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23/07/2022 - 07:54

Gabriel Schulman — Judicialização não é o remédio adequado para a saúde


Gabriel Schulman, doutor em Direito, especialista em Direito da Medicina, advogado e professor da Escola de Direito e Ciências Sociais da Universidade Positivo (UP)

Um em cada quatro brasileiros utiliza os planos de saúde. Essa modalidade contratual tão importante frequentemente gera discussões na justiça, e, entre os temas mais debatidos, a extensão da cobertura com certeza tem destaque. Entre outros aspectos, os tribunais discutem a natureza do rol de procedimentos estabelecido pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Em outras palavras, a questão é definir em quais situações os planos de saúde são obrigados a cobrir os procedimentos, exames e tratamentos.

Em recente decisão, a 2.ª seção do Superior Tribunal de Justiça estabeleceu que o rol da ANS é taxativo. Esse julgamento teve ampla repercussão, afinal, estabelece que as operadoras são obrigadas a cobrir somente procedimentos que estejam na lista da ANS. A tese, ou seja, a interpretação pode ser dividida em quatro itens: o rol de procedimentos da ANS, em regra, é taxativo; o plano de saúde não é obrigado a arcar tratamento que não conste do rol da ANS, desde que esteja prevista uma alternativa eficaz, efetiva e segura prevista na listagem; é possível contratar coberturas adicionais, ou seja, “extra rol”; e, por fim, se não houver alternativa de tratamento no rol, pode ser coberto o tratamento indicado por médico ou odontólogo desde que, ao mesmo tempo, sua inclusão não tenha sido negada pela ANS, existam evidências científicas suficientes e recomendações de órgãos técnicos de renome. Exige-se também, sempre que possível, que o juiz escute pessoas ou entes com especialidade em saúde, inclusive a própria comissão responsável pela atualização do rol.

Em termos práticos, a decisão do Superior Tribunal de Justiça confere uma importância central para o rol da ANS, antes considerado uma simples referência. Além disso, estabeleceu regras mais claras acerca das possíveis exceções, restringindo a possibilidade de ultrapassar o rol.

É interessante notar que essa mudança de entendimento veio acompanhada da mudança na sistemática da atualização da lista da ANS. A legislação vigente reduziu o tempo de análise pela ANS para 180 dias (prorrogáveis por mais 90), e, no caso de inclusão de novos medicamentos para tratamento oral e domiciliar contra o câncer o prazo é de apenas 120 dias (prorrogáveis por mais 60). Uma vez que o procedimento é incluído no rol, a cobertura se torna obrigatória em apenas 10 dias. E o que acontece se a ANS não cumprir os prazos? Ocorre a inclusão automática da cobertura. Em outra mudança importante, as tecnologias incorporadas ao SUS são igualmente acrescentadas no rol da ANS em um prazo de 60 dias.

Verifica-se um amplo conjunto de mudanças em relação ao rol. A interpretação de sua natureza taxativa certamente limita o acesso a alguns procedimentos, mas, por outro lado, organiza o sistema, confere mais previsibilidade para os pacientes, médicos e planos de saúde. A maior velocidade na avaliação e incorporação dos procedimentos igualmente beneficia os pacientes, com uma vantagem a mais: o Judiciário deixa de ser uma etapa necessária para alcançar o acesso aos tratamentos. Entre críticas e elogios, não resta dúvida que a judicialização não é o remédio adequado para a saúde.

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