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18/05/2019 - 10:27

Felicidade: Novo benefício das cartas ofertas?

Fernanda acordou logo cedo naquela manhã para checar as mensagens de seu smartphone. Ela havia participado de um longo processo seletivo para uma posição de liderança em uma grande companhia e recebera dias atrás a notícia de sua aprovação. Tomada pela ansiedade, aguardava pela carta oferta prometida pelo departamento de recursos humanos de sua futura empregadora.

Na outra ponta, Paula, gerente de recursos humanos finalizava a revisão da carta oferta de Fernanda. Dentre os aspectos ordinários da contratação, tais como cargo, salário, local da prestação de serviços e benefícios o documento trazia em seu bojo uma disposição ainda atípica para a atração e retenção de talentos: “felicidade”. Observando as novas regras de governança da companhia, Paula acabava por inserir em sua proposta de trabalho a garantia de felicidade plena (profissional e pessoal) como contraprestação pelas atividades a ser desempenhadas por Fernanda. Seria essa uma aposta muito alta e com algum grau de dificuldade a ser cumprida?

Em um universo de elevado nível de competição e onde as mentes mais talentosas ou esforçadas são disputadas, o critério de escolha pelos candidatos vem sendo cada vez mais pautado por critérios subjetivos do que objetivos. Nesse aspecto, a crença nos valores e cultura das companhias vêm se tornando um divisor de águas na escolha por potenciais vagas, em detrimento, por exemplo, do mero pacote remuneratório ou de benefícios regulares (plano de saúde, previdência privada, veículo etc.).

É com essa visão mais crítica e mirando a retenção de médio e longo prazo que observamos atualmente uma renovação no formato de condução dos negócios pelas grandes corporações. Os empregados deixaram de ser meros coadjuvantes para se tornar protagonistas. Ativos importantes para o semeio e cultivo das crenças defendidas pelas empresas para o sustento de seus negócios. Nesse aspecto, um empregado pleno e satisfeito com o seu papel e engajado com os valores de seu empregador obviamente reverbera boas energias dentro e fora do ambiente corporativo, inclusive em casa.

Assim, jornadas flexíveis de trabalho, redução dos dias úteis na semana, incentivo ao convívio familiar, apoio a causas sociais, transparência e defesa de ambientes inclusivos, ambientes de descompressão e convívio dentro das empresas estão, dentre diversos outros, como os principais benefícios atualmente apresentados e ofertados para os empregados em suas propostas de trabalho. Servem, assim, como instrumentos para o convencimento ou convite a fazer parte de um ambiente de trabalho construtivo.

Tal cuidado se dá em grande parte pela inclusão das novas gerações no mercado de trabalho. As empresas precisam falar a mesma língua da nova leva de trabalhadores e tal tarefa se faz bastante árdua. Acostumados com um rápido e fácil acesso a informações os Millenials e a Geração Z detêm uma visão bastante crítica dos antigos conceitos econômicos e do trabalho. Nessa esteira, a mera troca do trabalho intelectual ou braçal por dinheiro não é mais uma realidade para as novas gerações. Há de existir um princípio e obrigatoriamente uma contrapartida que lhes traga satisfação plena e consequentemente um sentimento de dever cumprido ao final do dia. E para isso, as velhas cartas ofertas por vezes com cifras bastante interessantes não são mais suficientes.

Em que pese definido de forma ampla nos dicionários da língua portuguesa, o substantivo “felicidade” é muito bem representado pelo sinônimo “bem-estar” quando avaliado para fins de adequação à nova realidade do mercado de trabalho. A sensação de plenitude ao interpretar tal expressão reflete bem o conceito que as diretorias de recursos humanos têm buscado propor aos seus candidatos e empregados já contratados. Esses devem se sentir convidados a entrar em um ambiente que lhes propicia identidade e abraçados em seus pleitos e crenças durante a vigência da relação entre as partes.

Sem prejuízo, não é necessário ir muito longe para concluir que o questionamento feito parágrafos anteriores possui uma resposta bastante óbvia. A proposta de “felicidade” ofertada à Fernanda como benefício para sua contratação seria uma aposta muito alta e com algum grau de dificuldade de ser cumprida? Com absoluta certeza sim. Nossas personagens fictícias sem sombra de dúvidas ainda interagiriam em diversas oportunidades durante a relação de emprego para a discussão de uma potencial promessa não cumprida na carta oferta, ou sobre o desalinhamento de uma (ou ambas às partes) acerca das crenças e valores debatidos no momento da contratação. Isto porque, não é nada fácil prometer a felicidade eterna (se é que ela de fato exista).

Não restam dúvidas de que essa nova percepção mercadológica é algo já presente nas rotinas das empresas, tornando necessário um olhar carinhoso e interessado acerca de seus potenciais desdobramentos. A nova ordem exige que os empregadores reverberem felicidade entre seus colaboradores e ao mercado como forma de demonstração de interesses que vão além do pecuniário. Não basta assim parecer feliz. Hoje, incentivar e auxiliar os empregados a atingir a felicidade se mostra condição de existência independentemente da alta complexidade envolvida em sua implementação.

. Por: Rodrigo Shiromoto, sócio da área Trabalhista do ASBZ Advogados, Especialista em Direito do Trabalho, e membro do Conselho Fiscal da Human Rights Watch Brasil.

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