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24/06/2008 - 12:43

Mais incertezas

Situação mundial

No dia 8 de junho, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos liberou mais uma previsão sobre a próxima safra de milho nos Estados Unidos. Apesar das ressalvas de que estas projeções são estimativas formuladas a partir das informações sobre intenção de plantio, levantadas em março e que devem ser atualizadas no decorrer da safra, e também das condições climáticas futuras, elas têm potencial de afetar o mercado na medida em que, com os baixos níveis dos estoques, qualquer notícia desfavorável tem seu efeito multiplicado.

Foi o que aconteceu, a partir da constatação de que os plantios e o desenvolvimento inicial das plantas se encontram em um estágio atrasado, em relação ao verificado nos últimos anos, e que a perspectiva dos rendimentos, por conta desta situação, já é estimada em um valor inferior inclusive ao da safra de dois anos atrás. A produção estimada para os Estados Unidos é agora cerca de 10% menor do que a da safra do ano anterior (que foi uma safra recorde), com uma redução de 7% na estimativa liberada um mês atrás.

O Weekly Weather and Crop Bulletin mais recente, de 17 de junho, informa que, devido a temperaturas inferiores à média e à maior umidade nas principais regiões de plantio, a emergência e desenvolvimento das plantas se encontra em um percentual abaixo verificado nos cinco anos anteriores. Em comparação com as observações do ano passado, a situação das lavouras se encontra em pior estado nas principais regiões produtoras, com 57% das lavouras em condições excelentes ou boas, em contraste com 60% na semana anterior.

Com base nestas estimativas, mesmo ainda muito preliminares, e em projeções de utilização do milho para diferentes finalidades, espera-se uma grande redução nos estoques americanos do cereal. O nível destes estoques chegaria, caso estas previsões se confirmem, na metade do valor registrado no corrente ano, contribuindo para o aumento das incertezas e dos preços. A redução na produção será parcialmente compensada pelo menor uso do milho diretamente na alimentação animal (compensada pelo uso de resíduos da produção de etanol de milho) e pela redução nas exportações (mas que ainda estarão pouco abaixo da quantidade registrada no ano comercial 2006/07).

Por outro lado, verifica-se também o contínuo incremento no uso do milho para a produção de etanol (prejudicado pelo aumento do preço do milho mas sustentado pelo crescimento do preço do petróleo). Nestas condições, a expectativa de preços é marcantemente superior ao do atual ano comercial, reforçando as expectativas de um novo patamar de preços, mais elevados, no mercado mundial. A redução nas exportações americanas, previstas como sendo da ordem de 18%, abre uma grande oportunidade para o Brasil a partir de sua disponibilidade de milho neste ano agrícola, produção que necessita ser escoada para o exterior como forma de manutenção dos preços internos.

Informações mais recentes relativas às condições climáticas neste início da safra americana indicam perdas consideráveis provocadas pelas inundações em estados como Iowa, Wisconsin Illinois e Indiana, grandes produtores de milho nos EUA. Pesquisas de caráter não científico, realizadas pela revista Farm Futures, sugerem uma perda de cerca de 3 milhões de acres (de um total de 86 milhões de acres plantados, segundo o Departamento de Agricultura dos EUA) devido às inundações. Operadores da bolsa de Chicago (citados em reportagem da BBC) estimam um valor semelhante de área plantada perdida devido às inundações e um adicional de 2 milhões de acres que não puderam ser plantados e serão direcionados para a produção de soja. Análises realizadas pela Prices & Outlook da Universidade de Purdue indicam que no ano de 1993, em condições semelhantes às atuais, não só a área plantada foi menor, como também a área colhida foi bastante reduzida devido ao mau estado das lavouras, que apresentaram menor potencial produtivo (devido à redução na população de plantas nas lavouras, lixiviação de nitrogênio e outros fatores),. Estimativas desta publicação reduzem a produção para um nível próximo ao do ano de 2006/07. Com o agravante de que, deste ano para hoje, a demanda de milho para produção de álcool praticamente dobrou.

Certamente os preços se elevarão e ajustes na demanda americana terão que ser feitos, mas a previsão sobre possíveis níveis futuros de mercado são ainda arriscados, visto que a safra ainda está em seu início e existem perspectivas de melhorias após meados de junho (conforme a Prices & Outlook). Entretanto, as expectativas de preços mais elevados seguem firmes. A dúvida é até onde estas cotações vão chegar nos próximos meses.

Como já foi assinalado em edições anteriores, os países da Europa já se preparam para uma eventual necessidade de importações, liberando as compras de milho transgênico do exterior para uso na alimentação animal. Outra forma de adaptação utilizada no ano passado pelos europeus foi o expressivo crescimento nas importações de sorgo (que não são transgênicos) dos Estados Unidos. No período Setembro/Abril de 2007/08 foram importadas quase 4 milhões de toneladas, contra cerca de 500 toneladas no período anterior. Entretanto, previsões sobre produção e eventuais necessidades ainda são muito frágeis nesta altura da safra européia.

O problema de abastecimento mundial fica dependente da situação das lavouras nos Estados Unidos que não está favorável e da Argentina, onde continua uma queda de braço entre produtores e o governo. Como existem basicamente três grandes exportadores de milho no mundo e em dois deles existem dificuldades no horizonte, resta apenas um país, o Brasil, com excedentes de exportação em quantidades relevantes.

Situação interna - A Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) liberou no início de junho o 9º levantamento da safra 2007/08. Com a safra de verão praticamente encerrada, estima-se uma produção de cerca de 39,9 milhões de toneladas de milho nesta época de plantio, um pouco superior à estimativa do mês passado e 9% acima da safra de verão do ano anterior. A produção esperada é cerca de 300 mil toneladas superior ao do levantamento anterior, sendo que este acréscimo é referente à revisão de produção da região Sul (50 mil t), Nordeste (130 mil t) e Sudeste (cerca de mais 100 mil t).

A safra a ser colhida no Nordeste é uma das maiores da região. Para as atividades de criação animal é uma boa notícia, pois indica uma safra 53% superior à anterior, motivada principalmente pelo acréscimo de produtividade resultante de condições climáticas mais favoráveis. A produtividade média regional é cerca de 48% superior à da safra anterior.

À exceção do Rio Grande do Sul, que apresentou redução de produtividade, a safra de verão se mostra favorável, com o crescimento sendo sustentado pelo aumento da produtividade das lavouras de milho. Isto fornece uma boa garantia para o abastecimento interno.

Com relação à safrinha, é esperada uma produção de 18,5 milhões de toneladas, um acréscimo de quase 3 milhões de toneladas em relação à safra de 2007 e uma revisão positiva em cerca de 200 mil toneladas em relação à estimativa anterior, ajudando a consolidar outro recorde de produção de milho no Brasil. Deste acréscimo, parte considerável vem do aumento da área plantada (10,9% a mais do que no ano de 2007). O restante é esperado em função de um aumento de produtividade (13,3% superior ao da última safra).

Uma equipe do CIMilho (Centro de Inteligência do Milho) visitou as principais regiões produtoras de Mato Grosso e verificou condições muito favoráveis nas lavouras de safrinha naquele estado. Em todos os locais visitados, foi confirmado que a produção já está garantida, com um volume que transforma o Mato Grosso em segundo maior produtor de milho no Brasil, ultrapassando Minas Gerais. A safrinha de milho em Mato Grosso produz mais do que a safra de verão em Minas, sendo que a produtividade média da safrinha, conduzida em condições não muito favoráveis, é cerca de 950 kg/ha inferior à safra normal de Minas Gerais, em decorrência da adaptação dos sistemas de produção de milho a estas condições desfavoráveis.

Nota-se que, face aos preços favoráveis do milho, uma parcela maior da área colhida de soja foi utilizada para o plantio do safrinha de milho, permitindo uma opção econômica ao plantio do milheto para cobertura do solo e realização do sistema de plantio direto. Por outro lado, nota-se um crescente uso do milho em atividades de alimentação animal. Várias integrações para produção de aves e suínos estão instaladas, ou sendo, assim como confinamentos de bovinos para terminação (baseadas em rações formuladas a partir de resíduos de armazenamento, que até anos atrás era jogado fora e hoje é vendido a um preço ainda relativamente baixo).

Em algumas regiões, já existem indícios de falta de milho nos meses anteriores ao início de colheita da safrinha, com preços para abastecer o mercado local superiores aos registrados na semana da visita (variando entre R$ 15 e R$ 18 a saca). Este crescimento do mercado local, como forma de sustentação de preços, poderá contribuir ainda mais para impulsionar a produção de milho na safrinha do Mato Grosso.

Com relação à safrinha, o fator negativo que pode prejudicar estes resultados fica por conta de possíveis geadas que ocorram no Paraná, Mato Grosso do Sul e São Paulo. Nos dias 15 e 16 de junho ocorreram geadas leves no Sul e Oeste do Paraná, o que pode ainda afetar a produtividade esperada.

Uma vez que as perspectivas da safra são cada vez melhores, as preocupações passam para o lado da comercialização, de forma a evitar que a produção recorde obtida não seja prejudicada por uma eventual redução dos preços. Para que isto não aconteça as exportações são vitais para escoar o excesso de produção.

Nas previsões da Conab existiria um montante de cerca de 11 milhões de toneladas de milho em condições de serem exportadas (restando, inclusive, um estoque de passagem de cerca de 10 milhões de toneladas). Aos preços esperados no mercado internacional (a conferir o desdobramento da safra americana), esta quantidade poderia ser atingida. Até o mês de maio, as exportações já haviam ultrapassado o total exportado no mesmo período em 2007 em cerca de 200 mil toneladas, com os preços se mostrando superiores ao dos meses correspondentes do ano passado e se elevando. Isto tem mantido a atratividade das exportações de milho. Com a folga representada pelo estoque de passagem, até quantidades adicionais poderiam ser exportadas sem prejudicar o abastecimento interno.

Do lado do consumo, as informações são de crescimento das atividades de criação animal, o que fornece suporte para os preços no mercado interno. Existem indicativos de acréscimo na produção de aves e aumento na produção de leite (o país se firma como exportador de produtos lácteos). A receita com exportações de carne de aves é crescente (segundo análise do AviSite). A relação de troca entre os preços de aves e suínos (as atividades de criação mais sensíveis a variações de preço do milho) e o cereal tem se mostrado relativamente estáveis, o que enfraquece argumentos acerca da necessidade de controlar os preços do milho via restrições às exportações.

Tentativas semelhantes em curso na Argentina somente têm desorganizado a produção e afetado a competitividade do setor agropecuário de lá. A falta de incentivo frustrará o estabelecimento das próximas safras e a colheita futura. Tal conjectura poderá provocar preços ainda mais altos em anos próximos ou, o que é pior, o desabastecimento, de acordo com experiências que já vivemos em um passado recente.

Mais sentido fariam medidas de incentivo à produção, de incorporação de tecnologias de produção e de gerenciamento das lavouras, de forma a consolidar a produção de milho como parceiro confiável das atividades de criação animal, ao mesmo tempo em que são aproveitadas as condições favoráveis correntes no mercado internacional.

. Por: João Carlos Garcia e Jason de Oliveira Duarte, pesquisadores da área de economia rural da Embrapa Milho e Sorgo.

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