identificou na constituição daquele país algumas normas que referiu serem normas programáticas. Tais normas identificam-se pelo seu conteúdo programático, isto é, dependem de uma regulamentação futura por outra Lei, que será complementar ou ordinária. Daí se poder afirmar que as normas constitucionais programáticas são voltadas, em um primeiro momento, aos legisladores.

Ou seja, a regulamentação do programa inicialmente previsto pela Carta Constitucional depende, imediatamente, da atividade legiferante do Congresso Nacional. Essas normas programáticas são dotadas de intensa conotação social, tendente à implementação dos direitos e garantias individuais e coletivas no plano real, fático. Todavia, como dito, elas dependem de atividade legislativa complementar para se efetivarem.

No Brasil, o Professor José Afonso da Silva propôs sua classificação das normas constitucionais e identificou, dentre elas, as normas constitucionais de eficácia limitada. Tais normas, segundo entendimento desse autor, subdividem-se em dois grupos distintos: normas constitucionais de eficácia limitada e preceito institutivo e normas constitucionais de eficácia limitada e preceito programático. Ambas identificam-se pela característica de possuírem aplicabilidade mediata, indireta, pois dependem da referida regulamentação ulterior que lhes desenvolva a aplicabilidade.

Em verdade, a importância dessas classificações reside na visualização que se pode perfazer do liame de proporcionalidade que existe entre uma constituição dirigente e a quantia de normas de conteúdo programático que ela possui. Noutro dizer, uma constituição é tanto mais Dirigente, quanto maior o número de normas de conteúdo programático e preceito institutivo que ela possuir.

Diante desta constatação é que se poder afirmar que nossa constituição é eminentemente dirigente. E, por óbvio, o é propositadamente. O Poder Constituinte Originário, quando promulga uma constituição, age representando a vontade popular para estabelecer o texto que organiza e limita o poder estatal. Nesse mister, a última Assembléia Nacional Constituinte projetou no Encarte Federal um Estado que tem por dever implementar e garantir aos seus administrados as condições mínimas para uma vida digna. Saúde pública, educação e trabalho, são algumas diretrizes previstas pelo encarte constitucional para a atuação de nosso Estado.

Importante notar, também, que nosso problema reside em um momento cronologicamente posterior à atividade legislativa necessária para regulamentação das dirigências constitucionais. O problema, por incrível que pareça, não é a falta de leis. Leis existem e são incontáveis. A dificuldade está na implementação fática das diretrizes previstas em toda essa legislação infraconstitucional.

É aqui que entra o importantíssimo papel a ser desempenhado por órgãos como o Ministério Público, a Ordem dos Advogados do Brasil e o próprio Poder Judiciário. Estes órgãos, juntamente com a necessária fiscalização da própria sociedade é que tem por missão, senão constitucional, social, zelar pela moralidade pública e pela escorreita administração estatal.

Logo, podemos retirar outra conclusão que sobressai diante da constatação de que uma constituição é tanto mais dirigente quanto maior o número de normas com preceito institutivo que ela possuir. A conclusão é que, quanto maior o grau programático de um texto constitucional, maior a demanda de atuação de órgãos que controlem, fiscalizem e exijam lisura no atuar da administração pública.

A conclusão é de uma lógica cartesiana. Quanto maior o número de normas programáticas, maior o número de recursos que deverão, por determinação legal, ser repassados ao poder executivo. Logo, a atuação da administração pública, notadamente da administração direta, precisa ser, sobretudo, exigida e fiscalizada quanto à implementação dos recursos que lhe forem repassados para a estruturação social.

Hoje, nossa constituição está às vésperas de completar 20 anos de vigência. Já é tempo de as normas constitucionais programáticas e dirigentes serem implementadas em sua aresta prática e real. Já é hora de vermos uma sociedade construída, implementada, estruturada. Nosso país não pode permanecer eternamente em desenvolvimento. Caso contrário, sempre faltará um golpe de asas para se atingir a altura de uma sociedade livre, igualitária e justa e as diretrizes projetadas em nossa Constituição nunca terão sido respeitadas.

. Por: Dante D'Aquino, professor do Curso Prof. Luiz Carlos – Curitiba. | [email protected]

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