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06/05/2008 - 12:48

A crise nos EUA e a economia brasileira

Em meados de 2007, o sistema financeiro internacional passou a acompanhar os desdobramentos de possíveis assimetrias no mercado de crédito imobiliário norte-americano subprime (créditos de risco elevado). A atenção se justificou, por um lado, pelos impactos de problemas de inadimplência sobre as operações de crédito e o conseqüente resultado sobre o balanço das instituições financeiras; e, por outro lado, pelos efeitos de uma possível recessão da economia estadunidense sobre a economia mundial, com destaque para os países emergentes.

Do ponto de vista do mercado de crédito, as expectativas se confirmaram por meio dos resultados nos balanços dos principais bancos americanos. O efeito se estendeu para os mercados europeus, já que muitas instituições possuíam aplicações em operações que envolviam crédito subprime. Os bancos centrais foram obrigados a exercer seu papel de emprestador de última instância, com destaque para o Federal Reserve (FED) – Banco Central americano – e ao Banco Central da Inglaterra, que efetuaram injeções de recursos em instituições financeiras com o objetivo de evitar falências que poderiam, eventualmente, culminar em efeito dominó.

Além disso, foram notadas operações coordenadas simultâneas de vários bancos centrais, no sentido de aumentar a liquidez das principais economias mundiais, por intermédio de compras de títulos e injeção de recursos no mercado. Paralelamente, o processo de redução na taxa de juros posto em prática pelo FED desde setembro de 2007 objetivou ampliar a liquidez da economia e reduzir o custo do crédito.

Sob este aspecto e de forma antagônica, as instituições financeiras brasileiras mostraram-se ilesas à crise, com resultados excepcionais nos balanços e crescimento nos lucros. Felizmente, a crise no mercado americano não contaminou os bancos brasileiros, que apresentaram elevadas taxas de crescimento, mesmo num cenário de queda da taxa básica de juros. Isto se deve, fundamentalmente, à expansão do crédito no mercado doméstico, à diversificação das operações e ao bom desempenho da economia, associados à busca de eficiência. Dessa forma, pode-se afirmar que, a despeito de certa volatilidade no mercado cambial e nos mercados acionários, com a drástica redução nos IPO´s (oferta inicial de ações), a crise norte-americana representou poucos efeitos no sistema financeiro brasileiro.

Com a disposição dos Bancos Centrais em exercer o papel de emprestador de última instância, os efeitos sobre o mercado de crédito foram relativamente absorvidos e as atenções se voltaram às possibilidades da economia norte-americana ingressar em um processo recessivo, além dos possíveis impactos de tal recessão sobre o Brasil e os demais países emergentes. Uma recessão se caracteriza pela queda do PIB (Produto Interno Bruto) por dois trimestres consecutivos e não é de se estranhar que o primeiro trimestre do ano apresente queda em relação ao último trimestre, já que há um efeito sazonal provocado por décimo terceiro salário e vendas de natal que eventualmente podem resultar em uma variação negativa do PIB no primeiro trimestre do ano.

A questão crucial refere-se ao comportamento do PIB americano no segundo trimestre de 2008. Se este período apresentar queda em relação ao anterior, então o país estará em um processo recessivo. No entanto, os indicadores econômicos não permitem, ainda, afirmar que a economia dos EUA está em recessão. Ela pode estar em um processo de desaceleração, o que não significa necessariamente uma recessão.

Tal desaceleração, iniciada já no último trimestre de 2007, pode ser revertida com o processo de redução da taxa de juros dos títulos americanos que, ao remunerarem o investidor em 2,25% ao ano, incentiva as famílias americanas ao consumo em detrimento da poupança, em um comportamento semelhante ao que resgatou a economia dos EUA da crise de 1929, quando o reaquecimento foi motivado, principalmente, pelo aumento do consumo, só que naquela ocasião proveniente do aumento da renda.

Considerando tanto a hipótese de recessão quanto a de desaceleração, pode-se avaliar quais seriam os impactos sobre a economia mundial, com destaque para os países emergentes. Nota-se que, em 2008, a inflação tem sido um dos principais problemas macroeconômicos nas economias emergentes, ocasionada, principalmente, pelo elevado crescimento econômico destes países. Assim, destaca-se a peculiaridade do cenário econômico mundial: a principal economia, responsável por mais de 25% da produção mundial, com possibilidade de recessão e os países emergentes convivendo com a ameaça da inflação decorrente do crescimento econômico pujante.

A piora no cenário inflacionário não é uma característica exclusivamente brasileira. A economia chinesa tem a inflação como uma das principais preocupações e o cenário inflacionário argentino tem mostrado que existe a possibilidade de desorganização econômica, como falta de produtos, em situações de descontrole dos preços e tentativas não convencionais de estabilização.

O re-equilíbrio da economia mundial constitui o principal desafio em termos de formulação de cenários econômicos. Sabe-se que as economias emergentes têm, atualmente, melhores condições de suportar uma queda no produto norte-americano devido a uma nova dinâmica no cenário internacional. Ainda que a economia americana tenha um forte peso no mercado mundial, certamente é menor do que já foi há alguns anos, o que pode assegurar o crescimento dos países emergentes, mesmo que em menor intensidade. A inflação, no entanto, pode comprometer a sustentabilidade de tal crescimento, diante da possibilidade de uma contração econômica com o objetivo de contenção dos preços.

As conjecturas acima refletem exatamente a situação econômica brasileira atual, que continua apresentando indicadores econômicos favoráveis. O cenário de alta de juros, associado ao processo de desvalorização do dólar, constituirá, certamente, a principal ameaça ao crescimento econômico brasileiro. Portanto, pode-se afirmar que tanto o crescimento das economias emergentes, que acarreta inflação e exige uma política monetária contracionista, quanto a crise nos EUA, que acentua a desvalorização do dólar, podem ser responsáveis por uma redução na intensidade do crescimento econômico brasileiro nos próximos anos.

. Por: Pedro Raffy Vartanian, economista, consultor do Núcleo de Negócios Internacionais da Trevisan Consultoria, professor da Trevisan Escola de Negócios e da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

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