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16/05/2008 - 16:04

Sessão coruja promete onerar todos os elos da cadeia de abastecimento

Medidas restritivas ao transporte de cargas na cidade de São Paulo podem não trazer os resultados desejados.

O assunto voltou à tona e, mais uma vez, medidas restritivas ao transporte de cargas na cidade de São Paulo, anunciadas no começo de abril pelo prefeito Gilberto Kassab, prometem custar caro para a indústria, varejo, operadores logísticos e, claro, o consumidor final.

O novo decreto se apóia em três medidas: cumprimento do rodízio pelos caminhões, proibição de entregas com caminhões entre as 5h e 21h e a expansão da área de restrição dos atuais 24 km² para até 100 km². Como solução para as entregas diurnas a estabelecimentos comerciais e domicílios, propõe o uso de veículos menores, tais como furgões e vans, e eventualmente VUCs (veículo urbano de carga).

Estamos, portanto, diante de medidas de restrição e não de racionalização, cujos efeitos podem conflitar com o objetivo maior de solucionar o conturbado trânsito da cidade.

Basta pensarmos no efeito de substituir um caminhão por uma dezena de veículos de menor porte, encarregados de levar sua carga: ocuparão mais espaço das ruas, gastarão mais combustível, gerarão mais poluição e terão custos mais elevados.

É claro que o conturbado trânsito de São Paulo demanda medidas de regulamentação e investimentos consideráveis de longo prazo, com propostas técnicas fundamentadas em estudos logísticos detalhados, quantificando o volume de veículos e cargas que circulam pelas diferentes ruas e áreas da cidade, a natureza da atividade dos estabelecimentos de cada área, para então pensar em propostas factíveis em diferentes horizontes de tempo.

O que me parece essencial, é não perder de vista o foco: o transporte e distribuição de cargas não ocorre de modo aleatório. Tem base em estudos detalhados das empresas envolvidas, objetiva minimizar custos e assegurar a qualidade das cargas. Para isso, a frota é dimensionada de acordo com a necessidade de um serviço eficaz. Podemos mudar os veículos ou horários, mas permanecerá o volume de produtos. Assim, se retirarmos de circulação os veículos maiores durante seu principal período de trabalho, reduzindo sua jornada potencial de 24 para 8 horas, teremos que multiplicar o número dos veículos menores, para que possam dar vazão à demanda de produtos para consumo. O resultado de mais e mais veículos leves de carga nas ruas poderá não ser um trânsito mais ágil que o atual – sem contar as questões de poluição, consumo de combustível, e multiplicação dos custos.

Se considerarmos apenas a factibilidade das entregas noturnas, deparamo-nos com uma série de entraves importantes, que vão desde o conflito com legislação em vigor (a lei do silêncio, que proíbe cargas e descargas noturnas), até a segurança (se os policiais trabalhando à luz do dia já não conseguem impedir o roubo de veículos e cargas, imagine a situação à noite, como rotas de fuga mais livres e menores contingentes para dar segurança à grande concentração de veículos que passarão a circular), ou ainda a questão de como manter abertos os estabelecimentos que hoje cumprem apenas jornada diurna e, quando passarem a ter turnos adicionais, gastarão energia elétrica, além de todos os demais quesitos para recebimento de mercadorias, cujos custos poderão comprometer desde a viabilidade das empresas até a competitividade de seus custos, uma vez que não haverá alternativa se não a de incorporar o novo ônus aos preços de venda.

Por outro lado, quando olhamos a frota circulante ao nosso redor, constatamos que é preponderantemente composta por veículos de passageiros, que concorrem com os de carga pelo espaço das ruas. Quando buscamos paradigmas em outras grandes megalópoles, como Paris ou Nova York – que o prefeito Kassab tem apontado como exemplos na distribuição de mercadorias - defrontamo-nos com um cenário absolutamente diverso no mundo do transporte de passageiros, pois existe uma infra-estrutura de transporte com capacidade e capilaridade suficientes para que as pessoas possam ir e vir sem necessidade de utilizarem veículos particulares. Infelizmente, não é este o cenário paulistano, sendo utópica a aparente expectativa de governantes que a criação de penalidades e encargos adicionais pelo uso de veículos particulares irá solucionar a questão e trará satisfação aos eleitores. Enquanto a oferta de assentos em veículos de transporte público (nossa expectativa é que possamos viajar sentados!) não for compatível com as necessidades de ir e vir da população, não temos alternativa senão utilizar nossos próprios automóveis, que, infelizmente, representam um ‘mal’ necessário em nosso custo de vida.

Há necessidade de soluções de curto, médio e longo prazo, sem as quais corremos o risco da imobilidade, do colapso total da movimentação de pessoas e produtos.

As medidas imediatas, evidentemente, só poderão ser paliativas, procurando regular o fluxo de veículos em um ritmo mais harmônico, distribuindo ao longo do tempo os acúmulos observados nos horários de pico. A principal ferramenta em uso para este fim é o rodízio.

As soluções efetivas para os males que hoje sofremos, entretanto, passam por estudos técnicos detalhados, mapeando cuidadosamente a situação de cada rua ou área da cidade, entendendo características e necessidades, criando e testando soluções adequadas para cada situação. Estudos tomam tempo e custam dinheiro – e na maioria das vezes não geram votos, além de eventualmente excederem o prazo de mandato dos governantes. Talvez por isso sejam menos populares que decretos e regulamentos, esquecendo-se a diferença na efetividade das soluções propostas.

Resolver a questão, entretanto, demanda investimentos consideráveis em infra-estrutura, de um lado na oferta de alternativas de transporte de passageiros – onde o metrô desponta como solução preferencial, ainda que o desenvolvimento de novas linhas em São Paulo se dê em ritmo incompatível com as necessidades da cidade (e sem o apoio do Governo Federal, que privilegia créditos até mesmo a países vizinhos ou “amigos” e não devolve a São Paulo seu quinhão de contribuição à federação), e pela revisão de toda a infra-estrutura logística da cidade, que carece de áreas apropriadas ao transbordo de carga, à integração de diferentes modais ou mesmo à restrição de passagem pelo perímetro urbano da imensa frota de veículos de carga que por aqui trafega sem nada trazer ou deixar, mercadorias, serviços ou impostos.

Criar novos custos e dificuldades para as empresas encarregadas de levar ao tudo aquilo que se consome no âmbito doméstico e empresarial, pode se mostrar um tiro pela culatra, com o agravamento do caos e a redução do poder de compra de todos.

*Por :Claudio Czapski, superintendente da Associação ECR Brasil. Associação ECR Brasil – www.ecrbrasil.com.br - A entidade sem fins lucrativos, fundada em 1997, reúne cerca de 100 empresas associadas e tem como missão difundir as ferramentas de Resposta Eficiente ao Consumidor (Efficient Consumer Response, em inglês), ou simplesmente ECR, sigla pela qual é conhecida no mundo inteiro. As principais ferramentas são gerenciamento por categoria, reposição eficiente e troca eletrônica de dados.

A sigla ECR representa um movimento global, nascido nos Estados Unidos, por meio do qual integrantes de toda a cadeia de abastecimento (varejo, atacado, distribuidores, indústria, serviços e outros), independentemente de marcas, preços ou participação de mercado, trabalham em conjunto em busca de padrões comuns para a melhoria dos processos, redução de custos, aumento da eficiência e, principalmente, atender às necessidades dos consumidores. | Site www.ecrbrasil.com.br.

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