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15/07/2008 - 11:09

Pamplona


Antes de comentar o ato de sadismo que tanto fascina – a matança dos touros nas arenas de vários países –, alguns comentários a respeito de uma manifestação tradicional. Trata-se da festa de San Fermin – um São Firmino gentil – que ocorre na cidade de Pamplona, no sopé dos Pireneus.

Essa demonstração de normalidade ocorre todo ano entre os dias 6 e 14 de julho.Antes, num passado mais longínquo, esse 'show' ocorria em outubro, mas com receio das chuvas, a partir de 1591 a data foi transferida para julho. Trata-se de evento com ampla cobertura midiática e intenso merchandising com venda de camisetas e outras bugigangas alusivas ao evento. Há uma notável afluência de corredores que para lá se dirigem em busca de sensações.

Dirão alguns que se para participar de maratonas há centenas ou milhares de interessados, por qual razão essa corrida chama tanto a atenção. Há duas diferenças básicas entre uma corrida de rua, cuja expressão maior tende a ser a maratona e a corrida de San Fermin. Em primeiro lugar a duração desta é de dois a três minutos, uma vez que o percurso é de uns oitocentos metros. Em segundo lugar, porque existe um real perigo e isso por uma simples razão.É preciso correr – de preferência vestido de branco – mais rápido que os perseguidores mais importantes que são seis touros. Pois é. Considerando que um touro pesa mais que meia tonelada e é dotado de chifres respeitáveis, percebe-se que se trata de uma corrida pela sobrevivência. Falar num simples treino de explosão muscular seria fazer pouco do espetáculo.

Uma piada que circula freqüentemente entre maratonistas é que os corredores quenianos e etíopes, useiros e vezeiros em faturar os primeiros lugares nas corridas mais importantes, devem seu sucesso a um hipotético treino , que consistiria em correr de leões, de sorte que aqueles que comparecem nas largadas nada mais são que os sobreviventes desse treino repleto de originalidade.

Em Pamplona a realidade acompanha a piada e assim surge o 'encierro', uma corrida de uns 800 metros – distância olímpica, na qual brilhou tão intensamente nosso Joaquim Cruz, medalhista de ouro em Los Angeles. Na pista as coisas são mais fáceis, dirão, e com toda razão. Imaginem a dificuldade que existe em sair correndo comodamente num grupo de uns vinte corredores, comparada com o drama de correr, estando atrás de algumas centenas de malucos, sabendo que atrás vêm os miúras. A massa custa a ganhar velocidade, há atropelos e tropeções, antes de conseguir soltar-se e correr como um atleta olímpico. Haja motivação.

E existe uma tradição , que não deixa de impressionar.

Antes do início, os corredores cantam por três vezes: "A San Fermín pedimos, por ser nuestro patrón, nos guíe en el encierro dándonos su bendición". – Não há necessidade de traduzir, suponho. Nada de extraordinário. Na concentração da maratona de Nova Iorque, em Statten Island, há diversos serviços religiosos antecedendo peripécias que talvez demandem menos adrenalina.

A seguir, solta-se um rojão. Pronto começou.Um segundo rojão anuncia que os touros já saíram do curral e estão na rua.

'los toros corren que se las pelan, – debe se mesmo! – es imposible ganarles ni aguantarles mucho tiempo (información interesante para quien tenga pretensiones atléticas). – correm mesmo, informa um site dedicado à corrida. Aí é so 'aguantar delante de ellos (más o menos cerca según tus ganas de jugarte la piel)'

Diferentemente de Nova Iorque , onde por touros designam-se os investidores de Wall Street que apostam na alta, em Pamplona , não raro, os touros jogam para o alto corredores mais lentos.Bem feito.Que treinem melhor no futuro. Apesar de curto, o percurso possui algumas curvas perigosas, particularmente o ãngulo praticamente reto entre as ruas Mercaderes e Estafeta. É fácil imaginar que o perigo é real. Os touros também derrapam, sofrem fraturas são atiçados,espetados durante o percurso, mas isso é tradição cultural, logo , inatacável.

Aí, chega-se à arena . Os corredores encontram o merecido abrigo. Para eles a corrida terminou. Para os touros restam ainda algumas formalidades desagradáveis. Enquanto os noticiários informam a quantidade de baixas humanas, que são as únicas variáveis, as baixas taurinas representam 100% dos protagonistas.

Pessoalmente, fico com a maratona de Nova Iorque.

. Por: Alexandru Solomon é escritor, formado pelo ITA em Engenharia Eletrônica e mestrado em Finanças na Fundação Getúlio Vargas. Tem seu recente romance´Não basta sonhar` (Ed. Totalidade) disponível nas livrarias Cultura (www.livrariacultura.com.br), Saraiva (www.livrariasaraiva.com.br) e Laselva (www.laselva.com.br). | E-mail do autor: [email protected]

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